EUA

Após protestos, relatório condena racismo na polícia de Chicago

Entre 2008 e 2015, 74% das pessoas baleadas pela polícia de Chicago eram negras

Opera Mundi |
Sistema de "código de silêncio" e normas internas facilitam que policiais mintam sobre assassinatos
Sistema de "código de silêncio" e normas internas facilitam que policiais mintam sobre assassinatos - Daniel X. O'Neil/Flickr CC

A polícia de Chicago, nos EUA, “não tem consideração pela santidade da vida quando se trata de pessoas negras”, concluiu um relatório divulgado nesta quarta-feira (13). O documento foi produzido por uma força-tarefa que analisou a instituição nos últimos meses e é formada por nove profissionais de áreas diveras, como assistentes sociais, procuradores e juristas.

“Detenções falsas, confissões forçadas e condenações injustas também são parte da história [da polícia de Chicago]. Esses e outros eventos marcam uma longa e triste história de morte, prisão falsa, abuso físico e verbal e descontentamento geral sobre as ações da polícia em bairros negros”, diz o relatório.

O documento indica que, entre 2008 e 2015, a polícia atirou em 404 pessoas, das quais 299 (74%) eram negras e 55 (14%) eram hispânicas. A título de comparação, a população de Chicago é composta por 31,7% de brancos, 33% de negros e 28,9% de hispânicos.

A força-tarefa foi montada em dezembro de 2015 após diversos assassinatos de jovens negros por policiais terem obtido repercussão pública e manifestações populares na cidade contra a violência policial terem ocorrido ao longo de meses. Em novembro do ano passado, a Justiça norte-americana tornou público um vídeo que mostrou o assassinato de Laquan McDonald, um jovem negro de 17 anos, pelo policial branco Jason Van Dyke, com 16 tiros. O presidente dos EUA, Barack Obama, chegou a declarar ter ficado “profundamente perturbado” pelas imagens.

“A ligação entre o racismo e o CPD [Departamento de Polícia de Chicago, na sigla em inglês] não apareceu após as consequências da liberação do vídeo [do assassinato] de McDonald. Racismo e maus-tratos nas mãos da polícia têm sido, por décadas, reclamações regulares de comunidades negras”, aponta o documento.

O relatório critica também o chamado “código de silêncio” existente na corporação, segundo o qual os policiais não delatam ou incriminam os colegas em casos de conduta indevida. Os policiais de Chicago têm um prazo de 24 horas para prestar depoimento após uma ação que utiliza armas de fogo, o que “facilita que os policiais mintam” e permite que eles alinhem o relato com outros colegas. Evidências em casos de má conduta chegam a ser destruídas com o passar dos anos, diz o relatório.

Durante 2015, apenas seis pessoas, das cerca de 1.000 que foram detidas, contaram com a presença de um advogado enquanto estiveram sob custódia da polícia.

O documento também inclui sugestões de mudanças e deverá ser entregue ao prefeito Rahm Emanuel, do Partido Democrata.

“Reformar é possível se existe vontade e comprometimento. Mas onde a reforma deve começar é com um reconhecimento da triste história e das condições atuais que deixaram as pessoas totalmente distanciadas da polícia e temerosas por sua segurança física e emocional”, diz o documento, que recomenda a abolição da IPRA (Autoridade Independente de Revisão da Polícia, na sigla em inglês), encarregada de investigações internas.

Eddie Johnson, policial negro que trabalha no CPD há 27 anos, foi escolhido pelo prefeito como novo chefe da corporação da cidade. A Câmara de Vereadores aprovou o nome de Johnson por 50 votos a 0 nesta quarta-feira. Johnson declarou que a polícia está “absolutamente comprometida” em seguir as orientações do relatório.

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