Nova direção

Petrobras cancela planos de privatização de 5 refinarias após novo acordo com Cade

Compromisso firmado em 2019 com Conselho Defesa Econômica obrigava estatal a vender plantas de fabricação de combustível

Brasil de Fato | Curitiba (PR) |
Criada em 1950, a refinaria Landulpho Alves (RLAM) foi privatizada em 2022, no governo Bolsonaro - Divulgação/ Petrobras

A Petrobras cancelou oficialmente o plano de privatização de cinco de suas refinarias. A decisão foi anunciada na quarta-feira (22), depois que a estatal entrou num novo acordo com o Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade) sobre o assunto.

Em 2019, durante o governo do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL), a Petrobras fechou com o Cade um compromisso de vender oito refinarias. Esse acordo foi firmado após uma queixa de importadores de combustíveis contra um suposto monopólio da estatal.

A Petrobras nunca chegou a ser condenada, já que resolveu fechar o acordo com o Cade ainda na fase de investigação sobre o tema. Na época, petroleiros e opositores do governo Bolsonaro, incluindo o então senador Jean Paul Prates (PT) — o qual virou presidente da empresa no governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) — denunciaram a falta de vontade da companhia em se defender para evitar a perda de patrimônio.

Apesar disso, o acordo entrou em vigor e as refinarias foram postas à venda. Das oito, três acabaram negociadas: a Refinaria Landulpho Alves (Rlam), na Bahia; a Refinaria Isaac Sabbá (Reman), no Amazonas; e a SIX, no Paraná. Todas foram negociadas durante a gestão de indicados por Bolsonaro na Petrobras.

Após a eleição de Lula, seus nomeados para a estatal resolveram solicitar ao Cade uma revisão do acordo. Na quarta, um aditivo ao termo foi assinado. O novo texto desobriga a Petrobras a vender refinarias. Logo após o anúncio do novo acordo, a companhia anunciou que retirou as plantas produtoras de combustíveis do seu programa de desinvestimentos.

A decisão afeta a Refinaria Presidente Getúlio Vargas (Repar), no Paraná; Refinaria Abreu e Lima (Rnest), em Pernambuco; Refinaria Alberto Pasqualini (Refap), no Rio Grande do Sul; Refinaria Gabriel Passos (Regap), em Minas Gerais; e a Refinaria Lubrificantes e Derivados do Nordeste (Lubnor), no Ceará.

Benefício privado

Eric Gil Dantas, economista do Instituto Brasileiro de Estudos Políticos e Sociais (Ibeps), comemorou a revisão do acordo e o cancelamento oficial dos planos de privatização. Para ele, o acordo inicial foi firmado para favorecer agentes do mercado privado de combustíveis no país.

"O Cade foi uma ferramenta de importadores e depois de compradores das refinarias privadas de pressão sobre a Petrobras", disse. "Mas esse acordo só foi colocado pra frente porque a própria Petrobras [na gestão de Bolsonaro] queria vender transportadoras de gás e refinarias."

"A gestão da Petrobras aceitou, consentiu e propôs ao Cade se desfazer de ativos porque, na época, tinha como único foco a geração de valor e distribuição de dividendos no curto prazo", complementou Mahatma dos Santos, um dos diretores técnicos do Instituto de Estudos Estratégicos de Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (Ineep), que também aprovou o novo acordo com o Cade.

Segundo dos Santos, por conta do acordo inicial, a Petrobras perdeu mais de 15% de sua capacidade de refino de combustíveis.

Dantas lembrou que defensores da privatização, na época, disseram que a venda de refinarias reduziria os preços dos combustíveis no país estimulando a concorrência. A realidade demonstrou que eles estavam errados. "O resultado foi o oposto do que se tinha nos documentos. Houve a criação de monopólios regionais das empresas que compraram as refinarias", acrescentou ele.

Pedro Faria, também economista, reforçou que a venda de refinarias não favoreceu a concorrência, mas sim os empresários que compararam refinarias privatizadas. Ele, inclusive, defende que a Petrobras recompre as fábricas vendidas.

Essa possibilidade, aliás, já foi aventada pela atual gestão da estatal e por membros do governo Lula. Até o momento, nenhuma medida concreta foi anunciada neste sentido.

Setor do gás

Além do acordo sobre as refinarias, Cade e Petrobras também alteraram o compromisso de privatização de ativos da estatal do setor de gás.

O documento, também de 2019, previa a venda pela Petrobras da Nova Transportadora do Sudeste (NTS), da Transportadora Associada de Gás (TAG), da Transportadora Brasileira Gasoduto Bolívia-Brasil (TBG) e das participações indiretas na Petrobras Gás (Gaspetro). Todas já foram vendidas, exceto a TBG — a qual não mais será privatizada.

Dos Santos, do Ineep, lamentou que grandes perdas já aconteceram. "A Petrobras perdeu quase totalmente a sua participação na infraestrutura que foi construída com o dinheiro público para o deslocamento e distribuição de gás natural no Brasil. Saiu de um mercado que hoje é estratégico para o futuro da transição energética e da indústria brasileira. O acordo já teve um efeito devastador de desnacionalização", afirmou.

Ele, aliás, ressaltou que o Cade segue monitorando a Petrobras e, eventualmente num futuro, pode tentar renegociar os termos do acordo mais uma vez.

Dantas, do Ibeps, disse que o novo acordo com o Cade ainda contém mecanismo para favorecer empresas privadas. Por conta dele, a estatal será obrigada a repassar petróleo a refinarias privadas pelo mesmo preço que repassa a suas refinarias.

"Alguém questiona por quanto o setor de produção de petróleo da 3R Petroleum [empresa privada] contabiliza o petróleo enviado para sua própria refinaria? Não faz sentido", disse Dantas. "Mas isso é o Cade parcialmente cumprindo essa função de ser a correia de transmissão dos interesses das empresas que compraram ativos privatizados, mesmo que isto possa gerar preços mais altos na economia."

A Petrobras informou que as mudanças nos acordos traduzem "o respeito que a Petrobras nutre pela autoridade antitruste [o Cade], preservando o ambiente de negócios do país".

Edição: Matheus Alves de Almeida