Na última quinta-feira (23), o filme Emilia Pérez (2024), musical francês dirigido Jacques Audiard sobre uma narcotraficante transgênero, recebeu 13 indicações ao Oscar e disputa com o longa brasileiro Ainda Estou Aqui (2024) nas três categorias em que foi indicado: Melhor Filme, Melhor Filme Internacional e Melhor Atriz.
No Globo de Ouro, premiação que antecede os Prêmios da Academia, o longa venceu em oito das 10 categorias em que foi indicado, incluindo a categoria “Melhor filme de língua não inglesa”, em que também disputava contra o filme brasileiro dirigido por Walter Salles.
Apesar de ser aplaudido em Hollywood, o filme que seduziu o mundo cinéfilo irritou o país em que se inspirou por banalizar o drama da violência criminal. No México, o longa foi altamente repudiado.
"Emilia Pérez é tudo de ruim em um filme: estereótipos, ignorância, falta de respeito, lucro em cima de uma das crises humanitárias mais graves do mundo [desaparecimentos massivos no México]. Ofensivo. Frívolo. Ganhará prêmios, mas também o desprezo das vítimas", resumiu no X Cecilia Gonzalez, jornalista mexicana.
O diretor de fotografia mexicano Rodrigo Prieto, responsável por Barbie (2023) fez a primeira crítica negativa ao filme, que foi gravado em um cenário francês com algumas externas noturnas no México. Salvo o trabalho da atriz mexicana Adriana Paz, ele afirmou em uma entrevista à revista Deadline que "tudo parece inverossímil".
"Principalmente quando o tema é muito importante para os mexicanos" acrescentou, se referindo aos mais de 30 mil assassinatos anuais e mais de 100 mil pessoas desaparecidas, registros ligados em sua maioria à narco-criminalidade no país.
“Não tenho nada contra o fato de não mexicanos dirigirem filmes sobre o México, mas os detalhes são importantes. Temos o caso de Ang Lee. Ele é de Taiwan e fez Brokeback Mountain (2005) [longa sobre um romance no faroeste estadunidense], mas se concentrou nos detalhes”, explicou.
“O filme banaliza o problema dos desaparecidos no México”, acusa Artemisa Belmonte, gerente de propriedades mexicana que lançou uma petição no site para se opor ao lançamento do filme no país. A iniciativa angariou mais de 11 mil assinaturas desde 9 de janeiro, mas não chegou até a meta de 15 mil até a última quinta-feira (23), data programada para o filme ser lançado.
É “um dos filmes mais grosseiros e enganosos do século XXI”, escreveu o escritor Jorge Volpi no diário El País no início de janeiro, que também destacou o terrível sotaque de Selena Gómez [que interpreta Jessi Del Monte], atriz e cantora estadunidense que apesar da ascendência mexicana, não fala o idioma espanhol com fluência, o que foi considerado irritante para a fibra nacionalista dos mexicanos.
Volpi ainda questionou qual seria a reação se um cineasta mexicano, como Alfonso Cuarón, Alejandro González Iñárritu ou Guillermo Del Toro, tivesse feito um filme sobre os tumultos nos subúrbios franceses em um estúdio no México e com atores latinos de Hollywood interpretando franceses.
O ator mexicano Eugenio Derbez, que também tem uma carreira em Hollywood, chamou o sotaque de Gómez de “indefensável”.
“Desculpe-me, fiz o que pude com o tempo que me foi dado”, respondeu a atriz. O mexicano terminou pedindo desculpas: “Como latinos, devemos apoiar uns aos outros”.
O diretor francês Audiard se defende com o argumento de que “é uma ópera” e, portanto, “irreal”. Contudo, em uma apresentação no México declarou que se os mexicanos “acharem chocante” ele “está pronto para pedir desculpas”.
Audiard foi questionado sobre os poucos mexicanos no elenco, no caso, apenas Adriana Paz, que interpretou Epifanía, e respondeu que as atrizes Selena Gomez e Zoé Saldaña [Rita Mora Castro], conhecida por seus papéis nas franquias de Avatar e Marvel dão ao filme “uma dimensão comercial”.
*Com AFP
Edição: Leandro Melito