Os parlamentares sul-coreanos apresentaram o pedido de impeachment do presidente Yoon Suk Yeol na madrugada de quinta-feira (5) - horário local, final da tarde de quarta em Brasília. A moção diz que Yoon “violou a constituição e a lei” e o acusa de impor a lei marcial para evitar investigações “sobre supostos atos ilegais envolvendo ele próprio e sua família”.
A primeira lei marcial da Coreia do Sul decretada em mais de quatro décadas foi rapidamente derrubada pelos parlamentares, mas mergulhou o país em uma crise política. Parlamentares opositores pularam cercas e lutaram com as forças de segurança para entrar no parlamento e votar contra a lei marcial durante a noite de terça para quarta-feira e, em seguida, apresentaram uma moção de impeachment contra Yoon.
"Este é um momento crucial para que as pessoas saiam às ruas e continuem a exercer pressão sobre o governo. Os protestos Candlelight de 2016-2017 nos mostraram que, para derrubar um presidente corrupto, as pessoas devem continuar pressionando suas autoridades eleitas, que tentam se esquivar de derrubar um presidente por meio de todos os tipos de burocracia e legalidade", disse ao Brasil de Fato o ativista sul-coreano Dae-Han Song, chefe da equipe de conteúdo do International Strategy Center (ISC) e membro do Cold War Collective.
De acordo com a legislação sul-coreana, a moção deve ser votada entre 24 e 72 horas após ser apresentada em uma sessão parlamentar, segundo a agência de notícias estatal Yonhap. Se uma moção de impeachment for aprovada pela Assembleia Nacional, as próximas etapas serão a designação de juízes para o tribunal constitucional, para que possam decidir sobre a culpa de Yoon e sua destituição.
"O problema é que o primeiro-ministro que assumiria suas funções apresentou sua renúncia. O caminho para derrubar Yoon ainda exige muito esforço e resistência dos movimentos populares. O lado bom é que é por meio desse exercício que os movimentos pela democracia se fortalecem", analisa Song.
Em uma demonstração de indignação pública, milhares de manifestantes se reuniram em torno do escritório de Yoon em Seul na noite de quarta-feira, depois de realizarem uma manifestação na Praça Gwanghwamun, exigindo sua renúncia.
"Por enquanto, as exigências são o impeachment e a prisão do presidente Yoon por insurreição", afirma Song. "As manifestações continuarão. Esperamos que elas também continuem a crescer. Houve manifestações em frente à Assembleia Nacional para bloquear a mobilização dos militares no local. Houve protestos ontem à noite [quarta-feira]. Haverá protestos na quinta e sexta-feira à noite, todos eles culminando em protestos no sábado, quando pessoas de todo o país estarão chegando."
Até mesmo o líder do partido governista de Yoon descreveu a tentativa de lei marcial como “trágica”. Mas os legisladores do partido decidiram se opor à moção de impeachment de Yoon, informou a Yonhap. Um legislador do partido oposicionista Rebuilding Korea Party disse que ainda não havia decidido quando a moção seria votada, informou a agência.
Quem é o presidente da Coreia do Sul?
Yoon Suk Yeol, que declarou a lei marcial na terça-feira, foi eleito em 2022 como um novato político conservador, prometendo uma linha mais dura em relação à Coreia do Norte.
Ele assumiu o cargo com alguns dos mais baixos índices de aprovação de qualquer presidente sul-coreano eleito democraticamente. Esses índices caíram ainda mais na semana, para 19%, segundo a última pesquisa Gallup, com muitos expressando insatisfação com a maneira como ele lida com a economia e com as controvérsias envolvendo sua esposa, Kim Keon Hee.
Nascido em Seul em 1960, Yoon estudou direito e se tornou um promotor público famoso e defensor da luta contra a corrupção, desempenhando um papel fundamental na condenação da ex-presidente Park Geun-hye por abuso de poder.
Como principal promotor público do país em 2019, ele também indiciou um dos principais assessores do presidente cessante Moon Jae-in em um caso de fraude e suborno que manchou a imagem do governo. O conservador Partido do Poder Popular (PPP), na oposição na época, gostou do que viu e convenceu Yoon a se tornar seu candidato à presidência.
Ele venceu em março de 2022, derrotando Lee Jae-myung do Partido Democrata, mas pela margem mais estreita da história sul-coreana. Yoon nunca foi muito querido, e uma série de escândalos - incluindo a forma como seu governo lidou com a mortífera pancadaria do Dia das Bruxas de 2022 - prejudicou ainda mais sua popularidade.
Os críticos culparam o governo de Yoon pela inflação dos alimentos, pela economia atrasada e pelas crescentes restrições à liberdade de expressão. Ele também foi acusado de abusar dos vetos presidenciais, principalmente para derrubar um projeto de lei que teria aberto caminho para uma investigação especial sobre o suposto envolvimento de sua esposa na manipulação de ações.
Yoon sofreu mais danos à sua reputação no ano passado, quando sua esposa foi filmada secretamente aceitando uma bolsa de grife no valor de US$ 2 mil (R$ 12 mil) como presente. Yoon insistiu que teria sido rude recusar.
Sua sogra, Choi Eun-soon, está cumprindo pena de um ano de prisão por falsificar documentos financeiros em um negócio imobiliário. Ela deve ser libertada em julho. No início deste ano, Yoon foi alvo de uma petição pedindo seu impeachment, que se tornou tão popular que o site do parlamento que a hospedava sofreu atrasos e travamentos.
A mídia local informou que Yoon é particularmente inspirado pelo antigo primeiro-ministro britânico Winston Churchill. Como presidente, Yoon manteve uma postura rígida contra Pyongyang e reforçou os laços com o aliado tradicional de Seul, os Estados Unidos.
No ano passado, ele cantou a famosa música “American Pie”, de Don McLean, durante sua visita à Casa Branca, à qual o presidente dos EUA, Joe Biden, respondeu: “Eu não tinha a menor ideia de que você sabia cantar”.
Mas seus esforços para restabelecer os laços com o antigo governante colonial da Coreia do Sul, o Japão, não agradaram a muitos em casa, pois a questão continua sensível no país. O retorno do ex-presidente dos EUA, Donald Trump - que teve cúpulas históricas, mas que acabaram fracassando, com o líder da Coreia do Norte, Kim Jong Un, enquanto estava no cargo - pode criar outra camada de tensão, dizem os especialistas.
Edição: Rodrigo Durão Coelho