NÃO VINCULATIVO

Com apoio de movimentos populares, parlamento francês ratifica posição contra acordo Mercosul-UE

'Estamos contra esse acordo de livre comércio neocolonial', disse ao Brasil de Fato Morgan Ody, da Via Campesina

Brasil de Fato | São Paulo (SP) |
Agricultores franceses participam de uma manifestação organizada pelo sindicato de agricultores contra o acordo Mercosul-UE em 26 de novembro de 2024 - OLIVIER CHASSIGNOLE / AFP

O Parlamento francês rejeitou nesta terça-feira (26) por 484 votos a 70 o acordo de livre comércio negociado entre a União Europeia e os países do Mercosul, após uma votação na Assembleia Nacional na terça-feira, 26 de novembro. Essa votação não vinculativa ocorre uma semana após o início de uma campanha de agricultores contrários a esse acordo comercial, para o qual apenas a Comissão Europeia (ce) está autorizada a negociar em nome dos 27 Estados-Membros.

Atualmente liderada por Ursula Von der Leyen, a comissão negocia em nome dos países europeus há mais de duas décadas, e Alemanha e Espanha pressionam para concluir um pacto com o Mercosul até o final do ano.

Na Câmara, a Ministra da Agricultura da França, Annie Genevard, disse à Câmara que “nas condições atuais” o projeto de acordo entre a UE e o Mercosul não garante “condições justas de concorrência”, rejeitando a oposição “antecipadamente e por princípio a qualquer acordo de livre comércio”.

Toda a classe política francesa, da esquerda radical à extrema direita, manifestou a sua oposição ao acordo que está sendo negociado entre os 27 países da UE e Argentina, Brasil, Paraguai e Uruguai, pelo Mercosul. A votação de terça-feira foi marcada por protestos contra o acordo em toda a França, incluindo os movimentos populares que integram a Via Campesina.

"Os movimentos camponeses começaram de novo os protestos em oposição contra esse apoio de livre comércio, principalmente na França, em um contexto onde o campesinato sofre com doenças agrárias e preços muito baixos. As mobilizações continuam e dizemos a Macron que se fechar esse acordo é o fim de sua vida política. Se ele perde essa batalha, toda a sua legitimidade que já está muito baixa vai ser totalmente perdida. Por isso coloca tanta energia para que a Comissão Europeia não firme o acordo", disse ao Brasil de Fato Morgan Ody, coordenadora geral da Via Campesina na Europa.

Presente no G20 Social realizado no Rio de Janeiro (RJ) na primeira quinzena de novembro, Ody ressalta que essa posição é compartilhada com os movimentos que integram a Via Campesina na América do Sul. 

"Estivemos com muitos companheiros do Brasil, Argentina, Paraguai e Uruguai. Por parte dos movimentos camponeses da Via Campesina, estamos todos contra esse acordo de livre comércio neocolonial, que vai extrair minérios e produtos básicos da América Latina, para que compre produtos mais industrializados."

Ela aponta que é "difícil entender essa posição" do presidente brasileiro Luiz Inácio Lula da Silva, que busca fechar o acordo a todo custo, expectativa frustrada durante a vinda de Macron ao Brasil no encontro do G20 na última semana. O acordo Mercosul-UE, aponta Ody, destoa da proposta brasileira de segurança alimentar e combate à fome expressa na Aliança Global Contra a Fome e a Pobreza.

"Não entendemos porque Lula apoia esse acordo de livre comércio, a não ser pelo agronegócio no Congresso.Temos muito adminiração por Lula e não compreendemos porque está apoiando um acordo do passado, que vai ser ruim para o meio ambiente, para o desenvolvimento e para as classes trabalhadoras." 

A eleição de Donald Trump para a presidência dos Estados Unidos, deve manter estagnada a Organização Mundial do Comércio (OMC). Frente a este cenário, a Via Campesina estpa trabalhando em uma proposta para um novo marco internacional de comércio baseado na soberania alimentar e na solidariedade internacional.

"Temos que construir novas relações comerciais baseadas na soberania alimentar, na solidariedade e no direito ao desenvolvimento. A Via Campesina acredita que este é o momento de começar a trabalhar outros tipos de acordos comerciais, que não sejam baseados na especulação e na destruição das produções locais. Precisamos de acordos que respeitem a soberania e sejam a favor do desenvolvimento e dos direitos dos trabalhadores de ambos os lados", defende Ody.

Edição: Rodrigo Durão Coelho