Risco socioambiental

Defensoria de SP vai à Justiça para suspender obra de túnel na Vila Mariana por impacto em moradias

Intervenção viária, que resulta ainda em corte de árvores, também é alvo de recomendação do Ministério Público

Brasil de Fato | Fortaleza (CE) |
Co-vereadora Silvia Ferraro, do mandato Bancada Feminista, esteve no local das obras onde árvores continuam sendo derrubadas - Reprodução/Redes sociais

A Defensoria Pública de São Paulo (DPE-SP) ingressou com uma Ação Civil Pública (ACP) para requerer a suspensão das obras do Complexo Viário Sena Madureira devido aos impactos causados nas moradias da comunidade Souza Ramos, que fica ao lado da construção, na Vila Mariana, Zona Sul da capital paulista. A ação aponta que o maquinário pesado e a movimentação constante de solo resultam em rachaduras e infiltrações nas construções da comunidade.

A intervenção viária também é alvo de recomendação do Ministério Público de São Paulo (MPSP), que, nessa quinta-feira (7), pediu a interrupção da obra para que sejam feitos novos estudos técnicos. Ativistas ambientais e parlamentares fazem protestos no local e chamam atenção para o corte de mais de 170 árvores.

No documento, a defensoria argumenta que as obras, retomadas recentemente, têm provocado "diversos impactos aos imóveis, criando verdadeiro risco de deslizamento de terras", o que pode ocasionar não só a destruição dos imóveis, mas também "atenta contra a própria vida" dos moradores. As alterações provocadas pela obra foram constatadas em vistoria técnica e estão registradas em boletim de ocorrência feito por um das pessoas atingidas.

O órgão destaca ainda que a comunidade Souza Ramos busca, desde 2013, o reconhecimento do direito à Concessão de Uso Especial para Fins de Moradia (CUEM), que visa garantir a posse segura dos imóveis. André Luiz Gardinal Silva, coordenador auxiliar do Núcleo Especializado de Habitação e Urbanismo da DPE-SP, enfatiza que essa concessão "trata-se de direito subjetivo e, nessa linha, não se enquadra no espectro de oportunidade e conveniência do administrador público". 

A ACP também aponta preocupações relacionadas ao licenciamento das obras. A autorização ambiental tramita na Secretaria do Verde e Meio Ambiente da prefeitura e, de acordo com Gardinal, "não é possível verificar se referido licenciamento menciona as medidas que serão adotadas em relação à área da Favela Sousa Ramos, já que todos os seus documentos estão com acesso restrito". 

A defensoria aguarda agora uma decisão sobre o pedido de liminar para que a obra seja suspensa "até a realização de uma perícia judicial que possa garantir a segurança das famílias da comunidade Souza Ramos".

Impacto socioambiental

A recomendação do Ministério Público de São Paulo (MP-SP) indica que são necessários novos estudos técnicos que dimensionem a intervenção, nos campos "socioambientais e urbanísticos".

O documento expedido pelos promotores da capital Moacir Tonani Júnior, da Habitação e Urbanismo; e Carlos Henrique Prestes Camargo, do Meio Ambiente  cita a retirada "indiscriminada de árvores" e o "desmatamento de áreas de preservação permanente", afetando, por exemplo, o córrego Emboaçu, nascente de grande importância para a região. Destaca ainda o risco para as aves que habitam as copas das árvores, com a destruição de ninhos e morte de espécies.

Protestos

A Guarda Civil Metropolitana (GCM) vem reprimindo protestos contra o corte de árvores no local da obra. Nesta sexta-feira (8), um tumulto envolveu a co-vereadora Silvia Ferraro, do mandato coletivo Bancada Feminista (Psol). Nas redes sociais, um vídeo mostra a discussão dela com a GCM, que tenta impedir a entrada da parlamentar no local em que as árvores estão sendo cortadas. 

"Nossa mandata esteve lá e tentaram impedir que cumpríssemos o nosso papel, de fiscalizar esse absurdo. Não vamos deixar que a prefeitura de São Paulo acabe com o que resta de verde na nossa cidade, praticando crime contra o meio ambiente em plena luz do dia!", diz a postagem do coletivo no Instagram.

Na tarde de quinta-feira (7), a situação envolveu a vereadora eleita Renata Falzoni (PSB), que foi retirada à força do local, sendo carregada por agentes da guarda. "A prefeitura de São Paulo insiste no crime ambiental e corta árvores imensas para dar lugar a dois túneis que não resolverão em nada o trânsito da região. Inacreditável que a Justiça ainda não tenha decidido pela paralisação dessa obra. O tempo é crucial, são momentos decisivos para salvar esse corredor verde", escreveu no Instagram.

O que diz a prefeitura

A prefeitura de São Paulo aponta que a obra do Túnel Sena Madureira vai beneficiar mais de 800 mil pessoas. "A intervenção prevê melhor fluidez do trânsito, comportando ônibus e veículos utilitários e garantindo a interligação entre a Vila Mariana, Ipiranga, Itaim Bibi e Morumbi", informou em nota. 

O governo municipal diz ainda que a obra foi autorizada pela Secretaria Municipal do Verde e do Meio Ambiente, com a retirada de 172 árvores, "sendo preservadas as demais 362 árvores existentes no local". A compensação será feita com plantio de 266 mudas dentro do perímetro da obra e apenas com espécies nativas. "O replantio deverá ser executado até o fim das obras." 

Sobre a remoção de famílias para a construção do túnel, a prefeitura informou que a Secretaria Municipal de Habitação segue em diálogo com os residentes na área de intervenção das obras. 

Na terça-feira (5), segundo o governo, a equipe da pasta fez uma reunião com a comunidade para informar sobre o processo de atendimento habitacional. 

O órgão diz estar comprometido com "o atendimento definitivo, com opções de indenização de seus imóveis ou a realocação em uma nova unidade habitacional, sendo que nenhuma família residente no local ficará desalojada".

O Brasil de Fato também solicitou, nesta sexta-feira (8), posicionamento da prefeitura sobre a ação da DPE-SP e aguarda retorno. A reportagem pediu esclarecimentos ainda à GCM.

Edição: Martina Medina