O Congresso Nacional, em Brasília, será a sede da 10ª Cúpula de Presidentes dos Parlamentos dos Países do G20 (P20), entre os dias 6 e 8 de novembro. O evento precede a Cúpula de Chefes de Estado do bloco, que acontece nos dias 18 e 19 de novembro, no Rio de Janeiro.
O P20 foi criado em 2010 com o objetivo de envolver os legislativos na elaboração de propostas e medidas que garantam a aplicação dos acordos internacionais celebrados pelas reuniões de alto nível do bloco. O tema do encontro deste ano será "Parlamentos por um Mundo Justo e um Planeta Sustentável", e vai discutir os três grandes temas propostos pela presidência do Brasil à frente do G20, que são a reforma do sistema de governança global, o combate à fome, à pobreza e às desigualdades, e o enfrentamento à emergência climática.
O especialista em relações internacionais Pedro Bocca lembra que o G20 não é uma instância que toma decisões vinculantes. Apenas adotam resoluções, sempre por consenso, que podem ou não serem seguidas pelos países membros. Portanto, recomenda Bocca, não se deve criar expectativa sobre temas que possam dividir os membros do bloco. "Nunca teve uma recomendação no G20 no campo de direitos humanos, por exemplo, que fale sobre população LGBTQIA+. Tem a Arábia Saudita, tem Rússia, portanto, nunca iria passar."
O mesmo se aplica, de forma mais acentuada, nos parlamentos, que muitas vezes têm posições ainda mais conservadoras do que o governo central. "Isso já é uma barreira por si só, a impossibilidade de que uma recomendação que saia do G20 por mais progressista que seja", afirma.
No entanto, Bocca pondera que, ao se distanciar das disputas políticas internas em um contexto de negociações multilaterais, é possível que se chegue a declarações de caráter progressista.
"Por mais que nós tenhamos ali parlamentares mais conservadores, a perspectiva é que os acordos nas agendas internacionais sejam mais brandos do que as próprias resoluções que eles teriam internamente, justamente pela própria falta de detenção cotidiana da política. O outro ponto que tem que ser considerado é que num ambiente internacional, esses parlamentares não estão procurando voto, não estão pensando no cálculo eleitoral. Então parece que é muito mais fácil aparecer recomendações do próprio P20, que vão num caminho um pouco mais progressista democrático do que esses próprios parlamentares se posicionam no jogo da política interna", avalia.
Sendo assim, segundo o especialista, além da demarcação de posição e da visibilidade aos debates, as declarações do P20 terão dificuldade de sair do papel. "Se as próprias recomendações de líderes não são vinculantes, imagina dos grupos", diz Bocca.
Ao final do encontro, será emitida uma declaração conjunta dos parlamentos, que será encaminhada à Cúpula de Líderes do G20.
Mulheres no P20
O primeiro dia de atividades do P20 será dedicado ao debate sobre a implementação das propostas que surgiram da 1ª Reunião das Mulheres Parlamentares do P20, realizada no mês de julho, em Maceió (AL), sobre justiça climática e do desenvolvimento sustentável sob a perspectiva de gênero e raça, ampliação da representatividade feminina em espaços decisórios e o combate às desigualdades de gênero e raça.
Uma das propostas é a institucionalização do encontro de parlamentares mulheres como primeira atividade das cúpulas do P20 que venham a ser realizadas posteriormente. As parlamentares mulheres defendem ainda que sejam adotadas cotas para a participação das mulheres na política e a adoção de medidas que valorizem o trabalho não remunerado de cuidados e doméstico, além do permanente fomento à participação das mulheres nos espaços de decisão política.
Sônia Coelho, integrante da Marcha Mundial de Mulheres, avalia que o fórum de parlamentares mulheres do G20 agrega pouco às discussões que o movimento feminista acumula sobre a pauta e vê limitadas possibilidades de avanços para o aumento da representatividade feminina nos espaços de poder. "Da forma como se dá a eleição aqui no Brasil, é muito difícil que a gente tenha grandes alterações sobre a realidade da participação das mulheres na política", avalia.
Coelho lembra que, recentemente, o Congresso Nacional aprovou a Proposta de Emenda à Constituição (PEC) 9, que anistiou os partidos políticos que não cumpriram com as regras relacionadas às cotas de candidaturas de mulheres, pessoas negras e LGBTQIAPN+ nas eleições.
"Isso foi uma derrota muito grande para as mulheres, para a população negra. A gente pode aprovar, fazer essas alterações, porque depois eles revertem no Congresso, passam por cima. Não cumpre e não acontece nada. Então esse é um exemplo terrível de como esse Congresso não respeita os pactos políticos no Brasil. Em geral, não tem o menos compromisso com ampliar a participação das mulheres, das mulheres de negras, da população LGBTQIA+", relembra.
Finalmente, Coelho lembra que a luta feminista não advoga pela representação pura e simples, mas pela qualidade das mulheres que devem estar nos parlamentos, dispostas a serem mais uma trincheira das causas históricas das mulheres. "Nós queremos mulheres no poder que tenham uma plataforma feminista, antirracista, classista", defende.
As reuniões do P20 serão transmitidas pela TVs Câmara e Senado, em português, inglês e espanhol. Os links de transmissão e a programação completa estão disponíveis no site do Congresso Nacional.
Edição: Thalita Pires