A educadora mineira e assistente social Macaé Evaristo tomou posse nesta sexta-feira (27) como ministra dos Direitos Humanos e Cidadania (MDHC). Apenas mulheres compuseram o palco da cerimônia, realizada no Palácio do Planalto. Além da primeira-dama, Janja da Silva, as ministras Cida Gonçalves, das Mulheres; Esther Dweck, da Gestão e Inovação; Nísia Trindade, da Saúde; Marina Silva, do Meio Ambiente e Anielle Franco, da Igualdade Racial.
“A voz de minha bisavó ecoou criança nos porões do navio, ecoou lamentos de uma infância perdida”, declamou a poeta e escritora negra, Conceição Evaristo, prima de Macaé, na abertura da atividade, trecho do poema Vozes-Mulheres, de sua autoria.
A ministra empossada afirmou em seu discurso que trabalhará para resgatar a alegria, e defendeu a vocação do MDHC de cuidar da diversidade e ofertar vida digna para todos os brasileiros. “O poder autoritário necessita da tristeza, porque consegue dominá-la. A alegria das crianças é, portanto, resistência, porque elas não se rendem”, declarou.
“Recebi o honroso convite para fazer parte do seu governo, presidente Lula. E tomo posse sem perder de vista a maior credencial que é ser uma pessoa absolutamente comum”, disse.
Evaristo relembrou ainda os eventos históricos que marcaram a luta do povo negro no Brasil e no mundo, como a Revolução Haitiana, que libertou o país caribenho do colonialismo francês, e o Quilombo dos Palmares, referências da luta pela liberdade, segundo a ministra.
“Para nós, Direitos Humanos não é retórica. Ele só faz sentido se for materializado na vida cotidiana das pessoas comuns, como eu”, ressaltou. O Ministério dos Direitos Humanos e Cidadania está de pé, está vivo, e temos muito trabalho por fazer”, finalizou.
Não houve declarações, além da própria ministra. Macaé Evaristo assume o ministério após a saída do jurista Silvio Almeida, acusado de ter assediado sexualmente diferentes mulheres que denunciaram por meio da ONG Me Too, além da colega, a ministra da Igualdade Racial, Anielle Franco. Almeida nega as acusações.
Além de tocar as ações do ministério, Evaristo terá a missão de apurar casos de assédio moral praticados por servidores da pasta. As denúncias foram reveladas pelo Brasil de Fato, contra o secretário de Defesa dos Direitos da Criança e Adolescente, Cláudio Augusto Vieira da Silva. Ele foi exonerado pela nova ministra, que já estava no exercício do cargo desde o dia 10 de setembro.
Minas Gerais representado
A vice-presidente da Assembleia Legislativa de Minas Gerais (ALMG), a deputada estadual Leninha (PT-MG), disse ser emblemática a nomeação de Macaé Evaristo ao cargo.
“Os direitos humanos e a cidadania para o nosso corpo preto, pobre, das periferias. E Macaé une condições bem favoráveis para assumir bem esse papel, para ela poder desenvolver um trabalho pelo país afora, também a partir de Minas gerais, que é o chão dela, das experiências do estado. Então eu creio muito que a gente vai ter um novo ciclo para esse debate sobre os direitos humanos do Brasil com a presença de Macaé”.
A deputada lembrou que a presença de um petista mineira na Esplanada dos Ministérios era uma reivindicação da bancada de Minas no Congresso.
“É uma honra Minas Gerais, no governo Lula, estar agora sendo representado por alguém do partido, do PT. Eu acho que tinha essa dívida com Minas. E cumprir esse compromisso com Minas Gerais, indicando uma mulher, uma mulher negra, das periferias, como a nossa deputada estadual Macaé Evaristo, para a gente é muito mais do que simbólico”.
Crime no Rio Doce
Atingidos pelo crime da Samarco/Vale/BHP, ocorrido em 2015, em Mariana (MG), estiveram presentes na cerimônia, e defenderam uma repactuação do acordo com as mineradoras que garanta os direitos dos atingidos, que ainda aguardam reparação nove anos depois do rompimento da barragem do Fundão. Eles entregaram um documento à ministra recém-empossada, no qual pedem ao governo que tenham espaço de participação na negociação sobre a repactuação dos compromissos assumidos pelas empresas na reparação do crime.
No ofício, os representantes dos atingidos no Comitê Interfederativo que acompanha o caso, defendem ainda uma escuta ativa das comunidades atingidas, o controle social sobre os recursos do acordo de reparação, a legitimação das comissões locais e a limpeza completa do Rio Doce, que segue contaminado. “Neste momento não tem nenhum representante dos atingidos nessa mesa de negociação. Neste momento, estão o governo federal, o governo dos estados e as prefeituras, enquanto os atingidos estão, literalmente, com o pé na lama”, disse o atingido Miguelito Teixeira, do município de Conselheiro Pena.
“Em muitos municípios, os atingidos estão morrendo de doenças, de deficiência alimentar, está passando por várias situações críticas, pela ausência da reparação”, reclamou Marilândia, atingida do município de Colatina (ES).
Os atingidos disseram que a ministra se comprometeu em recebê-los brevemente para discutir as demandas.
Quem é Macaé Evaristo?
Macaé foi a primeira mulher negra a ocupar os cargos de secretária de Educação em Belo Horizonte (2005 a 2012) e no estado de Minas Gerais (2015 a 2018). A especialista chegou a coordenar programas sobre implementação de escolas indígenas e escolas de tempo integral em no estado.
Entre 2013 e 2014, comandou a Secretaria de Educação Continuada, Alfabetização, Diversidade e Inclusão, subpasta ligada ao Ministério da Educação, durante o governo Dilma Rousseff (PT). Nesta época, atuou para implementar medidas de cotas para estudantes de públicas, negros e indígenas nas universidades.
Em 2022, foi eleita deputada estadual em Minas com 50.416 votos. No mesmo ano, Evaristo participou do governo de transição de Lula no grupo sobre educação. "A prioridade é recompor o orçamento do Ministério da Educação (MEC) para o fortalecimento das políticas de educação integral, diversidade e inclusão em todos os níveis, da educação infantil à universidade", destacou na época em suas redes sociais.
Ela também é prima da premiada escritora Maria da Conceição Evaristo. Sua biografia está registrada no livro Macaé Evaristo – Uma força negra na cena pública, escrito por Jailson de Souza e Silva e Eliana Sousa e Silva e publicado em setembro de 2020 pela editora Eduniperiferias.
Edição: Nathallia Fonseca