Agro é veneno

Cientistas e ativistas críticos ao agro são fichados em base de dados da indústria de agrotóxicos

Agência ligada à indústria teria recebido 'mais de US$ 400 mil' dos EUA entre 2013 e 2019

Brasil de Fato | São Paulo (SP) |
Atualmente, mais de 100 agrotóxicos diferentes usam o glifosato em sua composição - PABLO AHARONIAN / AFP

Cerca de 500 cientistas e ativistas críticos da indústria agroquímica foram fichados em uma base de dados usada para "contrapor a oposição aos pesticidas", revelaram vários meios de comunicação nesta sexta-feira (27).

O meio investigativo Lighthouse Reports obteve documentos internos de uma plataforma privada chamada Bonus Eventus, que foram compartilhados com diversos veículos internacionais, incluindo Le Monde, na França, e The Guardian, no Reino Unido.

Segundo o Le Monde, por meio dessa plataforma, os principais fabricantes de agrotóxicos e biotecnologias tiveram acesso, durante vários anos, "a um grande arquivo de personalidades consideradas 'críticas' à agricultura intensiva, que utiliza massivamente insumos químicos e organismos geneticamente modificados (OGM)".

"A natureza dos dados coletados deixa poucas dúvidas sobre a intenção de desacreditar os alvos ou desestabilizá-los, colocando à disposição dos membros da Bonus Eventus um arsenal de argumentos ou informações, por vezes sensíveis", destaca o Le Monde.

Segundo o Lighthouse Reports, a v-Fluence recebeu entre 2013 e 2019 "mais de US$ 400 mil" (R$ 2,1 milhões) do governo dos Estados Unidos — principalmente por meio da agência de desenvolvimento USAID — "como parte de seu programa de promoção de OGMs na África e na Ásia".

A prática de coletar informações sobre críticos da indústria agroquímica lembra o escândalo dos arquivos de personalidades públicas, jornalistas e ativistas compilados pela empresa americana de agroquímicos Monsanto, com o objetivo de influenciar a opinião pública sobre a proibição do herbicida glifosato. A Monsanto, adquirida pelo grupo alemão Bayer, foi multada em julho de 2021 em 400 mil euros pela CNIL, agência francesa de proteção de dados pessoais.

Segundo a CNIL, o arquivo continha, para cada uma das mais de 200 personalidades registradas, uma "nota de 1 a 5" para "avaliar sua influência, sua credibilidade e seu apoio à empresa Monsanto em diversos assuntos, como pesticidas ou organismos geneticamente modificados".

O presidente da v-Fluence e ex-diretor de comunicação do grupo Monsanto, Jay Byrne, declarou à AFP que "as alegações da ONG Lighthouse e de outros grupos com os quais colabora baseiam-se em afirmações manifestamente enganosas, erros factuais sobre nosso trabalho e nossos clientes, e mentiras inventadas".

Na resposta ao Lighthouse, compartilhada com a AFP, Byrne indica que as informações que a v-Fluence compartilha com seus clientes estão "publicamente disponíveis" e representam "todos os pontos de vista".

Byrne afirmou ao Lighthouse que a v-Fluence "não trabalha para a USAID" e "não tem contrato" com a organização.

*Com AFP

                

Edição: Leandro Melito