NOITE DE TERROR

Ruralistas ferem seis indígenas em ataque a tiros no Paraná: 'falavam que iam cortar nossa cabeça'

Fazendeiros e capangas atacaram os Avá Guarani no território retomado em Guaíra, segundo relatos dos indígenas

Brasil de Fato | São Paulo (SP) |

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Os indígenas sofrem com ataques desde que iniciaram a retomada do território, no início de julho - Arquivo Cimi Sul

Indígenas Avá Guarani viveram horas de terror na madrugada desta quarta-feira (28), no município de Guaíra (PR), na Terra Indígena Tekoha Guasu Guavirá, numa série de investidas feitas por fazendeiros e capangas. De acordo com informações do Conselho Indigenista Missionário (Cimi), seis pessoas ficaram feridas e quatro precisaram ser internadas, duas em estado grave. Uma mulher ficou com muitos estilhaços pelo corpo. Os tiros foram disparados com espingarda de chumbo que, se efetuados a curta distância, podem ser fatais.

Além de armas de fogo, os agressores tinham motosserras. "Eles falavam que iam cortar a cabeça da gente com motosserra. Tinha tiros o tempo inteiro", relata uma das vítimas.

A mulher, que pede para não ser identificada, conta que o ataque aconteceu em uma área de plantação de soja. "Não tinha pé de árvore para a gente se proteger", diz. Pouco antes do início dos disparos, havia crianças no local, que foram levadas para um lugar seguro a tempo de se protegerem da violência.

As vítimas buscaram abrigo em uma vala cavada na terra, mas o esconderijo não foi suficiente. Uma das mulheres foi atingida por vários disparos na região do peito e da barriga. Ela foi socorrida e transferida para uma unidade de saúde no município de Cascavel, a cerca de 150km de Guaíra. Outros tiveram ferimentos nos braços, peito e no rosto.

Desde o mês de julho, os indígenas vivem sob ataques e ameaças na região. "Eu já passei por alguns ataques, mas ontem eu vi que eles não têm mais medo de mostrar a arma", diz uma das vítimas.

A área ocupada pelos indígenas ainda não foi demarcada pela Fundação Nacional dos Povos Indígenas (Funai), embora faça parte do território tradicional dos Avá Guarani, na região oeste do Paraná. No início de julho deste ano, os indígenas iniciaram o movimento de retomada do território. A Terra Indígena Tekoha Guasu Guavirá tem 24 mil hectares e foi delimitada pela Funai em 2018. Os Avá Guarani aguardam a demarcação das terras. A Funai informa que acionou os órgãos competentes e solicitou reforço na proteção dos indígenas às forças policiais. 

Poder público

O Ministério da Justiça e Segurança Pública informa que a Força Nacional atua na região desde 19 de janeiro de 2024. "As ações ocorrem em apoio à Funai, em ações articuladas com os órgãos de segurança pública do Paraná, sob a coordenação da Polícia Federal, nos termos da Portaria 744, de 9 de agosto de 2024. O efetivo mobilizado na região deverá permanecer, pelo menos, até 8 de novembro deste ano", informa o ministério, por meio de nota.

O governo do Paraná lamentou, também por meio de nota, a escalada da violência e reforçou que por se tratar de povos indígenas, a responsabilidade da intermediação é do Ministério da Justiça, Funai e Polícia Federal. Em julho, o governador do estado, Ratinho Jr., chamou os Avá Guarani de "índios paraguaios". "Nós não vamos admitir que índios paraguaios invadam terras privadas aqui no Paraná", afirmou o governador, em vídeo gravado no dia 31 de julho, no Palácio Iguaçu. 

Em nota, o Ministério dos Povos Indígenas (MPI) informou que está se articulando com órgãos nacionais e estaduais "para uma ação integrada que estabeleça o diálogo e evite conflitos maiores". "O MPI ativou a Sala de Situação interinstitucional para acompanhar os conflitos, ouviu os relatos dos órgãos envolvidos e está montando uma equipe volante para acompanhar a situação “in loco”. Outras medidas incluem a solicitação de reforço policial à Secretaria de Segurança do Paraná", declarou o ministério.

Já a Funai disse que "acompanha o caso por meio da sua unidade descentralizada na região, localizada em Guaíra (PR), e da Ouvidoria". "A instituição acionou os órgãos competentes e solicitou reforço na proteção dos Ava Guarani às forças policiais", afirmou o órgão em nota.
 

Edição: Nicolau Soares