Na reta final dos Jogos Olímpicos de Paris, o Brasil ainda tenta conquistar mais algumas medalhas e terminar bem posicionado no quadro geral.
Nesta sexta-feira (9), o país alcançou sua treceira medalha de ouro, com a vitória da dupla Duda e Ana Patrícia na final do vôlei de praia. Além delas, Isaquias Queiroz conseguiu garantir seu lugar no pódio na categoria C1 1000 metros da canoagem, com uma medalha de prata. E Alison dos Santos, conhecido como Piu, levou a de bronze nos 400 metros com barreiras do atletismo.
As três novas medalhas fizeram o Brasil acumular, por enquanto, um total de 18 nesta edição das Olimpíadas: três de ouro, seis de prata e nove de bronze. Além de estar distante do recorde de 21 medalhas conquistadas em Tóquio, em 2020, faltando dois dias para o fim das Olimpíadas em Paris, o número de medalhas de ouro é menor.
Ministro do Esporte no governo Dilma Rousseff (PT), Ricardo Leyser falou sobre o desempenho brasileiro na França ao jornal Central do Brasil. E fez elogios, já que o país poderia saltar pelo menos 10 posições no quadro geral de medalhas se o maior número de ouros não influenciasse no ranking.
"É importante que a gente explique para o público que não existe uma tabela de classificação dos países. Essa tabela é uma convenção das televisões. Por exemplo, mais do que a quantidade de ouro, é muito mais importante a gente olhar a quantidade de medalhas, e aí o Brasil está melhor", avalia o ex-ministro.
Leyser explica a relação do desempenho dos atletas com o investimento público feito no esporte, que ficou prejudicado no Brasil nos últimos anos. E cita a importância da reconstrução e retomada de investimento em políticas públicas no governo Lula. Segundo levantamento da Universidade de Brasília (UnB) com o Instituto Federal de Goiás (IFG), o Bolsa Atleta acabou recebendo menos financiamento público nos governos de Michel Temer (MDB) e Jair Bolsonaro (PL), que ainda extinguiu o Ministério dos Esportes.
O ex-ministro, que também é membro do Conselho de Administração do Comitê Olímpico Brasileiro (COB), ainda explica porque o país conseguiu ir melhor em algumas modalidades do que em outras e da importância do esporte também para a saúde e educação.
Assista no vídeo acima e leia abaixo a entrevista na íntegra:
Brasil de Fato: Para um país ir bem nas Olimpíadas, é preciso investimento público no esporte. Qual a situação atual do Brasil quando falamos disso, do peso dos programas de investimento do governo como o Bolsa Atleta e outros nos resultados que a gente tem visto?
Ricardo Leyser: O peso é gigantesco. O Brasil conseguiu, nas duas últimas décadas, estruturar, pela primeira vez, um sistema de financiamento para o esporte brasileiro. Começa com a Lei de Loterias, a antiga lei Agnelo Piva, já implementada no primeiro ano do governo Lula, e uma série de outros mecanismos de apoio. Como o Bolsa Atleta, que hoje é o principal mecanismo de sustento dos nossos atletas, obviamente; a Lei de Incentivo ao Esporte, que permite que as empresas possam participar desse esforço, e todo um conjunto regulatório que construiu esse momento. Que permite o Brasil ter uma posição um pouquinho mais condizente com o seu desempenho, do seu desempenho esportivo com seu tamanho, com a sua economia, aproximando-se aí de estar entre os dez primeiros. Então a gente conseguiu nos últimos 20 anos construir esse sistema.
Foi ameaçado nos últimos seis anos, existiram perdas, houve perda de financiamento, perda institucional com o final do Ministério do Esporte. E agora a gente está vivendo nesse último ano e meio a reconstrução desse sistema, que é fundamental para os próximos desempenhos. A gente está vivendo agora em Paris ainda o esforço do Rio 2016, o esforço que o país fez para chegar bem em 2016.
Mas a gente precisa agora começar a olhar para 2028, 2032, e aí o desafio é maior por causa dessa lacuna de seis anos que a gente teve de diminuição de financiamento, de extinção do Ministério do Esporte, perda das políticas públicas.
O Brasil não ganhou até agora tantas medalhas de ouro como em Tóquio, mas teve conquistas históricas, como a primeira medalha por equipe na ginástica, a de bronze. Como avalia o desempenho do Brasil quanto a isso nessa edição?
É importante que a gente explique para o público que não existe uma tabela de classificação dos países. Essa tabela é uma convenção das televisões. Por exemplo, mais do que a quantidade de ouro, é muito mais importante a gente olhar a quantidade de medalhas. E aí o Brasil está melhor. Você pode ver também os outros resultados, a gente teve alguns resultados de quarto lugar que são fundamentais. É normal. Nós vamos pensar que, para ganhar muitas medalhas, nós vamos perder muitas medalhas, porque você leva uma delegação com, por exemplo, 100 chances e nem todo mundo, por N questões, vai conseguir performar aquela expectativa. Seja porque, óbvio, o adversário se preparou melhor, seja porque você não vai estar num bom dia, seja porque a arbitragem tomou uma decisão polêmica. Tem várias situações.
Algumas chances vão se confirmar, outras não, isso é o natural do esporte, é o esperado. Alguns favoritos não vão performar e outros vão surpreender. O próprio Netinho [Edival Pontes, taekwondista brasileiro que conquistou o bronze nesta quinta-feira, 8 de agosto] não era considerado um favorito para a medalha. E o nosso futebol feminino está surpreendendo nessa reta final. A gente tem que olhar a quantidade de medalhas, os resultados de finais, a evolução. Então a gente nunca teve uma final, passou a estar numa final, fez um resultado melhor. Como no tênis de mesa, o [Hugo] Calderano, o melhor resultado da história, um quarto lugar.
Vamos olhar a quantidade de modalidades também, porque às vezes você tem um país que tem uma atleta fenomenal que ganha duas, três medalhas de ouro numa disciplina qualquer. Isso não traduz o desempenho e o desenvolvimento esportivo de um país. Quando você tem medalha, como nós tivemos, em tantas modalidades, mostra também que o país tem um grau maior de desenvolvimento esportivo e isso é muito fruto dessas políticas públicas. A ginástica não é uma modalidade que o Brasil tinha grande tradição e hoje o Brasil é uma potência. Porque houve um investimento, houve um aprendizado, um intercâmbio com os países, tudo isso sustentado por um financiamento e um planejamento que tiveram origem pública.
E pensando nesses resultados, o que esperar do futuro? Podemos esperar por resultados ainda melhores daqui pra frente?
Eu acho que a gente tem um desafio, que é a sucessão dessa geração de 2016 que chega ainda em Paris. Como, por exemplo, o Isaquias [Queiroz, canoísta], a própria Rebeca [Andrade, ginasta], que estava contundida em 2016, mas faz parte desse esforço. Porque nós conseguimos manter as políticas públicas para o esporte de alto rendimento, como o Bolsa Atleta, mas a gente perdeu muito nas políticas de esporte de base. Então, nós temos que lembrar que o Isaquias começou a fazer esporte e até contato com a canoagem num programa social financiado pelo Ministério do Esporte, que era o Segundo Tempo. [Esse programa] permitiu que ele, na cidade natal, em Ubaitaba [BA], tivesse o primeiro contato com a canoagem. E aí são muitos anos antes. Ele tem um potencial, claro, de desenvolvimento atlético, no alto rendimento, de ser um possível medalhista.
A própria Rebeca também, quando criança, [começou] num programa da prefeitura de Guarulhos [SP], que também tinha um financiamento do Ministério do Esporte. Então, o que aconteceu? Nesses seis anos, a gente não teve mais essa quantidade de programas sociais e de oportunidade para que as crianças brasileiras tivessem essa iniciação esportiva. Isso meio que traz uma ameaça para o futuro, porque a gente tem menos atletas sendo formados para serem desenvolvidos e virarem grandes campeões.
O Marcus Vinicius [D’Almeida], do tiro com o arco, esteve no Ministério do Esporte com um programa de desenvolvimento [quando] ele tinha 15 anos. Nesses últimos anos, a gente não teve esses jovens sendo formados, se destacando, para que a gente pudesse investir e eles poderem galgar os passos do alto rendimento. Nós temos hoje uma boa estrutura, boas políticas públicas de alto rendimento, mas a falta dos programas esportivos sociais como o Segundo Tempo que, no segundo governo Lula, chegou a ter mais de quatro milhões de pessoas, de crianças, de jovens atendidas, traz um risco no horizonte para nós.
Como você apontou, o esporte não é só Olimpíadas. Qual a importância do acesso ao esporte para além dos grandes eventos e do alto rendimento?
É um grande sistema, né? Eu não enxergo o esporte competitivo separado do esporte educacional, do esporte de participação para a sua saúde. Então, porque você assiste na televisão, você tem ídolos e isso te incentiva à prática esportiva. Hoje, modernamente, a gente tem que pensar no esporte para a vida toda. Para os jovens, mas também para os idosos, para a vida adulta, porque a qualidade de vida, a sua saúde, ela vai depender também dessa atividade física, dessa prática esportiva. Então, nós precisamos no Brasil avançar muito nisso.
A gente tem uma estrutura que vem dos grandes eventos (Copa do Mundo, Olimpíada…), que já nos permite dar alguns passos, mas a gente precisa ampliar bastante essa participação. Chegar mais nas escolas, nas comunidades, tem um desafio nas regiões rurais. Então tem muito a fazer e esse é o principal papel que a recriação do Ministério do Esporte pelo presidente Lula tem que cumprir: retomar essa interação, porque num país de dimensões continentais como o Brasil, ela é um grande desafio.
Não é uma questão simples essa construção dessa atividade física e desse esporte para toda a população. Então a gente espera que o Ministério do Esporte volte a se fortalecer e volte a pensar a estruturação de um sistema nacional esportivo que dê conta desse grande desafio.
Você pode assistir a entrevista completa com Ricardo Leyser, feita pela apresentadora Luana Ibelli, na edição desta sexta-feira (9) do Central do Brasil, no canal do Brasil de Fato no YouTube.
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O Central do Brasil é uma produção do Brasil de Fato. O programa é exibido de segunda a sexta-feira, ao vivo, sempre às 13h, pela Rede TVT e por emissoras parceiras.
Edição: Nicolau Soares