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Que comecem os jogos!

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O corte de R$15 bilhões estabelecido por Haddad para aliviar o déficit é quatro vezes menor do que queria a Faria Lima - Agência Brasil
Lula mantém o conflito em água morna e prioriza dar visibilidade aos resultados sociais do governo

Olá, está aberta a corrida eleitoral no país campeão no Arremesso de Juros e no Tiro contra Investimentos Sociais.

.A tesoura pegou. A percepção de que o governo está perdendo no discurso sobre as contas públicas não é uma boa notícia em vésperas de eleições. A batalha de Lula contra os juros deu uma freada depois que os próprios aliados do presidente votaram a favor de um aumento da taxa Selic na última reunião do Copom. Depois vieram as pressões especulativas sobre o dólar. Assim, na contramão das expectativas iniciais, quando o assunto é Banco Central, o que está em curso é a autonomia financeira da agência e não sua submissão à política econômica do governo. É verdade que os ajustes fiscais aumentaram a arrecadação do governo, mas um movimento que já vinha sendo gestado há meses agora se consolidou, o de impedir mais ajustes e correções, como se vê no tema das isenções fiscais. E na campanha bem orquestrada de desmoralização contra Haddad - o “Taxad” - consolidou-se a ideia de que a única saída é o corte de gastos e não o aumento de arrecadação. Convenientemente, Arthur Lira concorda com os memes e quer convencer o governo da necessidade de cortar gastos acabando com a correção automática dos benefícios sociais atrelados ao salário mínimo. O governo cedeu em parte, mas a verdade é que o corte de R$15 bilhões estabelecido por Haddad para aliviar o déficit é quatro vezes menor do que queria a Faria Lima e é visto como insuficiente pelo Tribunal de Contas e pelo mercado. Por isso, pode-se esperar mais cortes em breve. Num cenário como este, o anúncio do FMI de que o Brasil está entre as nações com menor taxa de investimento no mundo não deveria surpreender, uma vez que o grosso dos recursos é drenado pelos agentes financeiros, denuncia a Auditoria Cidadã da Dívida. No momento, Lula mantém o conflito em água morna e prioriza dar visibilidade aos resultados sociais de seu governo, como a redução da fome, a implementação do Programa Pé-de-Meia para estudantes de Ensino Médio e o Voa Brasil, que disponibiliza passagens aéreas a baixo custo para os aposentados. 

.Os donos do poder. Outra iniciativa do governo é sugerir que os parlamentares também devem dar sua contrapartida no esforço para atingir o equilíbrio fiscal, incluindo as emendas nos itens orçamentários a serem congelados. Aliás, um espectro ronda o Congresso: a possibilidade do STF mexer no vespeiro do orçamento secreto. Mas, até lá, tudo continua como está e a LDO que aguarda votação no Congresso em agosto prevê a manutenção das emendas para 2025. Afinal, as emendas viraram uma nova forma de coronelismo que beneficia currais eleitorais nos rincões do país. Ainda mais se levarmos em conta os 69 deputados que pretendem concorrer a prefeito em seus municípios de origem. Assim, controlar a chave do cofre faz todo sentido. Certamente, uma das bases que mantém esse sistema funcionando é o conservadorismo moral e político. Elio Gaspari cita pesquisa recente do Instituto Democracia que evidencia posições comuns entre eleitores de Lula e Bolsonaro, e nenhuma delas aponta para a esquerda. Por exemplo, a maioria dos eleitores de Lula são contrários à saidinha de pessoas encarceradas, são contra a proibição de vendas de armas de fogo e a favor da militarização das escolas públicas. Esse clima pode levar a direita a uma escalada de acusações e discursos de ódio contra a esquerda nas eleições municipais buscando se diferenciar, a exemplo do que ensaiou o atual prefeito e candidato de São Paulo Ricardo Nunes (MDB). Do outro lado, se o conservadorismo beneficia a direita, o problema é a luta por protagonismo dos governadores que almejam suceder Bolsonaro em 2026. Ainda faltam dois anos, mas a disputa já começou. Bolsonaro entendeu que isto pode beneficiá-lo politicamente se tiver habilidade e vai deixar a rivalidade correr solta, retirando as candidaturas do PL em seis capitais para apoiar as indicações dos governadores aliados. 

.Cabo eleitoral. Nos próximos meses, o Planalto vai ter sua atenção voltada desde as eleições para vereadores até a presidência dos Estados Unidos. Se Lula já havia manifestado apoio a Biden, agora foi mais comedido em comentar sua substituição por Kamala Harris. A verdade é que a relação do Brasil com o próximo ocupante da Casa Branca é uma incógnita. Uma vitória de Trump obviamente mobiliza e anima as hostes bolsonaristas. Por outro lado, em seu primeiro mandato, o milionário deu as costas para a América Latina, mais preocupado com a China e a Europa. Também há dúvidas se Trump militaria abertamente pela anistia de Bolsonaro, como sonha a família do capitão. E se Lula se deu muito bem com o republicano George W. Bush, é verdade também que os democratas Obama e Biden preferem a velha escola de golpes e sabotagens nos governos do continente. Por hora, a vantagem de Kamala é simplesmente o fato de que ela não seja Trump. Mas a linha mais moderada adotada em relação à eleição americana também se deve à pressão do Itamaraty. A Casa das Relações Internacionais brasileiras tem tido um estranho comportamento de pautar o presidente pelos meios de comunicação, ao invés do contrário. Valeria lembrar que, assim como o eleitor brasileiro não pode votar em Kamala, também os donos da grande mídia daqui não votam na Venezuela. O que talvez explique o clima de terror que permeia a cobertura das eleições venezuelanas, já considerando uma hipotética vitória da oposição e que Maduro não reconhecerá o resultado, quando as pesquisas na Venezuela demonstram justamente o contrário. Se não viraram votos lá, pelo menos conseguiram mudar a posição da presidência daqui - em muito, diga-se de passagem, ajudado pela verborragia de Maduro. Porém, como alerta o Sul 21, o oposicionista Edmundo González levaria a Venezuela mais próxima de Javier Milei do que Lula. Além disso, o apoio americano não significa estabilidade em país algum, vide o Haiti e a Ucrânia. De forma que o mais provável é que a instabilidade política no país vizinho permaneça, independente dos resultados.

.Não verás país algum. Para quem ainda não entendeu o recado da estiagem dos rios amazônicos e das enchentes no Rio Grande do Sul, a NASA apresentou um estudo em que - sem rodeios - calcula que a mudança climática pode deixar quatro das cinco regiões do Brasil inabitáveis nos próximos 50 anos. Antes que o estudo seja taxado de alarmista, a Piauí lembra que o Inpe e o Cemaden identificaram pela primeira vez no país, no ano passado, a existência de clima árido no Brasil, numa área quatro vezes maior que a cidade de São Paulo. Ainda que o governo Lula tenha retomado uma série de mecanismos da política ambiental, especialmente em deter os desmatamentos da Amazônia, a política do “passar a boiada” de Ricardo Salles e Bolsonaro deixou estragos incontornáveis. Além disso, em se tratando de mudanças climáticas, o Executivo e o Legislativo têm um bode na sala: como enfrentar o maior responsável no país, o agronegócio, diante do poder da bancada ruralista? Como se sabe, o incentivo à soja, pecuária e mineiração ilegal foi o motor do desmatamento na Amazônia, estimulados desde a ditadura militar e turbinados pelo capital financeiro que financia o agronegócio. As consequência ultrapassam a questão ambiental e são a causa do genocídio do povo Ianomami, incluindo 1040 crianças no último ano. Barrados na Amazônia, os ruralistas partiram em direção ao Cerrado, disseminando a soja que compacta solos e gera secas, atingindo as bacias hidrográficas de outras regiões do país, como o Pantanal. Além de diminuir a vazão dos rios pantaneiros, a região também enfrenta a ditadura do boi e da soja, como relata a jornalista Cláudia Gaigher, em entrevista para a Agência Pública. E, pior, o histórico recente comprova que aqui reina a impunidade ambiental, vide a denúncia das vítimas de Brumadinho e Mariana na Comissão Interamericana de Direitos Humanos, dos nebulosos acordos da Braskem com a prefeitura de Maceió e dos cinco anos de impunidade e esquecimento do caso das manchas de óleo no litoral brasileiro.

 

.Ponto Final: nossas recomendações.

 .O comandante do Hamas procurado por Israel que sobreviveu a 7 tentativas de assassinato. Saiba quem é o homem quase invisível para Israel que atua nos bastidores do Hamas. Na BBC.

.Sai Joe Biden, entra Kamala Harris: como mudança afeta Gaza. Entenda as esperanças de que a candidata Democrata reposicione os Estados Unidos no Oriente Médio. No Intercept Brasil.

.Ronilso Pacheco: Histórico de Kamala com população negra é controverso. O colunista do Uol analisa a relação entre posicionamento político e questão racial na eleição estadunidense.

.Apagão digital. Em A Terra é Redonda, Sérgio Amadeu da Silveira analisa as incertezas e riscos de uma sociedade ultraconectada.

.Proletários de plataforma. No Intercept, Tatiana Dias e Sofia Schurig desvendam os novos mecanismos da exploração do trabalho com base na Inteligência Artificial.

 .Os fiéis e a política. Maria Hermínia Tavares mostra que o conservadorismo moral e político é comum às diferentes matizes da religiosidade brasileira.

.Os muros do Juqueri. Neste podcast da Rádio Novelo, a história de Walter Farias que ingressou no manicômio como funcionário e se tornou paciente da instituição.

* Ponto é escrito por Lauro Allan Almeida Duvoisin e Miguel Enrique Stédile.
** As opiniões contidas nessa coluna não necessariamente refletem às do jornal Brasil de Fato

Edição: Nathallia Fonseca