O crescimento da pressão dentro do partido Democrata pela renúncia de Joe Biden à sua candidatura à presidência dos Estados Unidos trouxe ao debate eleitoral a possibilidade de uma eventual substituição. Mas em que condições isso poderia acontecer?
Paulo Velasco, professor do departamento de Relações Internacionais da Uerj, explica que a única condição para a substituição de Biden seria a sua renúncia. Caso o atual presidente desista de sua candidatura, o partido deve abrir a escolha de um substituto na convenção prevista para o dia 19 de agosto. Nesse caso, a convenção seria aberta e os delegados poderiam escolher o nome de sua preferência para substituir Biden.
"Cada delegado fica livre para votar no candidato que achar melhor, independentemente do resultado que houve nas primárias democratas. Hoje, 90% dos delegados estão de alguma maneira amarrados ao Biden. Sempre pode haver a hipótese de traição, digamos assim, no caso de eles não vão votarem no candidato ao qual estão vinculados, mas isso é muito remoto", disse ao Brasil de Fato.
Após o desempenho péssimo de Biden no primeiro debate contra o republicano Donald Trump, que acendeu o alerta dentro do partido, uma pesquisa divulgada nesta terça-feira pela CNN aumentou ainda mais o pavor no campo democrata: 75% dos eleitores entrevistados acreditam que o partido teria mais chances em novembro com outro candidato.
Trump alcança 49% das intenções de voto a nível nacional, contra 43% de Biden, uma diferença que não mudou desde a última pesquisa semelhante realizada em abril. A vice-presidente Kamala Harris, embora não vença, teria uma posição melhor, com 45%, contra os 47% do ex-presidente republicano.
Outros possíveis candidatos democratas, alguns pouco conhecidos pelo público em geral, enfrentariam Donald Trump com pontuações semelhantes às do atual presidente, apesar de sua falta de popularidade, como o governador da Califórnia, Gavin Newsom, o secretário de Transportes, Pete Buttigieg, e a governadora de Michigan, Gretchen Whitmer.
"Mesmo a Harris passar a liderar a chapa ou qualquer outro nome, algum governador de peso, o caminho natural seria justamente o Biden desistir e se fazer, no dia 19 de agosto uma convenção aberta. O que os americanos chamam de broker convention. Mas não é algo simples, porque na hipótese de haver a desistência do Biden, de alguma maneira isso confirmaria que o Partido Democrata errou, o próprio Biden errou em insistir na ideia de uma candidatura quando sabidamente já não teria condições de comandar a Casa Branca por mais quatro anos."
Velasco aponta que apesar do crescente repúdio à manutenção da candidatura de Biden dentro do partido, ele ainda mantém o apoio dos principais caciques democratas e deve se manter na corrida presidencial.
"Ele ainda tem o apoio dos grandes nomes do partido, o próprio presidente Barack Obama foi enfático no apoio a ele. Isso tem muito peso, a gente poder dizer que continua sendo uma candidatura que goza de legitimidade nesse sentido."
A pressão mais forte nesse momento, aponta Velasco, vem dos doadores sua campanha.
"É uma candidatura desgastada, mas o desgaste é sobretudo quando a gente pensa nos doadores, que ficaram mais preocupados com o desemprenho dele no debate. Há um temor de que haja uma suspensão de doações, o que inviabilizaria uma candidatura que tem que estender até o mês de junho. Não é algo simples, quando a gente pensa nos efeitos que isso pode ter sobre o estrangulamento da candidatura do próprio Biden, mas é uma candidatura que já está já fragilizada, não há a menor dúvida."
Pressão interna
A ex-presidente da Câmara de Representantes dos Estados Unidos pelo partido, Nancy Pelosi, disse, nesta terça, que considera "legítimo" questionar a aptidão do presidente para o cargo após seu péssimo desempenho em debate televisionado com o rival republicano, Donald Trump.
"Acho que é uma pergunta legítima de se fazer: 'Isso é um episódio ou uma condição?'", disse Pelosi à rede MSNBC quando questionada sobre Biden, que tropeçou muitas vezes nas palavras e perdeu a linha de raciocínio no debate de quinta-feira – exacerbando os temores sobre sua idade e aptidão mental.
Ainda nesta terça, após a manifestação de Pelosi, Lloyd Doggett se tornou o primeiro parlamentar democrata a pedir publicamente a Joe Biden que se retire da corrida pela Casa Branca.
"Reconhecendo que, ao contrário de Trump, o primeiro compromisso do presidente Biden sempre foi com o nosso país, e não consigo mesmo, tenho esperança de que ele tome a dolorosa e difícil decisão de se retirar. Eu respeitosamente peço a ele que faça isso", disse em uma declaração.
A Casa Branca afirmou, nesta terça-feira (2), que o presidente Joe Biden, de 81 anos, não precisa se submeter a um teste cognitivo, depois de seu desempenho no debate da semana passada contra Donald Trump.
Um teste cognitivo "não se justifica e não é necessário", conforme sua equipe médica já havia assinalado anteriormente, disse aos jornalistas a porta-voz Karine Jean-Pierre, que acrescentou que Biden "sabe como dar a volta por cima".
*Com AFP
Edição: Rodrigo Durão Coelho