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O que está por trás da tentativa descarada de golpe na Bolívia?

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O presidente Arce frente a frente com os golpistas nesta quarta - Reprodução
Só o povo organizado tem condições de garantir o exercício dos governos populares na América Latina

O dia 26 de junho de 2024 marca mais um episódio da história dos mais de 100 golpes, desde a independência da Bolívia. Na América Latina, se a democracia abarca projetos populares, não interessa a sua manutenção aos setores dominantes. Sem nenhum pudor, se articula abertamente um golpe de Estado. Nunca existiu qualquer compromisso democrático com a extrema direita.

Há um contexto recente que antecede esta tentativa golpista:

No dia 24 de junho, o Ministério das Relações Exteriores da Bolívia denunciou em nota pública, a interferência dos Estados Unidos em assuntos internos do país. A encarregada de negócios dos Estados Unidos, Debra Hervia, foi convocada por desrespeitarem as normas do direito internacional que violam as relações diplomáticas.

No dia 25 de junho, o comandante do exército, General Zúñiga, foi afastado das suas funções nas Forças Armadas. Ele havia feito um pronunciamento a uma rede de TV dizendo, em tom de ameaça, que, por representar um "braço armado da pátria", não permitiria qualquer possibilidade de um retorno de Evo Morales à presidência do país nas eleições de 2025.

Os episódios estão em diálogo e articulados. Não por acaso, depois de anunciar a tentativa de golpe, a fala do militar diante dos jornalistas foi a de libertar da prisão os criminosos e políticos de extrema direita Luis Camacho e Jeanine Añez.

Todo este enredo aponta o real papel do imperialismo na América Latina. A sanha de poder do golpismo passa por cima da democracia, da Constituição, da vontade popular. Este imperialismo busca se afirmar explicitamente, através da tentativa de golpe militar, mas opera, sobretudo, na esfera econômica.

No caso da Bolívia, o golpe é impulsionado pelo país possuir a maior reserva de lítio no mundo. Aproximadamente 23 milhões de toneladas, concentradas na região de Uyuni. Trata-se de um mineral fundamental nesta etapa do capitalismo, pois serve para a fabricação de baterias de diversos eletrônicos como celular, computador e, inclusive, carros elétricos. Com a valorização dos produtos provenientes do lítio no mercado internacional, os Estados Unidos tentam controlar a produção para evitar a concorrência de China e Rússia. No entanto, tanto a Rússia (através da empresa Uranium One Group), quanto a China (pelo consórcio CBC) possuem acordos com a Bolívia para executar e ampliar o seu plano de industrialização baseado na extração do lítio. O controle da produção continuará com a Bolívia.

Cabe destacar que a Bolívia é o único país da região em que o lítio é nacionalizado. O processo de nacionalização, assegurado pela Constituição de 2009, é o que garante os recursos para saúde e educação no país.

Em 2019, ocorreu um golpe militar na Bolívia e, em 2024, uma tentativa de golpe que também perpassa motivações similares. O que se pretende é impor, independente de qualquer coisa, uma agenda neoliberal de poder, que hoje ampara projetos políticos que são constituídos por pilares de extrema direita, próprios do fascismo.

Esta não é a primeira e não será a última tentativa de golpe na Bolívia. Só o povo organizado e articulado tem condições de garantir o exercício dos governos populares na América Latina.

Edição: Nicolau Soares