CHEIAS NO SUL

'Desastre climático foi provocado por catástrofe política', avalia pesquisador da UFPel

Antônio Soler chama atenção para impossibilidade de preservação do planeta diante do modelo de exploração capitalista

Brasil de Fato | Porto Alegre (RS) |
Quase todos os municípios gaúchos foram afetados pelas cheias de maio, destaca Antônio Soler - Foto: Ricardo Stucker

"Um desastre, como o que vivenciamos agora, deve ser analisado como uma situação de todo planeta. O nosso ambiente é um sistema único, e embora o dividamos geograficamente, é apenas uma questão de metodologia". A afirmação é do professor Antônio Soler, da Universidade Federal de Pelotas (UFPel), em um debate on-line pelo Dia Mundial do Meio Ambiente, promovido pelo Sindicato dos Servidores da Justiça do Estado do Rio Grande do Sul (Sindjus-RS), nesta quarta-feira (5).

Para o ambientalista, este desastre climático foi provocado por uma catástrofe política. “A Terra tem vários metabolismos, e ela é um sistema único, o que faz a vida na Terra ser viável é justamente o clima. E ele está entrando em colapso, em razão de incidência humana”, afirma. Ele pontua, no entanto, que não são todos os que provocam esses efeitos, e nem todos são impactados da mesma forma.

Segundo Soler, vivemos sob um modelo de sociedade baseado no consumo infinito que vai levar ao esgotamento da Terra. “É o capitalismo neoliberal, incompatível com a vida no planeta. Pois ele parte do pressuposto que vivemos em um sistema infinito, e o planeta é finito”, afirma. Ele acrescenta a esse cenário questões como uso especulativo da terra para a construção de cidades, ocupação de leitos de rios e a destruição de matas ciliares.

Para ele, a situação em que chegamos se deve a fenômenos naturais, mas eles têm se manifestado de uma forma diferente. “Na Eco92 já foram feitas as denúncias e se sabia que tínhamos que mudar este modelo de sociedade e de economia porque ele ia chegar ao colapso, porém nada foi feito”, lamenta.

Além de professor da UFPel, Antônio Soler é membro do Centro de Estudos Ambientais (CEA); e já foi membro do Conselho Nacional do Meio Ambiente (Conama) e do Conselho Nacional de Recursos Hídricos (CNRH). Atualmente integra o Comitê Brasileiro para o Programa o Homem e a Biosfera da Unesco; a Comissão de Políticas de Desenvolvimento Sustentável e da Agenda 21 Nacional; o Comitê Nacional de Zonas Úmidas e o Conselho Municipal de Proteção Ambiental de Pelotas. 

Bomba relógio

O professor explica que “o uso do solo associado às políticas neoliberais é uma bomba relógio, e isso está atingindo o Rio Grande do Sul como nunca antes, com quase 100% dos municípios impactados. É um número negativamente fantástico”.

Soler destaca que parte das causas tem a ver diretamente com o desmonte do Estado, como o fechamento da Fundação Zoobotânica, da Fundação de Economia e Estatística e do Programa Mar de Dentro. Ele aponta que eram setores do Estado que formavam pessoas capacitadas para enfrentar e prever estas catástrofes.

Negacionismo 

O pesquisador responsabiliza os governos de Eduardo Leite (PSDB) e as prefeituras, mas também relembra as medidas negacionistas no governo de Jair Bolsonaro. “Negacionista por excelência e justificava este desmonte baseado em sua ideologia que justificava o lucro a qualquer preço."

Soler pontua projetos do governo do estado que contribuem para o desmonte da política ambiental. "Eduardo Leite apresentou um projeto na Assembleia Legislativa abrindo mão do bioma Pampa e outro facilitando a aplicação de venenos. Em suma, destruindo todo o código de proteção ambiental do Rio Grande do Sul, que foi pioneiro no país."

Ele defende que a primeira luta a ser travada, associada às demais, é a defesa do meio ambiente. E parafraseou Karl Marx: “Trabalhadores e ecologistas uni-vos porque enfrentamos o mesmo inimigo. Ele vai ganha força e vai acabar com o meio ambiente e não teremos onde ficar”.

O Brasil de Fato RS solicitou um posicionamento ao governo do estado do Rio Grande do Sul, mas não obteve retorno até a publicação da reportagem. O espaço segue disponível para atualização.

Fonte: BdF Rio Grande do Sul

Edição: Katia Marko