A ministra dos Povos Indígenas, Sonia Guajajara, assumiu nesta terça-feira (29) a presidência do Fundo para o Desenvolvimento dos Povos Indígenas da América Latina e do Caribe (FILAC). A posse ocorreu durante a 17ª Assembleia Geral da organização, em Caracas, na Venezuela. A ministra aproveitou a viagem para discutir com o governo venezuelano uma articulação para combater o garimpo ilegal na Terra Indígena (TI) Yanomami, em Roraima, na fronteira com o país vizinho.
Em entrevista ao Brasil de Fato, Guajajara afirmou que as negociações para uma cooperação com o Ministério Indígena da Venezuela ainda estão no começo, mas que a ideia é fortalecer as ações com a defesa dos dos países.
“Nós estamos começando esse diálogo a partir de uma articulação com os povos indígenas daqui, para que a gente possa pensar ações conjuntas de enfrentamento ao garimpo ilegal na região. Nós estamos nas tratativas de fazer essa cooperação. Esse problema é real e estamos enfrentando uma crise no território yanomami”, afirmou a ministra ao Brasil de Fato.
O território está na fronteira com a Venezuela e ocupa uma área de aproximadamente 23 milhões de hectares de floresta tropical contínua. O Instituto Socioambiental (ISA) estima que 36.000 pessoas vivam na TI Yanomami, distribuídas em 665 aldeias. Dessas, 291 estão na Amazônia brasileira, e 374 nos estados Amazonas e Bolívar, no sul da Venezuela.
Uma das ideias ventiladas seria a possibilidade de fechar o espaço aéreo dessa região para dificultar a atuação de garimpeiros. No começo de maio, a Polícia Federal e as Forças Armadas do Brasil inativaram duas pistas ilegais no território e identificaram outras 10.
De acordo com a Hutukara Associação Yanomami, o garimpo reduziu o ritmo de crescimento da atividade no território em 2023, mas ainda assim conseguiu crescer 7% no período. Além disso, a entidade afirma que a ação dos invasores segue inviabilizando uma das principais demandas da população local: o atendimento de saúde.
Fundo e liderança regional
A assembleia do Filac realizada na Venezuela contou com a presença de representantes de 17 dos 22 integrantes do grupo. O objetivo do fundo é fortalecer as atividades dos povos indígenas a partir do financiamento. Em 2023, o Filac conseguiu captar US$ 2,8 milhões para atividades. Após a posse como presidenta, a ministra afirmou que pretende ampliar esse montante para os próximos anos.
“A captação de mais recursos está na estratégia. Aumentar os doadores, os financiadores. Há uma orientação para que outros países possam integrar o Filac. É um momento de fortalecimento do protagonismo indígena no Brasil”, afirmou ao Brasil de Fato.
Em 32 anos de existência do Filac, essa é a primeira vez que o país assume a presidência. Segundo Guajajara, com um ministério próprio para o tema, o Brasil pode liderar esse movimento na região.
”Estamos em um momento muito importante de participação indígena no governo federal e queremos fortalecer essa articulação na América Latina. Para que a gente possa ter uma rede indígena com posicionamentos macros que possam garantir a nossa visão sobre os grandes desafios do mundo. São 32 anos do Filac, e é a primeira vez que o Brasil assume a presidência. Para nós é muito importante esse protagonismo internacional”, disse a ministra.
Guajajara ficará dois anos como presidenta do Filac. Ela afirma que os projetos principais até 2026 envolvem a formação de povos indígenas e participação nos grandes fóruns internacionais
“Precisamos fortalecer o processo de formação dos povos indígenas e a participação indígena nas conferências internacionais. Estamos perto da COP da Biodiversidade [Conferência das Nações Unidas sobre Biodiversidade], que vai acontecer na Colômbia, e o Filac é um instrumento importante para fortalecer a participação indígena. Em 2025 tem a COP30 [Conferência das Nações Unidas sobre Mudanças Climáticas] no Brasil e também vamos aumentar a presença neste espaço. O Filac vai apoiar a participação nesses grandes eventos”, reforçou.
Segundo a ministra, a ideia é usar parte dos recursos para fortalecer os processos econômicos das comunidades.
“Nós queremos utilizar o Filac para apoiar processos comunitários. A bioeconomia indígena, intercâmbio de produtos indígenas com outros países. O Filac apoia também iniciativas em todos esses espaços”, acrescentou.
A assembleia em Caracas durou três dias. Na abertura foram realizadas consultas paralelas entre os povos indígenas para discutir acordos e recomendações para os próximos dois anos. Também foram apresentadas as diretrizes de planejamento do Filac até 2035. O Fundo também é responsável por definir estratégias para a implementação dos direitos dos povos indígenas. Nos outros dois dias foi realizada a Assembleia Geral, que terminou na quarta-feira (29) com apresentações musicais e discursos das lideranças.
Edição: Geisa Marques