DIVERSIDADE

Luta contra LGBTfobia: conheça centros que acolhem pessoas discriminadas por orientação sexual ou identidade de gênero

Atendimento contempla atividades culturais, clínica social com terapia e até abrigos para quem foi expulso de casa

Brasil de Fato | São Paulo (SP) |
Data de luta contra homofobia, bifobia e transfobia antecede mês de celebrações do Orgulho LGBTQIA+ - Foto: Attila Kisbenedek/AFP

Neste 17 de maio, é celebrado o Dia Internacional contra a LGBTfobia. A data visa conscientizar a sociedade para o combate ao preconceito contra pessoas por causa de orientação sexual ou identidade de gênero.

Em razão da existência desse tipo de discriminação, na Grande São Paulo, organizações mantidas pela sociedade civil fazem um trabalho importante de acolhida a pessoas LGBTQIA+ que precisam.

Casa 1

Um deles é o Centro de Cultura e Acolhimento Casa 1. Pessoas expulsas de casa por LGBTfobia podem encontrar apoio no espaço, localizado na Rua Adoniran Barbosa, 151, no centro da capital paulista. A Casa 1 atende principalmente jovens de 18 a 25 anos. O trabalho de acolhida envolve uma República que serve de abrigo; a Clínica Social, voltada às questões de saúde mental; e o Centro de Cultura.

Veja a reportagem completa em vídeo, exibida no jornal Central do Brasil:

“O Centro de acolhida é uma casa de passagem, o tempo de permanência é em torno de quatro meses. Nesse período, a gente consegue trabalhar várias questões com as pessoas que estão lá, mas o espaço hoje suporta até 15 pessoas”, explica Angelo Castro, diretor de educação e cultura da Casa 1.

A casa porém não dá conta da demanda de pessoas que a procuram. “A gente atende 15 pessoas por vez no centro de acolhida e recebemos de 5 a 10 pedidos por semana”, diz Castro.

“No projeto como um todo, considerando o centro cultural, a biblioteca, o centro de acolhida, a clínica social, o serviço social, são realizados cerca de 3 mil atendimentos mensalmente”, pontua.

Fundada há 7 anos, a Casa 1 já acolheu em sua república mais de 460 jovens do Brasil todo. O espaço cultural conta com ateliê de beleza, sala de aula, sala de atendimento e ainda uma cozinha-escola.

As salas são identificadas com nomes de personalidades importantes na causa LGBTQIAP+. Entre elas, Lea T, modelo e ativista que fez história como uma das primeiras trans em campanhas de moda internacionais; e Symmy Larrat, primeira travesti a ocupar a Secretaria Nacional dos Direitos da População LGBT+, vinculada ao Ministério dos Direitos Humanos.

Várias oficinas e cursos profissionalizantes são realizados pela Casa 1. Uma das oficinas foi sobre nome social, como relembra Castro. “Uma ação socioeducativa no atendimento para pessoas trans no que significa esse processo de retificação de nome. Então a pessoa é registrada com um nome e muitas vezes ela não se identifica mais com aquilo justamente por remeter a algum gênero, enfim... Então essa pessoa busca a retificação desse nome.”

A Casa 1 se mantém com doações recorrentes de pessoas físicas e articulações com marcas e empresas. Recursos de editais públicos e privados também contribuem com o prosseguimento das atividades.

Casa Neon Cunha

Em São Bernardo do Campo, no ABC Paulista, a Casa Neon Cunha faz um trabalho parecido desde 2018. Paulo Araújo, fundador e presidente da organização, conta que os mais atendidos são quem sofre violência, inclusive em abrigos públicos, que não são específicos para pessoas homossexuais, bissexuais e transexuais, por exemplo.

“Uma das principais demandas da população LGBTQIAP+ no Brasil é abrigo especializado. Quando a pessoa LGBT sofre uma violência, ela sai de casa e vai para onde? Ela vai para casa de um amigo, parente… Mas quando ela não tem um amigo ou parente ela vai para os abrigos públicos da cidade onde ela sofre várias violências em relação à orientação sexual e à identidade de gênero”, expõe Paulo. 

“E aí a gente tem percebido que se faz muito necessário a gente ter um abrigo específico onde essas pessoas vão conseguir ser tratadas com respeito, é claro, e não vão sofrer mais violências.”

O nome deste Centro de Acolhimento é inspirado em Neon Cunha, mulher trans negra que ficou conhecida pela batalha judicial para conseguir retificar seu nome e gênero. Ela chegou a pedir morte assistida na Organização dos Estados Americanos (OEA) caso esses direitos não fossem reconhecidos. Hoje, Neon é conselheira de ética e fiscal da Casa de Acolhimento que a homenageia.

No documentário Do sonho ao Pertencimento, produzido pela Casa Neon Cunha, ela fala do espaço enquanto ferramenta também de resistência. “Essas casas também são uma grande denúncia e uma grande comprovação de quem vive na exclusão consegue produzir outra humanidade. Se houvesse um acolhimento mínimo que seja nas escolas, nos lares, isso a gente vai romper em algum momento, inclusive, a necessidade dessas casas.”

O diretor de educação e cultura da Casa 1 conta que já houve muitos avanços no combate ao preconceito contra pessoas LGBTs, porém reforça que datas específicas relacionadas ao tema são fundamentais. Como o 17 de maio. 

A data de luta contra a LGBTfobia foi escolhida porque foi neste dia, em 1990, que a OMS retirou a homossexualidade da lista CID, de Classificação Internacional de Doenças e Problemas Relacionados à Saúde.

“Não é porque tem uma pessoa trans na novela que acabou a transfobia e que pessoas trans não sofrem mais preconceito. Acho que essa data em específico serve muito para a gente olhar para esse problema enquanto um problema. Isso não está resolvido, está muito longe de estar resolvido. E é importante que a gente entenda maneiras efetivas de participar dessa luta e da resolução desse problema”, diz Angelo Castro. 

“Então eu acho que dia 17 traz essa bandeira, levanta essa bandeira de novo, porque é uma questão ainda muito presente que todo mundo tem que olhar para buscar essa solução”, segue.

Paulo Araújo concorda com o representante da Casa 1 e ressalta órgãos e parlamentares brasileiros pertencentes à comunidade LGBT que conseguem, aos poucos, resultados positivos nesta luta com ocupação de espaços e desenvolvimento de políticas públicas.

“Hoje a gente tem uma Secretaria Nacional e um Ministério voltados para a nossa população LGBT, que conseguem inclusive construir programas nacionais voltadas para a gente. É importante dizer que esse país conseguiu dar um passo quando a gente consegue eleger duas parlamentares trans, que é a Erika Hilton [deputada federal pelo PSOL] e a Duda Salabert [deputada federal pelo PDT, que conseguiram construir, inclusive, narrativas com qualidade da nossa comunidade", celebra Araújo.

“E isso é fruto de uma luta, uma luta que permite a gente poder ter orgulho, que permite a gente poder celebrar, que permite a gente poder lutar mais ainda."

Edição: Matheus Alves de Almeida