Deputados ligados a 23 frentes parlamentares antecipam-se ao governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) e já apresentaram 13 projetos de lei para regulamentar a Reforma Tributária aprovada no final do ano passado. Com o movimento, os parlamentares pretendem protagonizar a discussão sobre o assunto e pressionar o governo para que suas ideias prevaleçam nos debates.
“O trabalho de 23 frentes parlamentares não pode ser em vão. Elas trataram dos projetos da regulamentação, que não devem ser tão alterados [na tramitação]”, defendeu o deputado federal Pedro Lupion (PP-PR), presidente Frente Parlamentar da Agropecuária (FPA), a qual também elaborou projetos sobre a reforma.
Lupion participou nesta quarta-feira (17) de uma audiência pública na Comissão de Desenvolvimento Econômico da Câmara dos Deputados para tratar da regulamentação. Ele mesmo, por exemplo, é autor de um projeto para definir a cesta básica nacional. Por conta da Reforma Tributária, essa cesta terá produtos isentos de impostos.
A ideia de cesta básica apresentada por Lupion contraria o pensamento do governo para os produtos que devem ser isentos. Segundo Marília Sobral Albiero, coordenadora da campanha sobre Alimentação Saudável da organização ACT Promoção da Saúde, contraria inclusive o que a própria reforma estabelece para a cesta.
A reforma diz que a cesta precisará garantir uma “alimentação saudável”. Em março, um decreto do presidente Lula acrescentou também que ela deve ser composta por “por alimentos in natura ou minimamente processados e ingredientes culinários”.
Acontece que o projeto de Lupion define que a cesta básica pode incluir proteína animal e derivados de leite “independentemente da forma como apresentados”. Para Albiero, da ACT, isso abre espaço para que salsicha e outros embutidos, além de produtos processados e ultraprocessados, ganhem a isenção fiscal. O consumo desses produtos é comprovadamente prejudicial à saúde.
Albiero disse também que a proposta de Lupion amplia muito o leque de isenção para produtos alimentícios. Outros tipos de produtos terão que ser mais taxados para compensar.
“Isso não é para ajudar a população, mas é para defender interesses econômicos. Isso é para reserva de mercado e garantia de lucro. Não há interesse público nessas propostas”, acrescentou Albiero, sobre os projetos dos deputados.
Imposto seletivo
Outro projeto apresentado por parlamentares para regulamentar a reforma tributária trata do chamado imposto seletivo. Esse imposto foi pensado para sobretaxar produtos que fazem mal à saúde ou causam danos ao meio ambiente. A intenção do tributo é desincentivar o consumo e financiar políticas de reparação ou mitigação de danos.
O deputado Luiz Philippe de Orleans e Bragança (PP-SP) assina a proposta sobre o imposto seletivo. Ela prevê que cada produto sobre o qual incide o imposto seja tema de uma Lei Complementar Específica, dificultando assim o início das cobranças.
Bragança também defende que, caso empresas realizem ações para mitigar ou reduzir danos causados por seus produtos, isso poderia reduzir o imposto devido.
Agrotóxicos
O deputado Joaquim Passarinho (PL-PA) também apresentou um projeto para que “defensivos agropecuários” tenham a chamada tributação reduzida, com desconto de 60% em tributos, prevista na reforma tributária. Alan Tygel, membro da coordenação da Campanha Permanente Contra os Agrotóxicos e Pela Vida e da Articulação Nacional de Agroecologia (ANA), afirmou que o projeto, na prática, dá benefício tributário para a compra de agrotóxicos.
“Não é cabível haver uma redução de imposto para agrotóxicos pois são produtos nocivos à saúde. A reforma deveria caminhar para o incentivo à transição agroecológica”, disse ele.
Segundo Tygel, a proposta também inclui sementes transgênicas na isenção de 60%.
Prazos
A Reforma Tributária aprovada pelo Congresso dá prazo de 180 dias para que o Poder Executivo – ou seja, o governo – apresente seus projetos para regulamentá-la. Esse prazo, em tese, só termina em junho.
O governo prometeu adiantar o envio de suas propostas para viabilizar a discussão delas antes do período eleitoral de 2024. A data exata do envio, contudo, tem sido alterada.
Na semana passada, a promessa é que as propostas fossem enviadas nesta semana. Agora, segundo o Ministério da Fazenda, a ideia é enviá-las na semana que vem.
“A gente acredita que a demora é causada pela tecnicidade e pela consistência que as propostas terão”, disse Albiero. “Estados e municípios também estão sendo ouvidos.”
Para Tygel, a demora do governo abriu uma brecha para que setores econômicos representados por parlamentares se antecipassem.
O governo criou 19 grupos de trabalho para debater a regulamentação. Deve condensar suas ideias sobre o tema em dois projetos de lei já pensando em facilitar a tramitação deles pela Câmara e também pelo Senado Federal.
O Ministério da Fazenda, por meio da Secretaria Especial da Reforma Tributária, informou que “está acompanhando a apresentação dos projetos formulados por frentes parlamentares da Câmara dos Deputados e considera a iniciativa salutar, pois demonstra o interesse do parlamento e do setor produtivo em priorizar o debate e a aprovação da regulamentação da reforma tributária”.
Edição: Matheus Alves de Almeida