Na última quarta-feira (4), a população dos municípios de Itaboraí, São Gonçalo, Niterói, Maricá e da Ilha de Paquetá, no município do Rio de Janeiro, entraram em um colapso por falta de abastecimento de água. A Companhia Estadual de Águas e Esgoto do Rio de Janeiro (CEDAE) paralisou o abastecimento do Leste Metropolitano após detectar a presença de uma substância tóxica na água que abastece o sistema Imunana Laranjal, que é localizado no município de Cachoeiras de Macacu. A substância é o Tolueno. Segundo a companhia, vem das águas do rio Guapiaçu, afluente do rio Macacu.
Problemas como este são consequências direta de uma gestão pública que não prioriza investir nas políticas de saneamento básico.
A prova disso é o governo do estado ter privatizado os serviços de abastecimento de água em regiões populosas desses municípios. O sistema Imunana Laranjal, por exemplo, apesar de carregar a responsabilidade de abastecer as casas de mais de 2 milhões de pessoas, não recebe investimentos do poder público no que diz respeito à produção e cuidado com a essa água, tão importante para milhões de pessoas.
O rio Guapiaçu, um dos principais afluentes, tem em suas margens a presença de vários assentamentos de agricultura familiar, está em uma região rica em florestas e nascentes, e povoada por pessoas que cuidam dessas riquezas, no entanto não recebe políticas de cuidado com essa água, como o saneamento rural, o incentivo à agroecologia, educação ambiental, etc.
A Cedae vem operando o sistema Imunana Laranjal desde 1996, quando fez sua ampliação, sem cumprir efetivamente as condicionantes ambientais. A dragagem do rio, por exemplo, poderia mudar a realidade dos agricultores do assentamento São José da Boa Morte que sofrem todos os anos com o alagamento de suas terras por pelo menos 5 meses. Cumprir essas determinações legais e ir além, aplicando de fato uma política de sustentabilidade nas margens destes rios é fundamental para que a produção de água, seja em quantidade e qualidade necessárias.
Além da gestão irresponsável da Cedae, que comete um descaso com a água dos rios que abastecem o Leste Metropolitano, às margens do rio Macacu se encontra o antigo Complexo Petroquímico do Rio de Janeiro (Comperj), hoje, depois de anos de paralisação, retomado com outra roupagem e com nome de GásLub, que põe em risco a qualidade da água destes rios. A Petrobras possui oleodutos na região que atravessam os assentamentos e os próprios rios, já houve caso de vazamento nos dutos, prejudicando o meio ambiente no local.
É importante que se entenda que esta região do nosso estado é ao mesmo tempo uma grande produtora de água e uma grande produtora de alimentos.
A agricultura familiar é de extrema relevância para o abastecimento da região metropolitana do Rio de Janeiro. Apesar do descaso do poder público, da ausência de políticas de crédito, assistência técnica e incentivos do governo em todas as esferas, as famílias assentadas insistem em trabalhar na terra e produzem muitos produtos como aipim, inhame, jiló, berinjela, pimentão, batata doce, quiabo, leite, entre outros que são comercializados em todos os municípios da região metropolitana do Rio de Janeiro.
Portanto, a garantia do direito à água de qualidade no Leste Metropolitano só vai ser possível com uma política que cuide efetivamente das margens dos rios Guapiaçu e Macacu, e isso implica em investir na região nos seguintes pontos:
1) Educação Ambiental: é necessário ampliar o cuidado com a água, e através da educação entregar essa responsabilidade para o povo que vive em Cachoeiras de Macacu e Guapimirim. As pessoas desses lugares, mal sabem que a água que passa em sua comunidade abastece tanta gente em outros locais. É preciso envolver essas pessoas nos debates e decisões a respeito desse bem comum, que é a água;
2) Saneamento rural: a empresa Águas do Rio já disse aos agricultores locais que não tem interesse em investir na zona rural de Cachoeiras de Macacu, mas isso não desfaz a necessidade de investimento em saneamento rural. É inaceitável que ribeirinhos de dois dos poucos rios limpos que desaguam na Baía de Guanabara não tenham acesso a esgotamento sanitário, água encanada, e em alguns locais nem mesmo a coleta de resíduos sólidos;
3) Reflorestamento: investir em reflorestamento nos entornos dos rios de forma responsável e que não ponha em risco a produção de alimento e o sustento das famílias;
5) Agricultura sustentável: sabemos a responsabilidade que a agricultura tem em produzir alimento, mas sabemos que pode ir além, produzindo alimento e água. Investir em práticas agrícolas que promovam um ambiente sustentável é tarefa dos gestores de nosso estado. O potencial produtivo dessa região pode ser dobrado se houver politicas públicas que incentivem os agricultores a mudar suas práticas produtivas. As agroflorestas, por exemplo, são modelos produtivos que podem contribuir muito para o aumento da oferta de água na região;
6) Estruturação dos assentamentos: uma das principais bandeiras de luta dos assentados de São José da Boa Morte e Marubaí é que o Estado invista na infraestrutura dos assentamentos. Melhorar a qualidade e a efetividade dos canais de drenagem e refazer os diques de contenção das margens dos rios são exemplos de medidas simples que mudariam completamente a vida das pessoas que vivem naquele local.
É preciso muito dinheiro para investir nessas políticas? Frente a quantidade de dinheiro que o Banco Nacional de Desenvolvimentos Social (BNDES) investiu em empresas privadas para que elas instalem hidrômetros em todas as casas das periferias a resposta é não. Investir na recuperação ambiental desta região certamente é mais importante e mais barato ao Estado, precisa de mobilização, luta e vontade política.
*Silas Borges Evangelista é militante do MAB no estado do Rio de Janeiro, agricultor familiar em Cachoeiras de Macacu e graduando em pedagogia.
Edição: Mariana Pitasse