Este ano, a Campanha da Fraternidade, promovida pela Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB) tem como tema “Fraternidade e Amizade Social” e o lema bíblico “Vós sois todos irmãos e irmãs”.
A campanha busca propagar o projeto de “Fraternidade” e a ideia de “Amizade Social”. Para falar sobre ela e sobre a importância da sua realização, o Brasil de Fato conversou com Patrícia Amorim, mestra em sociologia pela Universidade Estadual do Ceará (UECE), assessora da Cáritas Regional Ceará, assessora e coordenadora da equipe de campanhas da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB) Regional Nordeste 1 e assistente social.
Confira:
Brasil de Fato: O que é a Campanha da Fraternidade?
Patrícia Amorim: A gente costuma dizer que é a forma da igreja evangelizar durante o período da Quaresma aqui no Brasil. A gente acredita que a Quaresma é um tempo de conversão, é um tempo que a gente chama de conversão pastoral, onde a gente vai refletir e também fazer ações relacionadas a jejum, oração e caridade. A partir dessa tríade, a gente entende que é importante fazer uma relação com temas sociais.
Este ano é um ano muito especial para nós porque, em âmbito nacional, a Campanha da Fraternidade faz 60 anos. Então a gente também está celebrando esse tempo, que é de muitas conquistas enquanto igreja, mas, sobretudo, enquanto sociedade, já que a gente reflete temas ligados à sociedade em geral.
A Campanha da Fraternidade é uma ação unicamente da igreja ou ela também é uma ação social onde todos podem participar e contribuir?
Essa é uma boa pergunta. A Campanha da Fraternidade nasce como uma iniciativa da CNBB há 60 anos atrás, mas ela não é uma ação exclusiva da CNBB. Inclusive, tem anos que a gente realiza de forma ecumênica. A gente convida outras igrejas para também realizar conosco.
É um convite que a igreja faz para toda a sociedade, no sentido de que todo mundo, como a gente diz, pessoas de boa vontade, podem e devem se sentir convidadas a participar e a integrar as ações que a gente chama gestos concretos da Campanha da Fraternidade.
Hoje se percebe uma participação maior da população na Campanha da Fraternidade ou ela ainda está muito dentro da igreja?
A gente reconhece que ela nasceu como uma iniciativa da igreja católica, mas à luz de uma igreja que a gente chama igreja comprometida com o povo de Deus. Então, nesse aspecto, desde o seu nascimento, ela foi muito dialogada com setores da sociedade de uma forma mais ampla, já que ela sempre teve como pauta questões sociais. E de lá para cá isso veio se consolidando ainda mais.
Claro que a gente ainda tem o desafio de fazer com que a Campanha da Fraternidade seja reconhecida para além do campo religioso, para além das igrejas, como uma ação mesmo da sociedade de uma maneira geral, mas a gente afirma de que sim, ela é uma ação mais ampla, não só da igreja católica, mas ela tende a abarcar toda a sociedade.
Qual é o objetivo da Campanha da Fraternidade?
Existe o que a gente chama de objetivos permanentes da Campanha da Fraternidade, que sempre a gente vai querer que a comunidade e a sociedade, de um modo em geral, promovam a fraternidade à luz dos seus valores, daquilo que a gente acredita, quando a gente fala em relação ao bem comum. Esse é o objetivo principal das Campanhas da Fraternidade e este ano, especificamente, com o tema da Amizade Social, a gente tem como objetivo geral despertar para o valor e a beleza da fraternidade humana, promovendo e fortalecendo os vínculos da amizade social, para que em Jesus Cristo a paz seja realidade entre todas as pessoas e povos. Então esse é o objetivo principal da Campanha da Fraternidade deste ano.
Anteriormente o tema da Campanha da Fraternidade foi sobre a questão de combate à fome e este ano é sobre a questão da amizade social. Dá para ver que são temáticas bem atuais. Como é feita a escolha desses temas e o que cada um representa?
No ano passado realmente foi a temática: "Fraternidade e Fome". Foi um tema que a gente conseguiu desenvolver bem, inclusive porque, infelizmente, a gente ainda está com um índice altíssimo de insegurança alimentar e nutricional.
A Campanha de Fraternidade veio também dar uma luz sobre esse grande problema social que a gente tem enfrentado não só no Brasil, mas no mundo, sobretudo nos países da América Latina. Foi muito importante a gente desenvolver esse tema, onde a gente pode expressar e reconhecer as várias iniciativas da sociedade civil, para além das de governo.
A Campanha da Fraternidade sempre dialoga com temas que são do cotidiano, da realidade, temas sociais. São temas em que a gente identifica questões desafiadoras no âmbito nacional, que precisam ser refletidas, abordadas, mas, sobretudo, transformadas.
Esse é o gancho que a gente faz de desenvolvê-las no período da Quaresma. Como a gente entende que é conversão, então conversão é transformação.
Vimos na mídia alguns ataques e ameaças sendo feitos a representantes da igreja, como por exemplo, é o caso do Padre Júlio Lancellotti. A Campanha da Fraternidade também tenta trazer a reconciliação e a fraternidade para dentro da própria igreja?
Com certeza. A gente tem figuras importantes, que são da igreja católica. Você citou o Padre Júlio Lancellotti, mas até mesmo o próprio Papa Francisco hoje sofre ataques. O próprio sucessor de Pedro, como a gente acredita, sofre ataques de uma maneira generalizada.
Mas assim: são grupos muito específicos que fazem isso. A gente sabe que eles têm um grande poder também do capital para fazer isso. São grupos que são muito direcionados, muito específicos, e são minoritários. É importante que a gente diga isso, porque às vezes a gente pode ter impressão de que eles são a maioria, e não são. Mas por conta do capital atrelado a esses grupos, eles conseguem fazer com que isso tome proporções maiores.
No caso do Padre Júlio Lancellotti tem uma situação muito específica, que na própria Campanha da Fraternidade a gente também vai dialogar e dialoga muito sobre isso, que é o que a gente chama de alterofobia. Ele denuncia cotidianamente a aversão aos pobres, e existe na nossa sociedade brasileira uma aversão verdadeira pelos pobres.
Na Campanha da Fraternidade, a gente vai discutindo justamente sobre a questão do individualismo, da indiferença e da intolerância. No grau mais elevado da intolerância, ela quer a eliminação do outro, do diferente.
Existe uma parcela da sociedade que quer a eliminação dos pobres, acham que os empobrecidos são os grandes responsáveis, e que, sendo eliminados, esse problema é resolvido.
A gente sabe que não é isso. É justamente ao contrário. A gente acredita que a partir do evangelho, a partir de Jesus Cristo, a gente tenha a luz dos empobrecidos, a força para que a gente possa superar esses desafios e construir uma sociedade onde todos tenham acesso a leite e mel.
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Fonte: BdF Ceará
Edição: Camila Garcia