Movimentos da sociedade civil denunciaram à Organização das Nações Unidas (ONU) que as leis que garantem o direito ao aborto no Brasil não estão sendo cumpridas. A declaração foi feita nesta sexta-feira (22), em reunião no Conselho de Direitos Humanos da instituição.
"Apesar de o aborto ser permitido no país nas hipóteses de violência sexual, risco de morte da pessoa gestante e anencefalia do feto, na prática, o acesso ao procedimento é frequentemente negado ou dificultado", afirmaram os movimentos.
Segundo a denúncia, esse cenário impacta mais fortemente "mulheres, meninas e pessoas que gestam negras, indígenas e periféricas". O manifesto reúne as organizações Conectas, Cladem Brasil, Ipas, Coletivo Feminista Sexualidade e Saúde, Anis Instituto de Bioética, Católicas pelo Direito de Decidir, Rede Médica pelo Direito de Decidir, ABIA-SPW e Nem Presa Nem Morta.
Beatriz Galli, integrante do Cladem e assessora do Ipas, afirma que os movimentos observam obstáculos crescentes na aplicação da lei, que existe desde a década de 1940. "Acreditamos que, fazendo esse chamado no âmbito das Nações Unidas, conseguimos dar visibilidade e chamar o Brasil para cumprir suas obrigações internacionais em matéria de direitos humanos. Os direitos sexuais e reprodutivos estão sendo neglicenciados atualmente por parte do governo."
Gabriela Rondon, que é advogada e co-diretora da Anis, destaca que é preciso dar a devida gravidade ao cenário de violação dos direitos humanos. "Quando se nega o direito ao aborto já previsto em lei, é preciso imaginar quem está ficando sem cuidados: são especialmente meninas sobreviventes de violência sexual. São essas meninas que receberão tratamentos equivalentes a tortura e terão seus projetos de vida afetados pela recusa de tratamento e cuidado em saúde a que têm direito."
Exemplos comprovam denúncia
Na declaração as organizações da sociedade civil trouxeram exemplos de como a legislação esbarra em entraves para ser colocada em prática. Na lista está a suspensão de uma nota técnica com orientações para profissionais de saúde sobre o aborto. A decisão foi tomada pelo Ministério da Saúde no mês passado.
Os movimentos citaram também a medida da prefeitura de São Paulo, que cancelou o serviço de abortamento legal do Hospital Cachoeirinha. A unidade de referência era a única que realizava o procedimento acima de 22 semanas de gestação na capital paulista.
Além disso, a declaração ressaltou a lei do estado de Goiás que obriga grávidas em decorrência de violência sexual que buscam o aborto a passar por um exame de ultrassom, para que ouçam as batidas do coração do feto.
"Solicitamos a este Conselho e aos Comitês de Direitos Humanos, Direitos Econômicos, Sociais e Culturais e contra a Tortura que cobrem das autoridades brasileiras o cumprimento das suas observações conclusivas e tomem medidas para garantir o acesso ao aborto legal. Especialmente para meninas menores de 14 anos com idade gestacional avançada."
Assista abaixo:
Edição: Matheus Alves de Almeida