O PT aprendeu [...] que esconder a estrela, o vermelho e seus programas é derrota eleitoral certa
O podcast Três por Quatro desta semana, produzido pelo Brasil de Fato, tem como tema a posição da esquerda para as eleições municipais. Muito tem sido questionado a respeito da postura dos representantes do campo progressista espalhados pelo país em relação a aliados, vices e propostas. Do lado da direita, o assunto é a tensão que envolve a possível prisão do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) e como isso pode interferir nas urnas.
Quando se trata do município de São Paulo, onde apenas três prefeitos de esquerda foram eleitos nas últimas dez eleições municipais – Luiza Erundina (eleita pelo PT, atualmente no PSOL) Marta Suplicy (PT) e Fernando Haddad (PT) –, o histórico dos candidatos também pode representar uma batalha adicional para os partidos progressistas.
Segundo Rosemary Segurado, cientista política e professora da PUC, Guilherme Boulos (PSOL), principal pré-candidato de esquerda à prefeitura de São Paulo, e sua vice, Marta Suplicy (PT), carregam o desafio de apagar as ideias preconcebidas pelos paulistanos antes da ida às urnas.
"Nós vamos discutir kit gay ou a reforma do ensino médio e a precariedade de creches, por exemplo? Se você entra colocando programa, bloqueia essa pauta que é para desviar o debate político. A extrema direita, quando impõe costumes, além de arregimentar sua base, que é mais conservadora, ela desloca o debate de políticas públicas", destaca.
Da mesma forma, José Genoino, ex-presidente do PT e comentarista fixo do podcast, destaca a relevância de uma campanha firme e consistente. "A esquerda tem que mostrar a que veio, mostrar as credenciais. Temos que ir para o enfrentamento democrático."
Genoíno afirma que Marta "era a segunda liderança do PT depois do Lula. Quando o Lula foi impedido, a Marta vinha com tudo se ela não tivesse saído do PT. [...] Ela era uma mulher muito afirmativa e tratava dos direitos das mulheres, temas da comunidade LGBTQIA+, a presença dela na comunidade era progressista, ela quebrava com os muros, quebrava com preconceitos, e fazia isso na periferia."
Boulos, que é professor, psicanalista e militante da área de moradia, tem "um perfil determinado, nas palavras de Genoino. "Com esse perfil ele tem uma base sólida, e as pesquisas estão indicando isso. O problema é como ampliar [as intenções de voto]. Essa ampliação vai depender do debate. O dilema nosso é fazer uma campanha alegre, combativa, esperançosa, e que fale de futuro, no âmbito de uma eleição municipal."
À esquerda em todo o país
A esquerda busca fortalecer sua presença em regiões onde já é majoritária e expandir sua influência onde não é. Locais como Santa Catarina, Bahia e Rio de Janeiro demandam atenção especial por conta da forte competição com candidatos de direita e ao histórico eleitoral do PT e PSOL.
Salvador, por exemplo, nunca teve uma prefeitura petista. Para Genoíno, a situação deste município específico "é muito difícil, porque a extrema direita do ACM Neto (ex-prefeito de Salvador) tem uma ampla maioria consolidada".
Da forma similar, para garantir a participação da esquerda no segundo turno das eleições cariocas, seria necessário um movimento de frente ampla do PT apoiando o PSOL na campanha de Tarcísio Motta. Em regiões onde o PSOL tem mais força, como em Fortaleza, o apoio se inverte.
Apesar dos interesses particulares de cada partido, movimentos de apoio são importantes. "Se a gente não entender que terão momentos que nós vamos ter que fazer esse tipo de articulação, esse tipo de aproximação, teremos um cenário bem preocupante", reforça Segurado.
Polarização, extremismo, prisão e o reflexo nas urnas
Após as eleições presidenciais de 2018, o Brasil testemunhou um aumento da polarização política, tornando crucial o posicionamento político, principalmente meses antes das eleições municipais.
Segundo a professora, "diferente da eleição de 2018, a grande imprensa ficava o tempo todo falando 'a gente precisa de uma candidatura de centro' quando o mundo está polarizado. O fenômeno que nós temos de polarização no Brasil, é um fenômeno que se verifica em muitos lugares."
Para Genoino a esquerda não pode ter uma postura defensiva no período eleitoral. "O PT aprendeu pela derrota que defensiva, esconder a estrela, o vermelho e seus programas, é derrota eleitoral certa [...]. Tem que meter a cara!". Ele ainda reforça a ideia, utilizando a vitória de Lula nas últimas eleições como exemplo para este ano. "Essa vitória de 2022 mudou o eixo tático, a gente estava em uma defensiva e passamos para uma tática."
A extrema direita, por sua vez, também se movimenta na busca por eleger seus representantes, enfatizando a polarização, visto que "o centro se evaporou", na avaliação de Genoino.
No entanto, ainda é preciso entender qual o papel de uma possível prisão de Bolsonaro no cenário eleitoral. Atualmente, o ex-presidente está sob investigações que vão desde a tentativa de desvio das joias sauditas até a tentativa de golpe de Estado.
Segurado aponta que em São Paulo "o atual prefeito [Ricardo Nunes] queria o apoio de Bolsonaro, e aí ele fica nesse bate e assopra. Então, às vezes, para algumas situações ele usa [o Bolsonaro], e para outras situações ele esconde, porque ele sabe que há elementos muito fortes de um desgaste da imagem do ex-presidente com uma prisão", conclui a cientista política.
Genoíno avalia que uma possível prisão de Bolsonaro "enfraquece politicamente as candidaturas (bolsonaristas). Quando você bota (em pauta) cartão de vacinação é barra pesada, aí amanhã você também bota na pauta as joias [...] e depois o golpe. É muita coisa, vai desmontando", acredita.
Novos episódios do Três por Quatro são lançados toda sexta-feira pela manhã, discutindo os principais acontecimentos e a conjuntura política do país. Acompanhe as outras edições neste link.
Edição: Thalita Pires