Investigação

Foto de bolos de dinheiro e conversa sobre compra de votos para Fufuca eram 'brincadeira' de grupo do Whatsapp, diz suspeito à PF

Investigação colhe depoimento de pessoas que participaram de diálogos com empresário que tinha contato direto com Fufuca

Brasil de Fato | Brasília (DF) |
Grupo tinha fotos de bolos de dinheiros
Grupo tinha fotos de bolos de dinheiros e mensagens sobre compra de votos - Reprodução

Ouvidos pela Polícia Federal (PF) na investigação sobre compra de votos nas eleições de 2018 para o hoje ministro dos Esportes, André Fufuca (PP), participantes de conversas e grupos de Whatsapp em que foram compartilhadas fotos de bolos de dinheiro e menções explícitas a compra de votos afirmaram não se recordar dos conteúdos, negaram ter participado da atividade ilícita e até silenciaram diante do teor das mensagens identificadas pelos investigadores.

Ao todo foram cinco depoimentos tomados pelo delegado da PF Edem Napoli Guimarães, nos dias 16 e 17 de janeiro deste ano, por videochamada. Todos foram ouvidos na condição de suspeitos, isto é, poderiam ficar em silêncio para não produzir provas contra eles mesmos.

Como mostrou o Brasil de Fato, um dos ouvidos aparece pedindo uma chuteira em troca de voto em Fufuca. O suspeito disse à PF não se lembrar nem que era o proprietário da linha, que estava em seu nome na época da conversa.

Outro depoente foi o empresário Clistenes Vieira Brito, integrante do grupo de mensagens “Os lindos”, no qual foi compartilhada uma imagem do produtor de eventos Marcus Sales com bolos de dinheiro e era discutida abertamente a compra de votos para Fufuca na véspera da eleição daquele ano. Questionado pela PF, Clistenes disse que as mensagens trocadas no grupo eram “uma brincadeira”.

“Que não depende de política e não tem nenhum envolvimento com a política partidária; que não participou de nenhum esquema de compra de votos”, afirmou Clistenes segundo o termo de depoimento registrado pela PF. 

A versão apresentada por ele vai ao encontro da apresentada por outro integrante do grupo de Whatsapp identificado apenas como Bruno ao ser procurado pela reportagem do Brasil de Fato no ano passado. Na ocasião, Bruno afirmou que o envio por ele de uma foto com Marcus Sales em uma mesa com bolos de dinheiro seguida da frase “Taxinha conferindo dinheiro pra comprar voto” também seria só uma brincadeira. 

A “brincadeira” registrada no grupo aconteceu a dois dias do primeiro turno da eleição daquele ano. O produtor de eventos, que aparece na foto e também participa das conversas, fazia parte do grupo de três homens flagrados pela Polícia Federal com santinhos de Fufuca e um saco de dinheiro na véspera do primeiro turno. Foi no celular dele, inclusive, que a PF encontrou o conjunto de mensagens e fotos com menções explícitas à compra de voto para Fufuca e outros políticos. 

No aparelho celular de Sales, inclusive, está registrado o celular utilizado até hoje por Fufuca, além de constar no Whatsapp registros de conversas entre o empresário e o político. Em uma delas, como mostrou o Brasil de Fato, o produtor pede material para divulgar a campanha do então candidato a deputado e apoio para um “bloco” que ele iria organizar no ano seguinte.

À PF, Clistenes não só disse que a conversa no grupo “Os Lindos” seria brincadeira, como ainda disse que Sales não teria se beneficiado de nada. “Que Marcus trabalha com eventos e também não se beneficiou de nada; que os diálogos que travou com Marcus dizem respeito a simples análise política no contexto local da época; que não se recorda da foto enviada contendo maços de dinheiro, já que os fatos são de 2018 e já passou bastante tempo; que trabalha com construção em Santa Inês”, seguiu o empresário no depoimento.


Relatório da PF sobre mensagens de Marcus Sales / Reprodução

Como revelou o Brasil de Fato, Clistenes chegou a conversar diretamente com Sales sobre a liberação de “capim Limão” por parte de Fufuca e outro político local. O próprio Clístenes chega a afirmar que um candidato local teria “vendido sua candidatura” para a então candidata a governadora do Maranhão, Roseana Sarney (MDB), filha do ex-presidente José Sarney. Clístenes também enviou uma foto de maços de dinheiro e perguntou a Marcus se um político local que estava em campanha naquele ano não iria querer a quantia para distribuir para quem pedisse.

Ex-namorada disse que mala de dinheiro era ‘normal’

Outra que foi ouvida foi a ex-namorada de Marcus Sales, Andressa Borges. Como mostrou o Brasil de Fato, ela aparece em um diálogo com o produtor de eventos em 27 de setembro de 2018, no qual pergunta a ele em quem ele votaria.

Após receber os nomes dos candidatos dele, incluindo o de André Fufuca, Borges disse que votaria nos mesmos e pede um “patrocínio” para comprar um bolo de R$ 80 no aniversário da mãe dela. Sales confirma que pode ajudar e Andressa encaminha os dados de uma mulher para ele fazer a transferência. Na sequência, ele envia a ela o comprovante de transferência para a suposta doceira.

À PF, Borges disse que deixou Marcus Sales em 2019 e que não se recorda de nada disso.


Relatório da PF sobre mensagens de Marcus Sales / Reprodução

Em outro trecho da conversa de Whatsapp entre os dois, segundo a PF, Marcus Sales pergunta a sua então namorada se estava entrando muita gente na casa dela, lembra ela que tinha deixado uma mala com R$ 3 mil lá e a orienta a fechar e guardar a bagagem no quarto da mãe dela, afirmando: “Porque política entra muita gente ai”. Tudo isso ocorreu no dia 6 de outubro de 2018, um dia antes do primeiro turno da eleição naquele ano.

Ouvida pela PF, Borges disse não saber nem a origem e nem o destino do dinheiro, mas indicou que era normal Marcus Sales andar com dinheiro em espécie por trabalhar com eventos. 

“Que não sabe informar se Marcus participou de esquema de compra de votos; que nunca mais teve contato com Marcus; que hoje é casada com outra pessoa; que em 2019 já não mantinha mais relacionamento com Marcus; que não recebeu, dele ou de qualquer pessoa, pedido de apoio em troca de benefício”, continua a depoente.

Jovem fica em silêncio

Por fim, a PF ainda tentou ouvir um homem que aparece em trocas de mensagens com Caio Vieira. Trata-se de Emanuel, jovem empresário flagrado com santinhos de Fufuca e saco de dinheiro na véspera da eleição. Anos mais tarde, ele se tornou aos 21 anos dono de uma empresa com contratos milionários de obras em cidades no interior do Maranhão.

As trocas de mensagens com Caio mostram como os dois decidiram criar em 2018 um grupo no Whatsapp com pessoas interessadas em venderem seus votos na eleição. A PF identificou que o telefone utilizado por Emanuel na ocasião estava registrado no nome de sua mãe, que foi intimada pela PF a depor e, no depoimento, levou o filho. Ao ser questionada, ela afirmou não ter conhecimento dos fatos investigados e conhecer somente seu filho entre as pessoas envolvidas.

A PF então transcreveu o momento do depoimento em que ela menciona o filho e ele pede para ficar em silêncio sobre os diálogos: "Que Emanuel está ao lado e que pode falar. Ao ser perguntado sobre os fatos, Emanuel responde; que opta por exercer o seu direito constitucional ao silêncio", diz o termo de depoimento da mãe de Emanuel, que não dá mais detalhes sobre a identidade dele.

A investigação ainda deve ouvir mais um suspeito, que participou das conversas de Whatsapp identificadas nos aparelhos celulares apreendidos na véspera da eleição de 2018. Diante disso, no último dia 5 de março, a PF prorrogou as investigações por mais 90 dias.

Outro lado

Procurado, o advogado representante de Caio Vieira, Willey Azevedo, informou que seu cliente não iria se manifestar.

Questionado pelo Brasil de Fato no ano passado sobre a investigação e os apontamentos da PF, o Ministério do Esporte informou que "o ministro André Fufuca não compactua com qualquer ato ilícito, não é responsável por ação de terceiros e confia que a Justiça vai esclarecer todos os fatos".

A reportagem tentou entrar em contato com Marcus Sales por telefone e mensagem de Whatsapp, mas não obteve retorno até o fechamento deste texto. O espaço está aberto para a manifestação do empresário.

Edição: Matheus Alves de Almeida