Nessa semana foram apresentados os dados consolidados da gestão que esteve a frente do BNDES no ano de 2023. Os números são surpreendentes, sobretudo, por dois motivos. O primeiro e mais evidente é pelo seu montante real e pelas suas variações percentuais, que tratarei logo adiante. O segundo, no entanto, surpreende por um motivo mais profundo. O BNDES foi eleito como um dos símbolos do desenvolvimentismo com contornos estatistas que precisava ser extirpado, sucumbir.
O BNDES vocalizou um papel central nos anos mais vindouros da economia brasileira, financiando o desenvolvimento de uma sociedade moderna, que completou seu processo de urbanização e internacionalizou a indústria de bens de capital, ainda que tenham sido tortuosos e desiguais os caminhos do progresso material nacional.
Para as gerações atuais, no entanto, a associação entre BNDES e desenvolvimento econômico e social só foi reconstituída nos breves anos de governos petistas, quando seus desembolsos na economia chegaram a representar um pouco mais de 4% do PIB nacional. Tão logo foi golpeada a presidenta Dilma Rousseff, a coalização política que empunhou a bandeira do retorno ao neoliberalismo escolheu seus alvos: entre eles estava destacado o BNDES.
Desde 2017, portanto, o Banco vem passando por uma inflexão que, em síntese, perseguiu seu apequenamento, mediante ações de desinvestimento, de redução do total de desembolsos e de mudança na sua política de juros, criminalizando o uso discricionário e subsidiado da taxa de juros para setores portadores de futuro, tal como fazem todas as demais grandes economias do mundo, especialmente quando trata-se de indústrias atuantes na transição ecológica.
Em que pese as ações jurídico/legais; as de ordem econômico/financeiras e as de caráter ideológico, o BNDES não somente resiste quanto avança. Em 2023 o banco aprovou R$ 218,5 bilhões em crédito, o que representa um aumento de 44% em relação ao ano de 2022. Comprometido com as externalidades positivas no que tange à geração de emprego, a área que mais cresceu em volume de crédito concedido foi a destinada a Micro, Pequenas e Médias Empresas (MPME), com 53% de aumento em relação ao ano passado.
Um dado elemento importante que gostaria de destacar é que, mesmo com o Brasil tendo figurado como o país com a maior taxa de juros real do mundo por grande parte do ano de 2023, ainda assim as consultas para apoio a infraestrutura — fundamental para o crescimento sustentado do país — passaram de um total de R$ 59 bilhões em 2022 para R$ 126 bilhões em 2023, o que demonstra a capacidade de articulação da diretoria da entidade na captação de projetos e a confiança na economia brasileira e na gestão do BNDES.
Vale lembrar que dos R$ 114 bilhões efetivamente desembolsados pelo BNDES no ano de 2023, apenas R$ 21 bilhões contaram com algum tipo de subsídio e, desses, mais de 90% referem-se ao Plano Safra, ou seja, a uma política pública do Governo Federal e não a uma ação discricionária do manejo de taxas de juros diferenciadas por parte da administração do Banco.
Gostaria de finalizar retomando o título dessa reflexão. O BNDES de volta para o futuro, também, enseja duas perspectivas conjugadas. Não é somente um retorno àquilo para o qual um Banco de Desenvolvimento está vocacionado, qual seja: edificar o futuro, financiando — no presente — projetos com maturação de longo prazo e portadores de interesses nacionais. O BNDES que quer voltar a ter e ser futuro é, sobretudo, aquele que se conecta com os desafios que estão nos debates de fronteiras.
A fronteira atual, no entanto, tem uma urgência peremptória que chama vida, e a reprodução da vida social demanda um planeta habitável e que recomponha níveis mínimos de harmonia e equilíbrio entre os seres humanos e a natureza. Nesse sentido, o BNDES apontou resultou que atestam seu compromisso com o financiamento do desenvolvimento em sentido integral, e destacaria dois como os principais: o primeiro deles foram os investimentos em inovação, que saltaram de R$ 2,3 bilhões para R$ 5,3 bilhões em aprovações. A maior conquista, entretanto, foi a articulação política para a criação de uma taxa subsidiada para seu financiamento. A transição ecológica terá na inovação um componente central, sendo ela a portadora de capacidades técnicas para produzir mais com menos, menos recursos naturais, menos energia, menos poluentes.
Por fim, o futuro vai demandar a descarbonização, em especial da agricultura; a recuperação dos solos; a reversão das queimadas e a redução do gás metano. Tudo isso concentrado no bioma mais degradado em tempos em negacionismo climático. A retomada expressiva de recursos do Fundo Amazônia, geridos pelo BNDES, é um alento para quem ainda tem esperança de futuro. Após quatro anos seguidos de desembolsos nulos, no ano de 2023 um montante de R$ 1,339 bilhão foi dividido entre projetos aprovados e chamadas públicas.
O BNDES voltou, como apregoou seu Presidente na coletiva de imprensa. Um dos pilares da reconstrução nacional insistiu em ficar de pé. Os dados do exercício de 2023 mostram um banco lucrativo; com baixíssima inadimplência; expressivo ativo imobilizado e compromissado com seu objetivo: fornecer crédito de longo prazo, objetivando construir as bases para o desenvolvimento integral da nação brasileira.
* Juliane Furno é professora de economia da UERJ e assessora da presidência do BNDES
** Este é um artigo de opinião e não necessariamente expressa a linha editorial do jornal Brasil de Fato.
Edição: Matheus Alves de Almeida