Um grande ato político vai reunir no próximo sábado (24) militantes históricos, assentados e parceiros do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST) em Campos dos Goytacazes (RJ).
A atividade é parte da programação do Encontro Estadual do MST, que acontece nos dias 23 a 25 de fevereiro, na Escola Técnica Agrícola Antônio Sarlo, também em Campos. Faz parte também das celebrações de aniversário do que é considerado o maior movimento popular do Brasil.
A expectativa da organização é de que a militância do estado termine os dias de encontro com o fôlego renovado para movimentar mais atividades em preparação para o 7º Congresso Nacional em Brasília (DF) em julho. Até lá, eventos de celebração dos 40 anos do movimento acontecem em diversas partes do país.
O Brasil de Fato conversou com Eró Silva, da direção nacional do MST, sobre os 40 anos, o encontro estadual e a simbologia de iniciar as celebrações desse marco com um ato político em Campos, região historicamente trincheira na luta pela terra no estado.
"Projetar para mais 40 anos é principalmente trabalhar a juventude sem-terra que vai continuar erguendo as nossas bandeiras. E a nossa luta permanece no sentido de implementar aquilo que a gente entende como reforma agrária popular", afirma a dirigente.
Confira a entrevista completa:
Brasil de Fato: Qual será o tema do encontro estadual do MST?
Eró Silva: Vai ser o momento da gente celebrar os 40 anos de história do MST e iniciar a celebração no estado do Rio de Janeiro. Vamos fazer um ato celebrativo convidando pessoas que historicamente ajudaram a construir o movimento no Rio de Janeiro, que hoje estão construindo outras frentes, às vezes em outros estado. Também vamos tratar sobre o aniversário de 30 anos aqui no estado, que serão celebrados ano que vem.
O Encontro Estadual também tem o papel de traçar as nossas ações para esse ano. Pensar em como a gente vai se organizar para ir para o Congresso, pensar no nosso calendários de lutas, nas ações junto com a sociedade. É um encontro que a gente também delibera. É um momento de projetar as ações daqui para frente
Campos dos Goytacazes foi palco de momentos importantes da luta pela terra no estado. O que representa a escolha desse território para realizar o encontro?
Campos dos Goytacazes é o território em que o MST faz uma grande ocupação com o [assentamento] Zumbi dos Palmares. Isso lá pelo ano de 1997, quando o movimento enquanto organização retoma a luta pela terra aqui no estado.
É significativo a gente fazer o encontro onde está fincado também nossas principais e primeiras áreas de reforma agrária nesse período. A gente tem cerca de 11 assentamentos na região norte do estado. A maioria está em Campos.
Celebrar com as famílias e com o assentamento novo Cícero Guedes, que vai estar presente no encontro Estadual, tem esse significado para gente. É um espaço onde nós tivemos muitas lutas. Tivemos também a perda do nosso companheiro Cícero naquele território, mas principalmente a gente tem um espaço pra celebrar as nossas conquistas e, a partir daí, indicar quais são as nossas futuras ações para avançar na reforma agrária popular.
O que para você significa projetar os próximos 40 anos do MST?
Projetar para 40 anos ou mais é principalmente trabalhar a juventude sem-terra que vai continuar erguendo as nossas bandeiras. A nossa luta permanece no sentido de implementar aquilo que a gente entende como reforma agrária popular. A reforma agrária é um direito da sociedade, direito de reparação histórica, seja para o povo preto, os povos originais, mas principalmente, quando a gente olha essa crise econômica e financeira que o país vive, para muitas famílias sem um espaço para produzir sua própria comida.
Então a gente entende que a nossa luta é muito presente. Nesses 40 anos que o MST chega, a luta é cotidiana ainda. A nossa projeção é ampliar os trabalhos cada vez mais e sempre buscar apoiar as outras lutas, como nesse momento estar cada vez mais próximo das lutas da favelas e da cidade. Porque isso faz parte do nosso projeto de reforma agrária popular.
Qual a expectativa para o Congresso Nacional do MST neste ano?
A partir do Congresso Nacional vamos mostrar para a sociedade a atualização do nosso programa agrário. Nós temos fôlego e muita garra para nos manter não só por mais 40 anos, mas muito mais anos.
A gente espera que a reforma agrária seja efetivada, é uma luta que a gente não queria que perdurasse mais de 40 anos. Mas a gente entende que a nossa luta do movimento é a luta por terra, pela transformação da sociedade, e pela reforma agrária. São lutas que se permeiam.
Mesmo quando tem a distribuição da terra, precisa ainda de muita luta para que as famílias tenham moradia, políticas públicas, e para que a gente consiga ter essa ferramenta do combate à fome e a miséria no Brasil.
Essas são as principais bandeiras do MST: a gente produzir comida de verdade, fazer reforma agrária pra gente ter acesso ao solo e tecnologia para produzir comida boa e barata, e que a população que está no centros urbanos também tenham o acesso.
Que desafios estão colocados para as políticas públicas no campo?
Temos o avanço do agro, a destruição dos bens da natureza. Quando tem um déficit de trabalho no campo, dificuldade de moradia, o processo de êxodo rural sempre foi buscar a cidade como uma alternativa de sobrevivência. Porque aqui vai ter o catador, vai ter mão de obra numa construção, vai fazer um bico para comer no final do dia.
Às vezes isso acontece em locais que não está chegando a energia elétrica, não tem um transporte, não tem saúde. Quando a gente olha para o cenário real do que é o campo do Brasil não é esse cenário do agronegócio de quem tem um jatinho para ir no médico fora do Brasil. Esse não é o cenário do morador da área rural. Existem cenários que estão invisíveis.
[Precisamos que] as políticas públicas sejam reconstruídas com efetividade e impacto no território de quem precisa para trabalhar a emancipação das pessoas. A política publica não é para deixar as pessoas dependentes, é um motor de emancipação e independência, principalmente financeira, das pessoas.
Fonte: BdF Rio de Janeiro
Edição: Mariana Pitasse