festa na sapucaí

Segundo dia de desfiles do carnaval do Rio tem exaltações à negritude; confira destaques e fotos

Mocidade, Portela, Vila Isabel, Mangueira, Tuiuti e Viradouro se apresentaram; campeã será conhecida na quarta-feira

Brasil de Fato | Rio de Janeiro (RJ) |
Destaque de apresentação da Vila Isabel na madrugada de segunda para terça-feira de carnaval no Rio - Dhavid Normando / Rio Carnaval

A segunda noite de desfiles do Grupo Especial do carnaval do Rio abriu espaço para exaltações à negritude. Nada menos que cinco escolas (Portela, Vila Isabel, Mangueira, Paraíso do Tuiuti e Viradouro) apresentaram enredos ligados a pessoas ou temáticas negras na madrugada de segunda (12) para terça-feira de carnaval.

A Viradouro, que fechou a noite de desfiles com um enredo com fortes raízes africanas, é uma das principais favoritas ao título, de acordo com o jornalista Luiz Gustavo Thomaz, especialista em desfiles de carnaval.

A Portela, que foi escolhida como melhor escola pelo júri do tradicional prêmio Estandarte de Ouro, oferecido pelo jornal O Globo, também mostrou força.

A Vila Isabel, que reeditou um enredo histórico sobre a criação da humanidade com referências nas religiões de matrizes africanas, foi outra escola que se destacou, apesar de alguns erros pontuais.

A campeã do carnaval do Rio em 2024 será conhecida nesta quarta-feira de cinzas (14). A apuração das notas começa às 16h. As seis escolas que se apresentaram na segunda noite de desfiles concorrem pelo título com as que se apresentaram na noite de domingo para segunda-feira.

Mocidade Independente de Padre Miguel


Criatividade da comissão de frente foi um dos pontos altos do desfile da Mocidade / Sad Coxa / Rio Carnaval

A Mocidade abriu a segunda noite de desfiles do Grupo Especial colocando a Sapucaí para cantar o samba-enredo mais popular desta temporada do carnaval carioca. A escola seis vezes campeã quer voltar a conquistar o título com o enredo Pede Caju Que Dou... Pé de Caju Que Dá!, que empolgou as arquibancadas.

A "delícia nativa", como canta o samba, foi a referência para falar sobre os povos originários, o movimento tropicalista e a brasilidade, com destaque para artistas como a brasileira Tarsila do Amaral e o francês Jean Baptiste Debret, que mostraram a fruta em suas telas. Na avenida, os componentes refletiram a alegria do enredo.

A escola teve alguns problemas na evolução, e alguns setores tiveram de apertar o passo no fim do desfile para a apresentação não estourar o tempo limite de uma hora e dez minutos, o que pode comprometer parte das avaliações.

Portela


Atriz Taís Araújo decidiu voltar a desfilar no carnaval do Rio após muitos anos depois de saber que o livro Um Defeito de Cor seria base para o enredo da Portela / Sad Coxa / Rio Carnaval

Maior campeã do carnaval carioca, mas vindo de um décimo lugar em 2023, a Portela levou para a avenida a força das mulheres pretas no Brasil. O enredo Um Defeito de Cor foi baseado no livro de mesmo nome, de Ana Maria Gonçalves. Levou para a Sapucaí uma nova perspectiva da história, refazendo os caminhos imaginados da história de Luisa Mahin, mulher de origem africana que teve papel fundamental na articulação de pessoas escravizadas no Brasil no século 19 e mãe do abolicionista Luiz Gama, também homenageado.

O desfile foi marcado por muita emoção. Um dos carros alegóricos trouxe 16 mães que perderam seus filhos para a violência. Entre elas, Marinete Silva, mãe da vereadora Marielle Franco, que foi assassinada no Centro do Rio em 2016.

Assim como a Mocidade, a Portela também teve problemas que podem comprometer a avaliação dos jurados. O carro abre-alas teve problemas para entrar na passarela do desfile e foi à avenida com esculturas quebradas. Além disso, pelo menos mais um carro teve a estrutura danificada na apresentação. Por conta desses problemas, a escola teve dificuldades também na evolução no começo do desfile.

Vila Isabel


Vila fez grande apresentação e tem boas chances de levar o título do carnaval / Alexandre Vidal / Rio Carnaval

A Vila Isabel levou à Sapucaí a reedição de um enredo que foi apresentado pela primeira vez em 1993: Gbala: Viagem ao Templo da Criação, que teve samba composto por ninguém menos que o mestre Martinho da Vila.

O enredo usou referências das religiões de matrizes africanas para falar sobre a criação da humanidade, que foi designada para cuidar das criaturas do planeta mas falhou na missão. As crianças, então, foram convocadas para, com sua inocência, serem as protetoras do planeta.

Com um desfile idealizado pelo carnavalesco Paulo Barros, quatro vezes campeão do Grupo Especial do Rio e conhecido por suas soluções e invenções criativas, a Vila encantou em muitos momentos. Entretanto, a escola pode perder décimos importantes na avaliação do casal de mestre-sala e porta-bandeira, que foi à avenida com fantasias com luzes de led que tiveram problemas.

Mangueira


Torcedora apaixonada da Mangueira, Alcione se emocionou ao ser homenageada na Sapucaí / Alexandre Vidal / Rio Carnaval

Dona de 20 troféus do carnaval do Rio, a Mangueira contou na avenida a vida e a obra de uma mangueirense ilustre: a cantora Alcione. Com o enredo A Negra Voz do Amanhã, a tradicional escola verde e rosa falou sobre a importância da "Marrom" para as mulheres do país e destacou traços da cultura do Maranhão, estado de origem da homenageada, que participou do "esquenta" no começo do desfile e foi destaque em um dos carros alegóricos.

O desfile da verde e rosa foi marcado pela emoção dos muitos amigos que foram à avenida prestar homenagens a Alcione, que completa 50 anos de carreira. Entre essas pessoas, Maria Bethânia. A Mangueira, que tem uma das torcidas mais apaixonadas do carnaval do Rio, atravessou a Sapucaí sob muitos aplausos.

A briga pelo título pode ficar distante devido a alguns problemas apresentados na avenida. Em um dos carros, uma escultura retratando Alcione se quebrou, e por pouco a cabeça da imagem não caiu. A evolução da escola foi comprometida. Houve problemas também na dispersão. Uma pessoa chegou a cair de um carro alegórico, mas foi atendida e passa bem.

Paraíso do Tuiuti


Tuiuti trabalha para não deixar a história de João Cândido ser esquecida / Sad Coxa / Rio Carnaval

A Paraíso do Tuiuti, que em 2018 foi a grande surpresa do carnaval, levando o vice-campeonato com um enredo sobre os 130 anos da Lei Áurea, decidiu voltar a falar sobre a resistência do povo preto. Com o enredo Glória ao Almirante Negro!, a escola fez uma homenagem a João Cândido, que liderou a chamada Revolta da Chibata, um motim de marinheiros negros contra os castigos físicos no início do século 20. A revolta, inicialmente vitoriosa, terminou com a expulsão de João Cândido da Marinha.

Na avenida, a escola lembrou diversos casos de racismo que foram registrados no Brasil nos últimos anos. Em um dos pontos altos do desfile, João Cândido foi representado por Max Ângelo dos Santos, entregador que foi agredido com um chicote por uma mulher na Zona Sul do Rio em abril de 2023.

Apesar de não ter sido brilhante, a escola, considerada "pequena", não deve ter problemas na luta contra o rebaixamento, segundo Luiz Gustavo Thomaz. O especialista apontou pequenos problemas de evolução no final do desfile, mas destacou a bateria como uma das melhores a se apresentar na Sapucaí em 2024.

Viradouro


Viradouro fechou a noite de desfiles exaltando a força das mulheres negras / Alexandre Vidal / Rio Carnaval

A Viradouro fechou os desfiles do Grupo Especial do Rio em 2024 com mais uma exaltação à força da mulher preta, a exemplo da Portela. O enredo enredo Arroboboi, Dangbé falou sobre o culto ao vodum serpente na região hoje conhecida como Benin, e apresentou um "exército" de mulheres. "Vive em mim a lealdade das irmãs de cor", cantou a escola.

Em um desfile praticamente sem erros, a Viradouro fechou a festa da Sapucaí com chave de ouro, já com o dia amanhecendo na terça-feira de carnaval, e se credenciou fortemente na disputa pelo título.

"A Viradouro só não é campeã se acontecer uma surpresa. Imperatriz e Grande Rio sonham com o título, mas precisam sonhar muito, pois a Viradouro foi irrepreensível", apostou Luiz Gustavo Thomaz.

Edição: Nicolau Soares