O ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF), levantou nesta sexta-feira (9) o sigilo do vídeo da reunião ministerial realizada pelo Jair Bolsonaro (PL) em 5 de julho de 2022. Na ocasião, o ex-presidente instigou os chefes das pastas contra a Justiça Eleitoral e reforçou fake news.
A retirada do sigilo aconteceu após o jornal O Globo revelar o conteúdo do vídeo. O material é um dos elementos utilizados pela Polícia Federal (PF) para realizar a operação Tempus Veritatis, que cumpriu nesta quinta-feira (8) buscas contra ex-ministros do primeiro escalão de Bolsonaro e militares de alta patente alinhados ao bolsonarismo para investigar as articulações golpistas durante o governo de do ex-presidente. Também foram detidos três ex-auxiliares de Bolsonaro.
No vídeo de mais de 1h30 de duração estão presentes vários ministros do então governo que ouvem Bolsonaro repetir fake news sobre o funcionamento das urnas e o Tribunal Superior Eleitoral, atacar ministros do STF, ordenar a eles que repitam as informações distorcidas e sugerir até a redação de uma nota conjunta entre os ministério para afirmar que seria impossível atestar a lisura das eleições.
"Olhem pra minha cara, por favor. Todo mundo olhou pra minha cara? Acho que não tem bobo aqui. Pô, mais claro do que tá aí? Mais claro ... impossível! Eu acredito que essa proposta de cada um da Comissão de Transparência Eleitoral tem que ... quem responde pela CGU vai, quem responde pelas Forças Armadas aqui... é botar algo escrito, tá? Pedir à OAB. Vai dar... a OAB vai dar credibilidade pra gente, tá? Polícia Federal ... dizer ... que até o presen ... uma nota conjunta com vocês, com vocês todos ... topam ... que até o presente momento dadas as condições de ... de ... se definir a lisura das eleições são simplesmente impossíveis de ser atingidas. E o pessoal assina embaixo", afirmou o então presidente.
Bolsonaro abre a reunião espalhando várias fake news. Ele chega a afirmar que o fato de ele estar sentado na cadeira presidencial seria uma "cagada" e alerta seus ministros para agirem contra as supostas fraudes na eleição que garantiriam a vitória de Lula. "Essa cadeira aqui é uma cagada, eu estar aqui é uma cagada. Cagada do bem pra deixar bem claro. Como que eu ganho uma eleição, fudido como eu, escrotizado dentro da Câmara, sacaneado, gozado, uma porra de um deputado", disse Bolsonaro
"Porque os cara tão preparando tudo, pô! Pro Lula ganhar no primeiro turno, na fraude. Vou mostrar como e porquê. Alguém acredita aqui em Fachin, Barroso, Alexandre de Moraes? Alguém acredita? Se acreditar levanta o braço! Acredita que eles são pessoas isentas, tão preocupado em fazer justiça, seguir a Constituição? De tudo que são ... Tão vendo acontecer?", seguiu o então presidente.
Deputado federal por quase trinta anos, eleito pelo sistema que ele depois acusou de não ser confiável, Bolsonaro repete várias teses e suspeitas que nunca foram provadas. De acordo com as investigações da PF, os ataques ao sistema eleitoral e o levantamento de dúvidas sobre a confiabilidade das urnas seriam a primeira etapa das articulações golpistas para manter Bolsonaro no poder.
Na reunião, os ministros acabam endossando o discurso do então presidente. O chefe da Defesa, general Paulo Sergio Nogueira, chega a afirmar que estava mantendo reuniões constantes com os comandantes das forças para ver quais ações poderiam adotar para garantir a reeleição de Bolsonaro.
"Senhor Presidente, eu estou realizando reuniões com os comandantes de Força quase que semanalmente. Esse cenário, nós estudamos, nós trabalhamos. Nós temos reuniões pela frente, decisivas pra gente ver o que pode ser feito; que ações poderão ser tomadas pra que a gente possa ter transparência, segurança, condições de auditoria e que as eleições se transcorram da forma como a gente sonha! E o senhor, com o que a gente vê no dia a dia, tenhamos o êxito de reelegê-lo e esse é o desejo de todos nós", afirmou.
Uma das falas mais surpreendentes ocorre ao final da reunião, quando o então ministro do Gabinete de Segurança Institucional, general Augusto Heleno chega a afirmar que conversou com a Agência Brasileira de Inteligência (Abin) para, segundo a PF, infiltrar agentes nas campanhas eleitorais.
"Eu já conversei ontem com o Victor, novo diretor da Abin, nós vamos montar um esquema para acompanhar o que os dois lados vão fazer. O problema todo disso é se vazar qualquer coisa, a gente se conhece nesse meio, qualquer acusação de infiltração", afirmou o ministro que foi logo interrompido por Bolsonaro. "Ô general, peço que o sr não fale, por favor, não prossiga na tua observação". Confira a íntegra do vídeo:
Edição: Thalita Pires