Sexto dia de greve

Preço dos ingressos e conflito de interesses: entenda a greve em Machu Picchu, no Peru

Manifestantes liberaram a entrada do parque por trens durante 24 horas; ministra da Cultura disse que não vai ceder

Brasil de Fato | São Paulo (SP) |
Greve no sítio arqueológico começou em 25 de janeiro - Carolina Paucar / AFP

A greve contra a privatização na venda de ingressos para o sítio arqueológico Machu Picchu, no Peru, teve um dia de trégua nesta terça-feira (30). O Coletivo Popular de Machu Picchu se reunirá com o governo para negociar o fim das paralisações. Com isso as entradas ao parque pela linha de trem estão liberadas pelos manifestantes por um período de 24 horas.

O coletivo formado por moradores da região e funcionários do sítio arqueológico reivindica o fim do contrato firmado pelo Ministério da Cultura com a empresa Joinnus, que vai administrar a venda de entradas para o parque. Desde 25 de janeiro, o grupo realiza bloqueios na ferrovia que liga o local inca de Machu Picchu à cidade de Ollantaytambo.

Os primeiros motivos para a paralisação são o aumento nos preços dos ingressos em 3,9% e o valor da margem de lucro da empresa. A Joinnus afirma que vai faturar 12 milhões de soles (R$ 15,66 milhões na cotação atual) em 2024 com essa operação. O coletivo afirma que  esse valor é quatro vezes o necessário para a manutenção do parque, o que não justifica a diferença nessa margem de lucro. Os ingressos hoje variam de 64 soles (R$ 83,50) para peruanos a 200 soles (R$ 260,95) para estrangeiros.

O governo usa justamente o argumento do lucro do parque para justificar a privatização. Segundo o Ministério da Cultura, a gestão do parque apresentou uma inconsistência no balanço da venda de ingressos de quase 8 milhões de soles (R$ 10,36 milhões na cotação atual), com a venda de quase 80 mil ingressos "fantasmas". 

Em comunicado, o Coletivo Popular de Machu Picchu também aponta para indícios de corrupção e de conflito de interesses da empresa Joinnus. A Comissão de Juristas de Cusco reforça essa tese e apresentou, em 26 de janeiro, um pedido de denúncia contra a empresa ao Ministério Público. O grupo afirma que a Joinnus teria usado a estrutura estatal para benefício próprio, como imóveis, funcionários e bases de dados virtuais.

O grupo de juristas também acusa a empresa de não ter repassado ao governo de Cusco o valor da venda virtual de ingressos do dia 20 de janeiro ao dia 26.

No documento, os manifestantes também afirmam que a empresa teria acesso à base de dados "mais valiosa" do setor de turismo, com informações pessoais fornecidas na plataforma de venda de ingressos. A companhia também atua no ramo de turismo e promoção de eventos, o que, para o coletivo, configura um conflito de interesses, já que o ideal seria uma empresa responsável só pela venda de ingressos.

Além das questões relacionadas à Joinnus, o comunicado pede também a renúncia da ministra da Cultura, Leslie Urteaga, por "danos e prejuízos" causados ao distrito de Machu Picchu. Também pede que ao menos 25% dos ingressos sejam vendidos na bilheteria física do parque.

O prefeito do distrito de Machu Picchu, Elvis La Torre Uñaccori, afirmou que o governo local não foi consultado para a mudança no sistema e que não aprova a contratação da Joinnus. A região recebe 4,5 mil turistas por dia. Sob o novo esquema de venda administrado pela Joinnus, são comercializados mil ingressos no Centro Cultural de Machu Picchu.

Negociações pelo fim da greve

Além da ministra da Cultura, o encontro desta terça-feira terá a participação dos ministros Jordi Hereu (Turismo) e Albina Ruiz Ríos (Meio Ambiente). Leslie Urteaga já disse que não vai cancelar o contrato com a empresa. Com as paralisações, o governo também estuda fechar temporariamente as entradas ao parque.

Ao todo, 1,2 mil pessoas deixaram o sítio arqueológico durante o final de semana, em um processo de evacuação da área por parte do governo.

O presidente do Conselho de Ministros, Alberto Otarola, ameaçou punir os manifestantes com 15 anos de prisão para quem bloqueou as ferrovias.

Machu Picchu é considerado Patrimônio Cultural da Humanidade desde 1983 pela Unesco (Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura). Foi construído no século XV pelo império inca, então comandado por Pachacútec (1438-1470). 
 

Edição: Nicolau Soares