Após sete anos, o Mercosul voltou a ter a Cúpula Social de forma presencial. O evento, que promove a participação da sociedade civil nas decisões do bloco, aconteceu entre os dias 4 e 7 de dezembro, no Museu do Amanhã, região central do Rio de Janeiro.
O espaço permitiu o debate de temas relevantes para as populações dos países do Cone Sul, como o combate ao racismo, redução das desigualdades e a crise climática. Especialistas avaliam que o retorno deste espaço é de extrema importância.
A cientista política e professora da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), Mayra Goulart explica que a retomada da cúpula é um avanço, pois tão importante quanto a perspectiva econômica do Mercosul é o viés político e social, já que “quanto maior for a abertura, a participação e a disseminação desses mecanismos na sociedade civil mais ela vai ver esses mecanismos como legítimos, como algo a ser defendido”.
“É muito oportuna a realização da cúpula social nesse contexto que está às vésperas da ascensão da extrema direita, da posse de Javier Milei na Argentina, porque esses organismos vão precisar ser defendidos, como precisaram ser defendidos durante o governo de Jair Bolsonaro. O que esses organismos representam que é a ideia de proteger os mais fracos, intervir na defesa dos mais fracos é o contrário do que a extrema direita defende”, diz Goulart.
De acordo com a professora de relações internacionais da Fundação Escola de Sociologia e Política de São Paulo (FESPSP), Flávia Loss, a cúpula é necessária porque traz as agendas de redução de desigualdade para o centro do debate no Mercosul.
“São discussões que nós temos internamente em cada sociedade, mas que podemos ter em nível regional. Pensar no Cone Sul como uma região de interlocução e de avanço deste tipo de política, de ações afirmativas [...] Isso já existia, ficou parado, mas agora reforça essas pautas da sociedade civil que tem sim que ser discutidas no âmbito do Mercosul”.
Acordo Mercosul-UE
Uma das demandas da sociedade civil é o debate sobre o acordo do Mercosul com a União Europeia. Em documento, movimentos sociais expressaram que caso seja concluído sem alterações, o acordo vai representar o aprofundamento do modelo capitalista que fortalece as elites.
Loss ressalta que “esse acordo tem três pilares: o comercial, que a gente já teve acesso ao texto; o político e o de cooperação. Esses outros dois, os documentos ainda não foram divulgados, as sociedades civis de ambos os blocos não têm acesso, a gente não sabe o que está sendo acordado. Então fica difícil porque quando a gente olha só para o viés comercial fica faltando algumas partes para que a gente entenda o que a gente teria também de benefícios dentro desse acordo, por isso tem tanta polêmica e algumas resistências aqui na América do Sul”.
Outro tema em discussão é a crise climática. De acordo com Goulart, os países precisam estar conectados para o enfrentamento desse desafio. “Não tem como o país criar uma solução doméstica para o problema climático. Esses problemas não vão ser resolvidos unilateralmente, eles vão precisar de esforços, de cooperação e de ceder, porque o fenômeno, a catástrofe é global, então as soluções vão ter que ser também globais.”
Flavia Loss também observa que, apesar da importância da questão climática e ambiental, há entraves para o acordo com a União Europeia.
“O presidente Lula tem reforçado que nós já temos legislações ambientais robustas e que a gente precisa de colaboração financeira até para fazê-las serem cumpridas, não é uma falta de compromisso. Tanto é que o Brasil, assim como nossos vizinhos, são signatários dos principais regimes internacionais de sustentabilidade, são países comprometidos. Só que a gente não consegue cumprir todas as metas por uma questão econômica e financeira”, finaliza a professora.
A retomada da Cúpula Social é um compromisso do Brasil que assumiu a presidência do Mercosul em julho deste ano. O período do país no comando do bloco se encerrou na última quinta-feira (7).
Edição: Rodrigo Durão Coelho