Em abril de 2009, Josenildo Estanislau dos Santos deixou o trabalho em sua oficina e foi até um bar no Morro da Coroa, no Catumbi, centro do Rio de Janeiro, para comprar cigarros. Ele não sabia que nunca mais voltaria para casa. O lanterneiro, na época com 42 anos, foi assassinado por policiais militares com tiros de fuzil na nuca, durante uma operação na região.
Pouco mais de 14 anos depois, sua família teve o desfecho que esperava: os três PMs foram condenados a 54 anos de prisão e a perda de seus cargos por terem executado Josenildo e mais cinco pessoas naquele dia.
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A defesa dos policiais declarou, sem provas, que Josenildo era envolvido com o tráfico e registrou o caso como homicídio proveniente de auto de resistência, mas de acordo com o Ministério Público do Rio (MP-RJ), os PMs agiram com “violência desnecessária, sem que tivesse sido comprovado que os mesmos teriam sofrido ataque durante a incursão”.
Luciano Norberto dos Santos, mais conhecido como Cuca, é irmão de Josenildo. Ele conta, em entrevista ao Brasil de Fato, que todos os dias desde o ocorrido lutou para que a justiça fosse feita para sua família.
“Nós procuramos delegacia, todos os órgãos de defesa dos direitos humanos, OAB, Alerj, MP, Defensoria Pública e foi uma grande luta. Fomos ameaçados, meu irmão Josilmar teve o vidro do carro estilhaçado por uma bala em um atentado. Foi uma grande luta", desabafa.
Cuca explica que a condenação dos policiais após tanto tempo traz um pouco de alívio, mas que o assassinato do irmão nunca foi superado por sua família. Ele e outros seis irmãos hoje vivem em locais diferentes, separados uns dos outros, por segurança.
“Mexeu com a estrutura da minha família, ela era organizada, minha mãe, meus irmãos todos juntos, todo Natal, Ano Novo a gente ficava juntos. Além de matarem meu irmão, intitularem ele como traficante, mexeu muito com a gente. No mesmo dia 2 de abril, em 2011, dois anos após a morte do meu irmão, minha mãe faleceu e depois de um ano meu irmão mais velho que não aceitava também faleceu”, conta o motorista.
A ativista de direitos humanos da ONG Rio de Paz, Fernanda Vallim Martos, explica que essas execuções feitas por policiais estão relacionadas diretamente ao abuso de autoridade.
“A morte é o último passo dessa cadeia de abuso que acontece principalmente com o pobre, preto e periférico. A pessoa que foi assassinada pelo policial tem todo o contexto familiar e de uma vizinhança que fica traumatizada. O Estado não oferece auxílio psicológico, enrola para oferecer indenização, quando oferece é na base dos precatórios e o processo se arrasta”.
Para Fernanda, a demora no processo para condenar os culpados traz ainda mais dor para as famílias das vítimas. “Justiça que demora não é justiça. Tem um velho ditado que diz que a justiça tarda, mas não falha, se tardou já falhou, a justiça tem que ser célere, a investigação tem que ser célere. Obviamente, ela tem que ser cuidadosa, a gente precisa respeitar o direito de defesa de todos os envolvidos, ninguém aqui está falando de condenação sumária. Nós como organização o que a gente cobra é o respeito ao devido processo legal”, finaliza.
Já Cuca acredita que essa condenação é apenas o início do resultado de sua luta. “Antes da minha mãe morrer eu prometi a ela que a gente não ia descansar enquanto esse caso não fosse esclarecido e a gente levasse os culpados para serem responsabilizados. E ela sempre falou pra gente continuar apoiando a luta das mães, porque assim como aconteceu com meu irmão acontece com muitos”.
Atualmente, Cuca e seu irmão, Josilmar Macario dos Santos, estão no Programa de Proteção aos Defensores dos Direitos Humanos por conta de ameaças de morte. Os policiais condenados pela morte de Josenildo entraram com recurso para anular a sentença.
Edição: Mariana Pitasse