Estados Unidos

Vitórias de greves em Hollywood e na indústria automobilística podem impulsionar sindicatos nos EUA

Trabalhadores de Hollywood conseguiram regulamentar uso da IA e trabalhadores automobilísticos terão aumento de 25%

Brasil de Fato | Nova York (EUA) |
Nesta quinta-feira, trabalhadores do Starbucks em mais de 40 estados paralisaram as atividades - AFP

Quem luta, conquista. Mais do que nunca, a palavra de ordem se torna realidade nos Estados Unidos. Após meses em greve, trabalhadores de Hollywood e da indústria automobilística começam a colher os frutos das mobilizações.Tão históricos quanto as greves em si, foram os acordos firmados. 

Roteiristas e atores conquistaram aumentos salariais e uma regulamentação sobre o uso da inteligência artificial nos estúdios. Para recriar a interpretação de atores a partir da IA, as empresas terão que pagar aos atores pelo tempo que seria necessário gravar as mesmas cenas presencialmente.

Já os trabalhadores da indústria automobilística terão um aumento de 25% nos próximos 4 anos. Abaixo dos 40% exigidos no início da greve, mas o maior aumento em décadas. 

Em um país onde o sindicalismo vem perdendo força desde o fim dos anos 1970, essas vitórias podem representar uma virada de página.



O impacto da vitória dos trabalhadores

Joe Biden, que se tornou o primeiro presidente a participar de um piquete de greve, vestiu a camisa do UAW, o sindicato dos trabalhadores automobilísticos, para celebrar o acordo. O presidente chegou a afirmar que “esses acordos são uma virada de jogo, não apenas para os trabalhadores do UAW, mas para todos os trabalhadores do setor automotivo dos EUA”.

De fato, nas semanas seguintes ao fim da greve, pelo menos 3 montadoras que não possuem trabalhadores sindicalizados anunciaram aumentos salariais: Toyota, Honda e Hyundai. Para Jack Fiorito, professor da Universidade da Flórida que conversou com o Brasil de Fato, isso não é mera coincidência.

“Não, eu acho que isso é muito mais do que uma coincidência”, disse Fiorito, “é uma tentativa de tentar evitar o interesse de sindicalização entre os trabalhadores dessas empresas, mostrando que eles podem ter melhorias sem uma greve ou sem um sindicato”.

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O objetivo do sindicato, após a greve, é exatamente organizar trabalhadores ainda não representados pela entidade. Shawn Fain, líder do UAW falou sobre isso em um vídeo em que comenta  acordos firmados.

“A Toyota não está dando aumentos pela bondade de seus corações”, afirmou Fain, “a Toyota é a maior e mais lucrativa montadora do mundo. Eles poderiam simplesmente ter aumentado salários há um mês ou há um ano. Eles aumentaram agora porque a empresa sabe que estamos indo atrás dela. A empresa sabe que os trabalhadores da Toyota estão assistindo”.

E o presidente da UAW fez um chamado: “e quando a hora chegar, os trabalhadores da Toyota e todos os trabalhadores da UAW estarão prontos para se levantar. Mesmo que vocês ainda não sejam membros do nosso sindicato, esse aumento que a Toyota está dando para vocês é fruto da nossa greve. UAW significa: vocês são bem-vindos”.

De acordo com um levantamento da Gallup Polls, divulgado em agosto, 67% dos estadunidenses apoiam os sindicatos. Em 2022, esse índice chegou a 70%, o maior desde 1965.

Ainda que tenha havido uma pequena queda, a visão positiva segue muito maior que em 2009, quando o apoio chegou ao menor nível histórico, com apenas 48%.

Alguns especialistas acreditam que as vitórias acumuladas este ano podem levar a uma onda de sindicalização no país, mas Jack Fiorito é mais cauteloso nas previsões.

Perguntado sobre o assunto, o professor respondeu: “a sua pergunta me faz lembrar de um pronunciamento do presidente da Associação Econômica Americana, em 1932, quando ele disse que não via como os sindicatos, que estavam em declínio na época, conseguiriam dar a volta por cima. No entanto, nos 15 anos seguintes, os sindicatos quintuplicaram suas filiações. Nós vimos um dos crescimentos mais espetaculares dos sindicatos que já vimos no nosso país”.|

Fiorito explica que “fazer previsões é um jogo perigoso de se jogar” e que não vê “nenhuma evidência clara de uma volta por cima”, mas que existe potencial para que esse seja o início da virada para os sindicatos.

Uma nova regra criada pelo Conselho Nacional de Relações Trabalhistas dos EUA, e que passa a valer no mês que vem, tornará mais fácil a formação de sindicatos em empresas que operam com franquias, como o McDonald’s, ou com os chamados contratantes independentes, como é o caso da Amazon. As empresas, como era de se esperar, já estão protestando.

Em entrevista ao Brasil de Fato em julho deste ano, Duncan Crabtree-Ireland, diretor executivo e negociador chefe do SAG-AFTRA, o sindicato dos atores, mandou um recado aos trabalhadores.

“O tempo em que essas empresas podiam esmagar os trabalhadores sob os seus pés acabou” disse Duncan em julho, “e trabalhadores, e as pessoas em geral, precisam se levantar e dizer: empresas vão tratar seus empregados de forma justa. É assim que vai ser de agora em diante”.

Edição: Leandro Melito