Com a articulação da Associação Internacional para Cooperação Popular, Baobab, a Universidade de Agricultura da China (UAC) está desenvolvendo parcerias com a Universidade de Brasília e o Movimento de Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST) nas áreas de bioinsumos e de maquinário agrícola para agricultura familiar.
No começo de novembro, a reitora da Universidade de Brasília (UnB), Márcia Abrahão, esteve na China junto a uma delegação do MST no país asiático para dar continuidade à construção do Centro Brasil-China de Pesquisa, Desenvolvimento e Promoção de Tecnologia para Agricultura Familiar.
O centro binacional possui três eixos: o intercâmbio de estudantes que incluirá, além de atividades acadêmicas, vivências em comunidades rurais no Brasil, como territórios quilombolas e assentamentos do MST; a testagem de máquinas agrícolas para camponeses, e a pesquisa sobre bioinsumos para agricultura.
Abrahão, que também é presidenta da Associação Nacional dos Dirigentes das Instituições Federais de Ensino Superior (Andifes), conta que uma das pesquisas que já está sendo realizada em conjunto entre as instituições é sobre a produção de fertilizantes a partir de pó de rocha e também de resíduos de cozinha.
O diretor do Instituto de Reciclagem Orgânica da UAC, Li Ji, afirma que além da cooperação em pesquisa e no compartilhamento de tecnologias, é preciso apoiar o desenvolvimento da indústria de bioinsumos no Brasil.
“É importante ajudar no crescimento do pessoal técnico e gerencial brasileiro, pois, em última análise, os equipamentos precisarão ser localizados e atender à produção local”, afirma Li Ji.
Bioinsumos ganham terreno
No Brasil e na China os insumos biológicos vem adquirindo uma importância cada vez maior nos últimos anos.
No caso da China, em 2015, o governo lançou um plano para reduzir o uso de fertilizantes químicos, até 2020. O consumo desses insumos passou de mais 60 milhões de toneladas em 2015 para menos de 50 milhões de toneladas, em 2022, representando uma queda de mais de15%.
No final do ano passado, o governo chinês lançou dois novos planos de redução de fertilizantes químicos e agrotóxicos até 2025. Entre as medidas previstas está o aumento da proporção da área de aplicação de fertilizantes orgânicos em mais de 5 pontos percentuais.
Já no Brasil, está em trâmite o Projeto de Lei (PL) 3.668/2021, que regulamenta a cadeia dos bioinsumos. Em setembro deste ano, a Comissão de Meio Ambiente do Senado aprovou o projeto que tem como meta incentivar a redução do uso de agrotóxicos no país. Como o projeto aprovado é um substitutivo, ele irá a votação novamente nessa comissão, e se aprovado novamente, seguirá para a Câmara.
A nível dos movimentos populares, uma das experiências pioneiras é a da Cooperbio e do Movimento dos Pequenos Agricultores (MPA), com sede em Seberi (RS), mas interligada a camponeses de mais de 60 municípios da região.
Em 2020, o MST inaugurou sua primeira fábrica de bioinsumos na Cooperativa Da Terra no assentamento Pirituba, em Itaberá, região sudoeste de São Paulo. Esse ano, foi inaugurada a Unidade de Produção de Bioinsumos Ana Primavesi (em homenagem à pioneira da agroecologia) durante a 20ª Festa da Colheita do Arroz Agroecológico, em Viamão, no Rio Grande do Sul.
A coordenadora nacional do Coletivo de Bioinsumos do MST, Andreia Matheus, que integrou a delegação que veio à China, afirma que o movimento vem desenvolvendo biofábricas e unidades de produção de bioinsumos de forma integrada, envolvendo biodefensivos, biofertilizantes e compostos biocompletos.
Um dos projetos que o MST visa fortalecer com a nova parceria é a implementação de uma fábrica de bioinsumos em São Leopoldo (RS), que “tem feito um processo eficiente de gestão de resíduos”, afirma Andreia Matheus. A fábrica utilizará parte dos resíduos sólidos orgânicos para transformar em fertilizante orgânico, com base na tecnologia chinesa.
No Instituto de Pesquisa de Reciclagem Orgânica da UAC, situado em Suzhou, foi criado o primeiro Centro de Demonstração para Tratamento e Aproveitamento de Resíduos Orgânicos Urbanos e Rurais ao redor do Lago Taihu, que é o terceiro maior da China.
A planta processa mais de 14 mil toneladas de restos de alimentos por ano, e tem capacidade de produção anual de 4.500 toneladas de fertilizantes orgânicos e 146 toneladas de óleo para diferentes usos como cosméticos ou combustível.
Os principais produtos do processamento no Centro são fertilizantes orgânicos, que têm como destino a agroecologia.
Li Ji afirma que o projeto ajuda a orientar os moradores na classificação dos resíduos, criando uma economia circular, “importante para a conservação dos recursos nacionais, a proteção do ambiente, a promoção da agricultura ecológica sustentável, a preservação do solo e a defesa da saúde pública”.
Para a coordenadora nacional do Coletivo de Bioinsumos do MST, a China se tornou uma referência em relação à produção de bioinsumos “porque faz parte de uma estratégia de Estado e de país”.
“Essa estratégia de país passa por resolver os problemas ambientais do país integrada com outros setores da sociedade, como por exemplo a produção de alimentos e a produção de energia”, conclui.
Edição: Leandro Melito