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Conheça a Unicata: Universidade de e para Catadores é uma importante ferramenta de valorização dos trabalhadores da reciclagem

A iniciativa alia a troca de saberes cotidianos com importantes conhecimentos científicos que qualificam o trabalho

Brasil de Fato | São Paulo (SP) |
Os estudantes da primeira turma tiveram aulas teóricas e práticas em formato presencial e também remoto. Outros cinco módulos já estão sendo preparados - Unicata / MNCR

Conhecida como Unicata, a Universidade de e para catadoras e catadores de materiais recicláveis é uma iniciativa que constrói processos de formação contínua e permanente com trabalhadores da reciclagem. Aliando a troca de saberes cotidianos da catação com importantes conhecimentos acadêmicos que qualificam o trabalho, a Unicata permite impulsionar a valorização e a autoestima destes trabalhadores.

Desenvolvido na cidade de São Paulo, o projeto piloto da Unicata ocorreu durante o primeiro semestre deste ano e contou com a parceria do Movimento Nacional dos Catadores de Materiais Recicláveis (MNCR), que disponibilizou sua sede para a realização dos encontros e aulas.

De acordo com Luzia Honorato, uma das coordenadoras, a iniciativa para capacitação dos trabalhadores da reciclagem se mantém por meio de parcerias com universidades, institutos e organizações populares nacionais e internacionais, além de doações e trabalhos voluntários.

"Aquilo que você sabe, você nos ensina. Aquilo que nós sabemos, nós ensinamos a todos. E nessa dinâmica a gente termina seguindo o método do Paulo Freire, que é um método popular. Eu acho que o maior desafio nesse momento é inventar uma roda, porque a Universidade dos Catadores é uma invenção nova. E praticamente 99% é trabalho voluntário, são pessoas que não têm remuneração."


"Eu acho que o maior desafio nesse momento é inventar uma roda, porque a Universidade dos Catadores é uma invenção nova", defende Luzia Honorato / Unicata / MNCR

"Continuar caminhando"

Os estudantes da primeira turma, que receberam os certificados de conclusão do primeiro módulo do curso em um ato solene na Câmara Municipal de São Paulo, tiveram aulas teóricas e práticas em formato tanto presencial quanto remoto. Outros cinco módulos já estão sendo preparados para serem realizados dentro do próximo ano.

Maria Aparecida Rodrigues, conhecida como Cida Preta, vive no extremo sul de São Paulo e trabalha com a catação há 31 anos. Hoje, com 69 anos, ela, que não conseguiu terminar os estudos formais, recebeu o certificado de conclusão do primeiro módulo do curso da Unicata e diz que pretende fazer os próximos módulos porque a universidade abriu outras possibilidades na sua vida.

"A minha vontade sempre foi dar palestra nos lugares, falar da necessidade da separação de material reciclável, em casa mesmo. E com a Unicata vai ser um avanço para mim. Com os certificados já fica mais fácil para que eu possa continuar caminhando. Depois que eu estive na unicata eu recebi o certificado numa semana e na outra semana já fui chamada para dar uma palestra para mais ou menos 40, 50 crianças de 11 a 14 anos. Então já valeu bastante para mim." 

Cida, que já foi membro do Conselho Tutelar e do Conselho Gestor de Saúde da cidade de São Paulo, realiza com as famílias do seu bairro um trabalho de conscientização da importância da reciclagem e da separação dos resíduos. Entretanto, para ela é essencial que os catadores sejam reconhecidos e valorizados, assim como os outros trabalhadores da limpeza urbana.

"O nosso material reciclável daí um mês e pouco já está todo no mercado de volta. Então a gente já ajuda eles, a gente já ajuda os governos na matéria prima. A gente já ajuda eles bastante. Então nada mais justo deles fazer um valor digno para nós catadores. Porque somos nós que trabalhamos, quem limpa a cidade. Somos nós catadores. Então eles tinham que pagar nós para trabalhar como eles pagam os garis, como eles pagam a coleta seletiva. Nada mais justo eles pagarem."


Para Cida é essencial que os trabalhadores da catação sejam reconhecidos e valorizados, assim como outras categorias de trabalhadores da limpeza urbana / Unicata / MNCR

Sujeitos das próprias histórias

Em 2022 uma pesquisa realizada com trabalhadores da reciclagem identificou os principais tópicos que deveriam ser aprofundados no primeiro curso. Sendo assim, com ênfase na troca de conhecimentos entre educadores e educandos, a Unicata aborda temas que dizem respeito ao cotidiano do trabalho da reciclagem, como a destinação de resíduos, mudanças climáticas, aquecimento global, inclusão social, diminuição da pobreza, desenvolvimento de uma economia solidária e circular e geração de renda. O conhecimento técnico que permeia os processos da reciclagem também é um dos focos do curso.

De acordo com dados divulgados pelo Ipea, o Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada, o Brasil tem pelo menos 800 mil trabalhadores que são responsáveis pela maioria dos processos de reciclagem de materiais. Entretanto, a falta de renda e de acesso a direitos básicos é uma dura realidade para essas pessoas. 

Para Luzia, a iniciativa da Unicata é importante porque, com as trocas de aprendizados, auxilia no empoderamento dos sujeitos sobre suas próprias histórias de vida e conhecimentos adquiridos.

"Eu diria que o maior objetivo é levantar a autoestima do catador para dizer para ele que ele pode, ele é capaz e ele pode não só conviver com o saber, mas competir com o saber,  que é uma coisa muito séria no Brasil. É preciso que o catador se empodere, se aproprie da sua riqueza, a riqueza não é dinheiro, a riqueza é você abrir as portas."

Edição: Nicolau Soares