O Comitê de Política Monetária (Copom) do Banco Central (BC) reduziu nesta quarta-feira (1) a taxa básica de juros da economia brasileira, Selic, de 12,75% ao ano para 12,25% ao ano. O corte de 0,5 ponto foi o terceiro seguido anunciado pelo órgão neste ano.
Ele ganhou ainda mais importância em meio a um debate sobre uma eventual mudança na meta de resultado fiscal da União para 2024.
O ministro da Fazenda, Fernando Haddad (PT), insiste em igualar os gastos e despesas do governo no ano que vem, obtendo o chamado “déficit zero”. O próprio presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) acha que isso dificilmente será possível e se recusa a cortar gastos essenciais em prol da meta fiscal, a qual é abertamente considerada inexequível pela maioria dos economistas nacionais.
A taxa Selic é uma espécie de referência para a economia nacional. Sua redução tende a baratear empréstimos, estimulando o crescimento do Produto Interno Bruto (PIB), a geração de empregos e renda.
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Haddad disse em entrevista coletiva na segunda-feira (30) que o cumprimento da meta fiscal de 2024 é um objetivo desafiador em parte porque a Selic ainda é elevada. Segundo ele, com os juros altos, as empresas lucram menos; ao lucrar menos, pagam menos impostos sobre o lucro; o governo, por sua vez, arrecada menos e tem menos recursos para arcar com suas despesas. Ou seja, falta dinheiro para o “déficit zero”.
“Obviamente que a taxa de juros é uma coisa importante”, ressaltou Haddad, ainda antes do corte anunciado na quarta. “As empresas estão lucrando menos e isso impacta no Imposto de Renda da Pessoa Jurídica e na Contribuição Social Sobre Lucro Líquido.”
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A Selic também serve como taxa para correção monetária da dívida pública do país. Segundo o BC, a cada elevação de 1 ponto percentual na taxa, essa dívida aumenta em R$ 44,8 bilhões. Sobe também o custo para arrolar esse débito; falta para zerar o déficit.
Estatisticamente, o tal “déficit zero” perseguido por Haddad não envolve o gasto com a dívida pública. É o chamado déficit primário. Acontece que tudo acaba saindo do mesmo Orçamento da União. Dos R$ 5,5 trilhões que serão gastos ano que vem, cerca de R$ 2,7 trilhões vão para a dívida – perto de 48%. Se esse percentual fosse menor, sobraria mais dinheiro para a busca do resultado fiscal neutro.
“O gasto com juros realmente é muito alto porque os juros no Brasil são muito altos”, explicou Pedro Faria, economista e pesquisador do Centro de Desenvolvimento e Planejamento Regional da Faculdade de Ciências Econômicas (Cedeplar) da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG).
“O gasto com juros também deveria estar no debate do déficit”, acrescentou Mauricio Weiss, economista e professor da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS).
Dúvida pode atrapalhar
O Copom do BC avalia as estatísticas fiscais do governo ao decidir sobre um corte ou uma elevação da taxa de juros. O órgão já sinalizou que pretende reduzir a Selic também em suas próximas reuniões. Contudo, dúvidas sobre a capacidade de o governo cumprir com suas promessas fiscais podem impactar nesses planos.
No final de setembro, em uma audiência na Câmara dos Deputados, o presidente do BC, Roberto Campos Neto, defendeu que a meta de equilíbrio das contas não fosse alterada.
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“Apesar de todo mundo entender a dificuldade de atingir a meta e de ser muito difícil cortar gastos, é importante persistir”, disse Campos Neto na Câmara. "A nossa mensagem é de persistência e está bem alinhada com o que o ministro Haddad tem dito. É um caminho bem promissor.”
O economista Miguel de Oliveira, diretor-executivo da Associação Nacional dos Executivos de Finanças (Anefac), disse que a tendência de queda está praticamente garantida em 2023. Para 2024, a depender da situação das contas públicas, os cortes nos juros podem parar.
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Isso é o que pensa também André Roncaglia, economista e professor da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp). “A questão fiscal pode afetar na queda dos juros eventualmente no ano que vem. Tanto no ritmo de queda e talvez na taxa terminal, patamar onde onde vai parar a queda da Selic”, afirmou ele.
“A ‘batalha’ sobre a taxa de juros agora é sobre onde vão parar os cortes”, ratificou Faria, da UFMG. “O mercado está esperando uma taxa de juros de 9,25% ao ano no final de 2024. Eu acho uma perspectiva bastante otimista, não sei se chegará nisso.”
Edição: Rodrigo Durão Coelho