Mais do que uma simples diversão ou um momento pontual, a brincadeira, na vida das crianças, pode ser compreendida como uma linguagem. Essa forma de expressão é também responsável pelo desenvolvimento físico, psicológico, emocional e social dos pequenos e está diretamente ligada ao território e à cultura em que a criança está inserida.
Por isso, é com liberdade de expressão na brincadeira que a criança tem a possibilidade de se forjar sujeito da sua própria vida, potencializando aprendizados diversos como experiências de mundo e relações com o outro.
O garoto Gael Guimarães Keppe, que hoje tem 7 anos, foi incentivado pela família desde bebê a se expressar por meio do livre brincar.
Sua mãe, Karen Keppe, que trabalha como arte-educadora e produtora cultural, conta que, mesmo tendo diversos brinquedos à sua disposição, um dos primeiros objetos que chamaram a atenção do pequeno foi um cabo USB. “O brincar dele sempre foi com as coisas que aparecem. Mas ele sempre foi muito do corpo também, além dos objetos cotidianos, que ele gosta mais do que brinquedos.”
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Hoje, no porão de casa, Gael possui um espaço que chama de laboratório e realiza diversas experiências e desenvolve aprendizados. Gael contou que, quando crescer, quer ser cientista. Karen acredita que o espaço do brincar é fundamental para crianças.
“Eu acho que a brincadeira é o lugar da formação da criança. Falam que todos nós somos grandes cientistas. Eu vejo o Gael, que inclusive gosta de ciência, do laboratório. E eu acho que as brincadeiras são as nossas grandes experiências, né? É a partir disso que ele vai ter relações com o mundo, vai aprendendo as coisas, tanto coisas práticas, quanto também subjetivas e as relações sociais, como a importância da sociabilidade”, defende Karen.
Quando as crianças se envolvem em jogos imaginativos, atividades lúdicas e aventuras cheias de criatividade, elas estão usando dessa linguagem para se expressar, compreender o mundo e crescer de maneira saudável. É o que explica a pedagoga Paula Mendonça, que atua como Assessora Pedagógica do Programa Criança e Natureza, do Instituto Alana.
“O brincar da criança é a linguagem primeira pela qual a criança vai compreender o mundo, interpretar o que a cerca. Então ela é base essencial para o desenvolvimento em todos os aspectos, começando pelo emocional, que é a primeira ligação que a criança faz com os próprios pais, com as pessoas que a cercam", diz Mendonça.
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"E é por meio da brincadeira. A criança, principalmente dos zero aos sete anos, tem um imaginário, uma imaginação muito fértil. E ela vai criando dentro desse universo imagético. Todos os elementos que ela vê no mundo, reproduz na brincadeira.”
A pedagoga relembra a origem da palavra brincar. “Tem uma definição que vem do latim. O sentido de brinco, no latim, é vínculo. Então, é a partir da brincadeira que a criança se vincula com as outras pessoas, com o mundo, a própria sociedade, entende o que passa em volta. A criança necessita, através do brincar, exercer essa escuta de si mesmo sobre o que ela tem vontade de fazer, o que ela tem como um desejo do corpo dela.”
Para a mãe do pequeno Gael, mesmo que seja importante os adultos participarem de brincadeiras junto das crianças, sobretudo para estreitar vínculos, é importante existirem momentos só deles. “Eu acho que é importante os adultos participarem do brincar, mas no fim as brincadeiras que são mais legais acabam sendo entre as próprias crianças mesmo. É importante ter esses espaços mais acolhedores”, aponta.
:: Direito das crianças, brincar garante desenvolvimento integral, pleno e saudável ::
“Desde a proposta da creche parental até agora, o que a gente, como família, considera a melhor experiência da brincadeira é o livre brincar. Que é a possibilidade da criança se desenvolver a partir do interesse dela."
"A gente obviamente tá de olho, cuidando, vendo se ele não vai se machucar, se colocar em perigo… mas é importante que possa desenvolver as coisas a partir do seu interesse e que a gente não direcione tanto o que ele faça, para que desenvolva pesquisa com o brincar dele.”
Para a pedagoga, o ato de brincar, além de ser encarado como um direito, deve ser visto também como caminho para a construção de autonomia.
"Brincar é muito importante para o desenvolvimento do corpo, todas as habilidades, capacidades. A criança, quando vai para a natureza, ela fortalece sua imunidade, toma vitamina D, olha mais o horizonte, sai da tela."
"O brincar é elemento essencial na própria saúde da criança. Por isso, deve ser encarado como um direito. E o livre brincar é o espaço da criação, da percepção de si. Então se ela não tiver momentos na rotina dela em que possa exercer a liberdade de conhecer a si mesma, exercer o que tem vontade, se é criada só para obedecer atividades dirigidas, ela em menos autonomia. Tem a ver com a construção da autonomia.”
Edição: Rodrigo Durão Coelho