O planeta Terra bateu recordes seguidos de temperaturas nos últimos três meses. Julho foi o mês mais quente da história, com média global de 16,95°C. Em seguida, veio agosto, que assumiu o segundo lugar no pódio, com 16,82°C.
Além disso, a temperatura do oceano também atingiu temperatura recorde em agosto (20,98°C), enquanto a camada de gelo da Antártica atingiu uma extensão 12% abaixo da média, de longe a marca mais baixa para agosto desde que as observações via satélite tiveram início, no final dos anos 1970.
Os dados acima, divulgados pela Organização Meteorológica Mundial (OMM), braço da Organização das Nações Unidas (ONU) para questões climáticas e relativas à água, se somam a outra constatação: até o momento, o ano de 2023 é o segundo mais quente da história, ficando atrás apenas de 2016, quando houve um fenômeno El Niño particularmente agudo, que contribuiu para elevar a temperatura global.
Quando essas estatísticas vieram à tona, na semana passada, um ciclone já provocava estragos na região Sul do Brasil. Outro ciclone atingiu a Europa, cruzou o mar Mediterrâneo e causou inundações catastróficas na Líbia, onde grande parte de uma cidade costeira foi devastada e o número de vítimas, ainda incerto, se conta aos milhares.
"Esse acontecimentos têm a ver com o aquecimento global, que está provocando fenômenos extremos em todo o planeta", afirma o cientista Carlos Nobre, especialista na questão climática.
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Ciclones são centros de baixa pressão atmosférica formados pelo contraste entre massas de ar quente e frio, que sugam a umidade e a jogam para a atmosfera. A umidade se transforma em nuvens, num processo que espalha chuva e vento.
No caso da Líbia, onde as águas do mar estão quentes, o processo de evaporação foi acelerado, o que gerou um volume muito grande de chuva na costa do Mediterrâneo, explica Nobre. Ele pondera, no entanto, que as consequências não seriam tão devastadoras se duas barragens não tivessem se rompido. "Quando isso acontece, o nível dos rios sobe tão rápido que não há tempo de resposta".
No Sul do Brasil, onde a previsão é de mais tempestade nesta quinta-feira (14), os ciclones extratropicais –formados fora dos trópicos – são comuns no inverno. "Aconteceram cinco no Rio Grande do Sul nos últimos quatro meses", lembra o cientista. Porém, o último foi mais forte que a média por dois motivos: uma rápida aceleração do El Niño, que induz frentes frias e ciclones mais fortes, e o fato de o Oceano Atlântico estar mais quente na costa do Rio Grande do Sul. "Quando o ciclone extratropical chega nessa região, evapora mais água e essa água sobe, causando chuvas mais intensas."
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Logo após a inundação na Líbia, a cientista Suzanne Gray, do departamento de meteorologia da Universidade de Reading, no Reino Unido, explicou que o aquecimento global tem feito com que haja uma frequência menor dessas tempestades, porém com mais força. Ou seja, um volume maior de chuva concentrado em menos tempestades.
Tendência é piorar
"Essa concentração se deve ao aquecimento global, que faz aumentar muito a evaporação dos oceanos, dos rios, então o gatilho da chuva é a quantidade de vapor d’água, que gera nuvens que causam tempestades, conhecidas como cumulonimbus", explica Carlos Nobre, que considera "muito difícil" haver uma reversão desse aumento de tragédias porque as emissões de gases de efeito estufa continuam a aumentar e devem bater neste ano o recorde de 2022.
Além dos desastres ambientais, como os incêndios florestais, que liberam grande quantidade de gás carbônico na atmosfera, ele acha que a principal razão para a taxa de emissões não cair é o fato de o investimento em combustíveis fósseis ser "muito maior" do que o usado na conversão de energias renováveis. "Hoje, a energia solar e a eólica já são mais baratas que as fósseis, então [um investimento mais intenso nessas matrizes energéticas] seria bom inclusive para a economia do planeta. Mas a velocidade é lenta".
Edição: Thalita Pires