Considerado um dos maiores nomes do fotojornalismo brasileiro, Evandro Teixeira tem, a partir desta quarta-feira (30), cerca de 160 fotografias expostas no Centro Cultural Banco do Brasil (CCBB), no centro do Rio de Janeiro. A visita é gratuita e possibilita ao público mergulhar nos registros sobre a ditadura militar do Chile e ver imagens do enterro do poeta Pablo Neruda.
Além dos registros feitos no Chile, a exposição "Evandro Teixeira, Chile, 1973", traz imagens produzidas por Evandro durante a ditadura civil-militar brasileira, em um diálogo entre os contextos históricos dos dois países. Com curadoria de Sergio Burgi, coordenador de fotografia do Instituto Moreira Salles, a mostra chega ao CCBB depois de ter sido apresentada com enorme sucesso no IMS Paulista, e integra a parceria firmada entre as duas instituições em 2022.
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Baiano nascido em 1935, Evandro Teixeira fez toda a sua carreira na imprensa carioca, onde atuou por quase seis décadas, sendo 47 anos no Jornal do Brasil.
O fotógrafo viajou para o Chile em setembro de 1973, no dia seguinte ao golpe militar de 11/9, que levou à morte do presidente eleito Salvador Allende. O fotógrafo foi como correspondente do "Jornal do Brasil", acompanhado pelo repórter Paulo Cesar de Araújo. Retido com dezenas de outros correspondentes internacionais na fronteira da Argentina com o Chile, fechada deliberadamente pela junta militar chilena, chegou a Santiago em 21/9.
Sob a vigilância dos militares, a imprensa internacional circulava por uma cidade sitiada e ocupada pelas forças militares, com rígido toque de recolher. Além de contornar a censura local, Evandro precisava revelar as imagens rapidamente em um pequeno laboratório improvisado, que instalou no banheiro do seu hotel, e transmiti-las em seguida usando um aparelho de telefoto.
Imagens de Neruda
Entre as imagens produzidas nesse período, o registro mais importante feito pelo fotógrafo, que ele mesmo considera um dos marcos de sua carreira, foi a da morte e enterro do poeta Pablo Neruda. Um dia depois de chegar a Santiago, Evandro soube pela esposa de um diplomata que Neruda estava hospitalizado em uma clínica da cidade. O fotógrafo foi até o local, mas não conseguiu registrar o escritor, que morreu na noite daquele mesmo dia.
Na manhã seguinte, retornou à clínica, já ciente da morte, e conseguiu acesso ao interior do edifício por uma entrada lateral, chegando ao local onde Neruda estava, em uma maca no corredor, sendo velado por sua viúva, Matilde Urrutia. Em entrevista para o site do IMS, o fotógrafo relembra o episódio:
"Estou lá, rondando o hospital, e de repente abre uma porta lateral, olho, tiro a Leica, sempre deixo preparada para dois metros, o que der, deu. Entro, Neruda está na maca, dona Matilde, sua mulher, sentada com o irmão dela", conta ele.
Evandro fez a foto e, em seguida, pediu permissão para a viúva, lembrando que havia fotografado Neruda anteriormente, em um encontro com o escritor Jorge Amado no Brasil. Matilde não só permitiu que ele fizesse os registros como pediu para acompanhá-la até a residência do casal, La Chascona, onde o corpo seria velado.
"Dentro da clínica fiz a maca, fiz várias fotos, apavorado. Eu olhava em volta, pensava naquele mundo de fotógrafos em Santiago e dizia pra mim mesmo: não, não é possível, só eu aqui, só eu?", relembra.
Evandro registrou naquele dia e no seguinte detalhadamente todas as etapas do velório e enterro do poeta, que contou com grande participação popular e se tornou o primeiro grande ato contra o governo de Pinochet.
A exposição também traz imagens que Evandro realizou no Estádio Nacional do Chile, local onde o governo encarcerou e torturou inúmeros presos políticos. Os correspondentes foram levados pelos próprios militares para fotografar o local, em uma iniciativa oficial que visava encobrir as violações de direitos humanos que aconteciam ali.
Ainda assim, Evandro e outros colegas conseguiram driblar o cerco e registrar tanto a chegada não planejada pelos militares de novos presos políticos ao estádio como também penetrar no subsolo do local, onde jovens estudantes foram fotografados sendo conduzidos para áreas internas. Junto aos registros do Estádio Nacional, há também imagens que mostram a violência militar em Santiago, como a foto do Palácio De La Moneda bombardeado.
Ditadura no Brasil
Em outro núcleo, a mostra apresenta fotos feitas por Evandro durante a ditadura brasileira e que hoje fazem parte do imaginário sobre o período. Entre elas, estão a da Tomada do Forte de Copacabana, feita exatamente no dia 1 de abril de 1964, as imagens das manifestações contrárias ao governo, em 1968, como a da Passeata dos Cem Mil, vetada pelos censores da época por registrar a faixa “Abaixo a ditadura, povo no poder”, ou ainda a foto na qual Evandro registra a queda de um motociclista da FAB, em 1965.
A mostra também contribui para a reflexão sobre a extensa obra de Evandro Teixeira, profissional comprometido, sobretudo, com seu ofício, como revelam suas palavras.
"Minha aventura pessoal identifica-se com a aventura vivida pelo mundo. Não tenho méritos para isso, sou um homem manejando uma câmera. Quando bem operada, é um fósforo aceso na escuridão. Ilumina fatos nem sempre muito compreensíveis. Oferece lampejos, revela dores do impasse do mundo. E desperta nos homens o desejo de destruir esse impasse", diz o fotógrafo.
Serviço
A exposição "Evandro Teixeira, Chile, 1973" fica em cartaz até 13 de novembro.
O CCBB fica localizado na Rua Primeiro de Março, 66 – Centro do Rio
Informações: (21) 3808.2020 | [email protected]
Funcionamento: De quarta a segunda, das 9h às 20h.
Fechado às terças-feiras.
Entrada franca, com ingressos disponíveis na bilheteria física ou pelo site do CCBB - bb.com.br/cultura
Edição: Eduardo Miranda