Direitos indígenas

Em conflito pela terra, Itaipu assegura estrada a indígenas ameaçados de morte no oeste do Paraná

Trecho é o único que liga aldeia à cidade; vizinho ao território chegou a dizer que ia “meter bala” e fechar a via

Brasil de Fato | Curitiba (PR) |
Estrada é conhecida pelo nome de Duas Irmãs e liga o rio que passa na aldeia até a cidade - Arquivo pessoal

A Usina Hidrelétrica Itaipu Binacional se comprometeu a cascalhar uma estrada de terra que liga a tekoha Pyahu ao município de Santa Helena, no oeste do Paraná. A medida foi tomada após ameaças feitas por um proprietário de terras, que vive ao lado da aldeia, contra os indígenas, localizados dentro da Reserva de Itaipu. Na última, ocorrida em 18 de agosto, o Boletim de Ocorrências (BO) relata que ele ameaçou “meter bala”.

A estrada é conhecida pelo nome de Duas Irmãs e tem cerca de 1,5 mil metro, ligando o rio que passa na aldeia até a cidade. Ela é a única via pela qual indígenas da tekoha Pyahu podem ir a Santa Helena vender artesanato, levar as crianças à escola, receber atendimento médico e ir ao supermercado. No entanto, há cerca de um ano e meio, o homem que vizinha à comunidade tem ameaçado interditar o trecho, isolando os indígenas, além de protagonizar outras discussões com a comunidade.

Neste ano, os conflitos teriam se acirrado. Em maio, a reportagem do Brasil de Fato mostrou que o fazendeiro chegou a oferecer R$ 4 mil para a liderança em troca de fechar a estrada, já que ela cruza parte das suas terras. Na ocasião, o Ministério Público Federal (MPF) se mostrou contrário à ação.

No último dia 18 deste mês, uma nova ameaça por parte do vizinho aumentou o tom dos conflitos. Segundo o Boletim de Ocorrências registrado da Delegacia de Polícia Civil de Santa Helena, porcos do fazendeiro entraram na terra indígena. No B.O consta o nome de João Orácio Carvalho como sendo o titular das terras. Um indígena espantou os animais de volta ao território, mas um dos porcos ficou perdido. Ao ver a cena e constatar que o animal estava ferido, Carvalho teria dito, julgando que o indígena havia machucado o animal: “Se você não me pagar esse porco vou te meter bala, se não me pagar você vai me pagar com a sua saúde, vou atrás de você”.

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No mesmo dia, indígenas fizeram contato com o procurador da república Raphael Otavio Bueno Santos que solicitou a ida da Fundação dos Povos Indígenas (Funai) ao local com urgência.

Em 22 de agosto, o cacique Fernando Lopes e o vice-cacique Nerson Rodrigues também escreveram uma carta à mão pedindo ajuda da Funai sobre o caso. “Desde ano passado nós estamos passando por (...) ameaças de fechar nossa estrada (...) e, este mês, sexta-feira, dia 18/8, ele [fazendeiro] ameaçou as famílias guarani de morte. Nós estamos com medo. Nossas famílias estão com medo. E hoje, dia 22 de agosto, ele está exercendo sua atividade para fechar nossa estrada”, diz trecho.

No dia seguinte, 23, um grupo formado por seguranças da Itaipu, Polícia Federal e Funai estiveram na comunidade. De acordo com o indigenista Paulo Porto, gestor de Sustentabilidade das Comunidades Indígenas da Usina Hidrelétrica de Itaipu, foi acordado com os indígenas que a estrada não será fechada e que ela ainda receberá cascalho, para garantir a ida e vinda dos indígenas.

“A posição da Itaipu é que o acesso não poderá ser obstruído e deverá ser cascalhado para garantir a entrada e saída de veículos. E para que isto se dê será organizada uma reunião entre Prefeitura, proprietário, Polícia Federal, Itaipu e comunidade Guarani. A Itaipu fará toda mediação para que aquela comunidade tenha acesso livre à estrada, assim como seus veículos...e esta mediação será feita junto ao proprietário e à Prefeitura. Existe a preocupação de que este conflito se agudize, por isto, no que depender da Itaipu, todas as mediações para pacificar a situação e garantir o direito de ir e vir dos indígenas serão tomadas”, afirmou.

Para o cacique, a situação só será amenizada quando a estrada estiver garantida. “Nossa família vai ficar tranquila só depois de ter nossa estrada, mas por quanto estamos cercados”, frisou.

A reportagem não conseguiu contato com o proprietário das terras.

Em relação ao Boletim de Ocorrências registrado, a Polícia Civil informou que foi realizado o termo circunstanciado de infração penal e o procedimento já foi encaminhado à Justiça com a natureza de ameaça.

Outros problemas

A comunidade também pleiteia o serviço de energia elétrica. De acordo com a liderança, há 60 dias a comunidade está em completo escuro. O que eles possuíam antes era um sistema irregular, que foi desativado no período. O cacique disse que já solicitou à Funai o serviço e que a Itaipu se manifestou favorável em garantir a energia.

Enquanto esperam, as crianças precisam sair no escuro para irem à escola e só conseguem com auxílio de faroletes, carregados na casa de brancos que moram na cidade.

Procurada, a Funai não respondeu até a publicação da reportagem. O espaço segue aberto.

A Itaipu disse que não há objeção ou impedimento por parte dela.

A Copel, distribuidora de energia no estado, não localizou pedido de ligação de energia para a área.

Fonte: BdF Paraná

Edição: Lia Bianchini