Neste sábado (5), a lei criada para garantia dos direitos da juventude no Brasil completa uma década de existência. O Estatuto da Juventude traça princípios e diretrizes das políticas públicas e do Sistema Nacional de Juventude (Sinajuve) e prevê ações práticas para aplicação da legislação. Ainda assim, pouco do texto foi concretizado e parte desse atraso se explica na história recente do país.
Sancionado no último ano do primeiro mandato da ex-presidenta Dilma Rousseff, o Estatuto foi engessado pelos acontecimentos políticos que vieram a partir das eleições de 2014. A proposta havia passado nove anos em tramitação no Congresso Nacional e foi colocada em votação como parte de uma agenda positiva do parlamento após as manifestações de junho de 2013.
A sanção em curto espaço de tempo também foi um aceno à população que ocupou às ruas e ao conjunto de parlamentares, com objetivo de ampliar a sintonia com o legislativo. Na cerimônia em que sancionou a lei, Dilma disse que o texto precisava se transformar em um instrumento de combate às desigualdades históricas.
"Esse pacto, como todos os pactos importantes, é baseado em uma visão de que o que compromete qualquer processo no Brasil é a desigualdade. É um pacto pela igualdade, por mais oportunidades, para garantir maior participação."
O Estatuto é voltado para pessoas de 15 a 29 anos e estabelece o aprofundamento de direitos que já são previstos, como saúde, educação, cultura, sustentabilidade e saúde. Ele também cria novas estruturas coletivas e periódicas de debate e tomada de decisões, com foco na participação social.
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Segundo Carlos Alberto, que integra a coordenação nacional do Levante Popular da Juventude, a própria sanção do texto já representa um avanço histórica para o país. "No momento em que se cria diretrizes para a construção de políticas públicas específicas para a juventude, abre-se um campo de disputa para que consigamos pautar o que são as políticas públicas necessárias", acredita.
No entanto, as responsabilidades do poder público na execução da Política Nacional de Juventude só foram regulamentadas em 2018, por Michel Temer (MDB). Na época, o Brasil já havia sofrido o golpe que tirou Dilma Rousseff da presidência e levou o emedebista ao comando do Planalto e estava havia mais de um ano sob o regime do teto de gastos, com investimentos sociais congelados.
"É muito importante destacarmos esse marco temporal, porque três anos após a sanção do Estatuto da Juventude, o Brasil passar por um golpe jurídico e parlamentar que coloca todos os nossos direitos a ver navios. Não só os direitos da juventude, mas de toda a classe trabalhadora", ressalta Carlos Alberto.
A partir da eleição de Jair Bolsonaro (PL), a situação piorou ainda mais. Em 2019, apenas 27% do orçamento da Secretaria Nacional de Juventude (SNJ) foi executado. Em 2020, o valor efetivamente gasto foi de 0,5% do previsto. No ano seguinte, apenas 2% da verba prevista foi usada pelo órgão. No último ano da gestão de extrema direita o orçamento da SNJ chegou ao menor patamar da história e caiu mais de 90%.
Os dados foram obtidos pelo jornalista Paulo Motoryn para o Brasil de Fato, por meio da Lei de Acesso à Informação (LAI). Em junho passado, ele apurou que o valor empenhado para o ano ao órgão era de R$ 1,5 milhão. Nesse período, durante o governo Dilma, o valor médio foi de R$ 27 milhões.
O Integrante do Levante Popular da Juventude afirma que, frente a essa conjuntura, a aplicação do Estatuto da Juventude ficou completamente impedida.
"Nossa juventude não teve a vida zelada nesse período. É importante colocar, não só na área do trabalho, mas também da educação. A juventude brasileira teve saques gigantescos na educação, que foi uma das áreas mais sucateadas, os orçamentos foram reduzidos drasticamente. O Estatuto não foi colocado em prática e nem políticas públicas foram criadas", afirma Carlos Alberto.
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O caminho para recuperar o tempo perdido, segundo ele, passa por um esforço conjunto da sociedade civil, movimentos populares e setores governamentais comprometidos com a promoção dos direitos da juventude.
"A partir de agora, temos que construir um processo de mobilização e construir força social. Temos um governo em disputa, sempre dissemos isso. Nós, enquanto movimentos sociais, temos nosso papel de seguir pressionando.”"
Em junho, a gestão de Luiz Inácio Lula da Silva (PT) anunciou a recriação do Comitê Interministerial da Política Pública de Juventude (Coijuve). O órgão é ligado à Secretaria-Geral da Presidência da República e tem papel de gerir e monitorar políticas públicas destinadas.
No fim de julho, Lula assinou Decreto que convoca 4ª Conferência Nacional da Juventude, para o período de 14 a 17 de dezembro deste ano. "É importante que os movimentos se articulem nos estados, participem das conferências regionais, ocupem esses espaços e levem propostas", convoca Carlos Alberto.
Ouça a entrevista na íntegra no tocador de áudio abaixo do título desta matéria.
Edição: Thalita Pires