Juventude

'Este congresso deixa esperança': estudantes celebram balanço positivo do 59º Conune

Articulado pela UNE, evento reuniu 10 mil pessoas em Brasília (DF), onde lutas estudantil e institucional reataram laços

Brasil de Fato | Brasília (DF) |
Participantes do 59º Conune se reuniram no GInásio Nilson Nelson, em Brasília (DF) - UNE/Divulgação

Ainda era horário de almoço quando um ginásio colorido por múltiplas bandeiras políticas se agitava para iniciar a programação deste domingo (16) do Congresso da União Nacional dos Estudantes (Conune), em Brasília (DF). Em seu último dia de atividades, a 59ª edição do evento consolidou os debates que vinham sendo formatados pelo segmento estudantil organizado e também celebrou o que os participantes consideraram ser o legado do congresso de 2023.

Este foi o primeiro Conune presencial após a pandemia – a última edição, em 2021, ocorreu de forma virtual – e também o primeiro depois de a esquerda retornar ao poder no Brasil após um ciclo de seis anos de avanço conservador. O cenário pregresso ajudou a fortalecer a mobilização dos estudantes que se organizam em torno da UNE, o que também fez do congresso deste ano um espaço de reencontro entre a entidade e o governo federal.

O presidente Lula (PT) esteve no evento na última sexta (14), acompanhado do ex-presidente do Uruguai José Mujica e uma série de outras figuras políticas. Desde 2009, quando o petista ainda estava à frente do Executivo, um presidente da República não marcava presença no Conune.

“Este congresso, para nós, é muito simbólico porque a gente teve diálogo com o governo, com a institucionalidade, para pautar a política pública para o estudante. Depois do golpe contra a presidenta Dilma, a gente tinha perdido essa linha de diálogo e começou só a ter que resistir. Este congresso de 2023 deixa esperança”, disse ao Brasil de Fato o militante Lucas Leonam da Silva, do coletivo Luta, que está em sua oitava edição do Conune.

A diretoria da UNE também comemorou o reencontro. “Tivemos a presença de dez ministros do governo ao longo do congresso e levamos as demandas urgentes da educação e da juventude. Além disso, o sentimento de reconstrução do Brasil está muito latente. Nos últimos anos, estávamos muito mobilizados para barrar retrocessos e agora novamente buscamos avançar, seja em educação de qualidade, seja na busca por mais direitos e um projeto para reduzir de desigualdades”, afirmou Bruna Belaz, em suas últimas horas como presidenta da entidade. Neste domingo, a organização elegeu sua nova diretoria e a estudante de engenharia ambiental Manuella Mirella para estar à frente da UNE até 2025, com 74,3% dos votos.

Pluralidade

O Conune reuniu 10 mil participantes, com representantes de todo o país e de diferentes partidos, coletivos e correntes políticas. A estrutura surpreendeu o universitário Leonardo Costa, que veio do Paraná para participar do congresso pela terceira edição, mas só agora estreou como membro da organização. “Trabalhei como mesário. Estive por dentro da burocracia e vi coisas que ainda não tinha tido a oportunidade de ver sobre o funcionamento: é muito trabalho. Isso me deu uma dimensão ainda maior do que é o Conune. É interessante porque a gente vê o quão grande a UNE é para fazer um evento desse porte acontecer.”

Costa destaca que a estrutura e o alcance do congresso fazem do Conune o maior evento político do país. “Acho que nenhuma organização no Brasil tem hoje essa capacidade. Isso daqui é muito diferenciado. E organizar um congresso plural desse, com tanta democracia, com todas as forças participando juntas, é ainda mais difícil. Sem contar que é daqui que irão sair os próximos políticos, as próximas lideranças do Brasil. Isso faz o Congresso ser ainda mais relevante”, emenda.     


Cenário visual do Conune foi marcado por profusão de bandeiras de vários partidos, movimentos e coletivos / Cristiane Sampaio/Brasil de Fato

Como é de costume, o 59º Conune fez dos seus últimos atos um momento prévio de apresentação de chapas para a eleição da diretoria que vai gerir a UNE pelos próximos dois anos. Enquanto gritos de guerra eufóricos se confundiam no ambiente ao longo da tarde, a estudante Elisa Cristina Rodrigues acompanhava com atenção todos os acenos que vinham do palco da plenária. Hoje com 19 anos, ela participa do seu primeiro Conune e conta que o que o evento tem de mais valioso é a capacidade de engajar politicamente estudantes de baixa renda.

“Existe uma ideia de que o pobre só está na política na hora de votar para governador, para presidente. E aqui a gente vê que é diferente, que os estudantes estão sempre na luta e, no congresso, a gente elege o próximo presidente, define as nossas próximas pautas e lutas e fica muito mais próximo da política”, exalta.

O motivo é o mesmo que embala a empolgação do universitário Vinicius Pequeno, de 24 anos, que veio de Pernambuco para participar dos debates do Conune. “É incrível estar em um espaço como este, onde todo mundo pode colocar sua voz, colocar aquilo em que acredita e disputar [ideias] porque eu acho que é da democracia a gente fazer essa defesa do que a gente acredita e acha importante. Foi através dessa luta que a gente conquistou a lei de cotas, que a gente colocou jovens pretos e LGBTs dentro dos espaços. Eu sou fruto dessas decisões políticas e da luta do povo”, diz o militante, que integra o Movimento Participa, do PSB.

Encaminhamentos

O evento teve início na última quarta (12) e se encerrou neste fim de semana com a realização de duas plenárias. No sábado (15), os participantes definiram e aprovaram teses políticas que apontam o trajeto a ser seguido pela entidade nos próximos anos. Os cerca de 7 mil delegados presentes deram sinal verde a propostas que tratam sobre movimento estudantil, educação e conjuntura política.

No caso do primeiro tema, o Conune firmou o entendimento de que o segmento deverá investir energia em lutas de destaque no atual cenário nacional, como é o caso do combate à taxa de juros do Banco Central, um dos alvos do governo Lula no momento. As agendas de defesa do meio ambiente e de permanência dos estudantes de baixa renda na universidade também integram a tese aprovada.

No quesito educação, o congresso estabeleceu como uma das prioridades a luta pelo que os estudantes chamam de “versão 2.0 do Programa de Apoio a Planos de Reestruturação e Expansão das Universidades Federais (Reuni)”. A manutenção e a ampliação das políticas afirmativas e o fortalecimento da assistência estudantil também estão na rota para os próximos anos.

“Sou estudante de Pedagogia e, por ter pautas ligadas à educação em vários debates aqui do Conune, isso nos instrumentaliza para a gente fazer um movimento estudantil de qualidade nos espaços onde a gente é dirigente e nos espaços que a gente ocupa dentro da universidade, principalmente para um professor ou professora em formação, como é o meu caso”, afirma Erika Xavier, integrante da juventude do PT, que veio de Rio Grande (RS) para o congresso.

Já no que se refere à conjuntura política, os delegados do Conune fixaram que é preciso se engajar na batalha pela conversão do lucro dos rentistas em investimento público e pela taxação das grandes fortunas, entre outros assuntos que norteiam a agenda progressista neste momento no país.

“É o Conune de um novo ciclo político. A gente leva daqui todos esses recados e também o recado de uma disposição de unidade contra o fascismo. Isso pra gente é o mais importante. É entender a tarefa histórica que a UNE tem no combate ao fascismo, na defesa da educação, etc. Óbvio que tem uns grupos que são mais sectários, mas aqueles que têm compromisso histórico firmaram isso na resolução de conjuntura. O mais importante é a disposição do diálogo”, disse Rafael Leal, da União da Juventude Socialista (UJS), do PCdoB, entidade que domina a diretoria da UNE desde 1991.

Edição: Patrícia de Matos