As 430 famílias do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST), que ocupam um terreno improdutivo da antiga Usina Bulhões, em Jaboatão dos Guararapes (PE), entraram em acordo com a construtora Viana e Moura Construções para deixarem a área.
Em troca da desocupação, a construtora concederá ao MST a posse de uma terra de 2 hectares nas proximidades do terreno ocupado. O acordo foi celebrado como uma conquista no acampamento.
“Eu tô muito feliz, viu? Eu fiquei muito feliz, porque é emocionante a gente sair e ver que quando a gente luta, a recompensa vem. O trabalhador ele é mais que vencedor”, celebra a acampada Sandra Valéria Barbalho da Silva, cozinheira industrial desempregada que deixou a periferia de Jaboatão com a perspectiva de trabalhar na terra.
Reintegração de posse
Há alguns dias, uma decisão da justiça deu 72 horas para que as 430 famílias do acampamento Josias e Samuel deixassem o local. Elas estão na área desde o dia 15 de abril e vieram de diferentes localidades da Região Metropolitana do Recife como parte da Jornada Nacional de Lutas em Defesa da Reforma Agrária. Em menos de um mês de ocupação, as famílias já cultivam alimentos agroecológicos, como milho e feijão, em um roçado coletivo.
A Viana e Moura Construções alega que o acampamento está dentro de uma das áreas adquiridas junto a Usina Bulhões para a construção do bairro planejado Parque da Usina. Para viabilizar o empreendimento, a construtora adquiriu 230 dos 853 hectares da usina de cana de açúcar falida.
Desde o início do prazo dado pela 5ª Vara Cível da Comarca de Jaboatão, o MST participou de 4 reuniões com Viana e Moura Construções. Na última delas, ficou acordada a doação do novo terreno, a realocação das famílias, e a suspensão do pedido de reintegração de posse.
“A gente sai um pouco daquele contexto de derrota e passa a ter um pouco de contexto de vitória, porque tinha uma reintegração de posse, você consegue suspender a reintegração de posse, ter um avanço na negociação e ainda consegue uma doação de dois hectares de terra para que possa ter um cantinho definitivo pra ficar”, explica José Severino da Silva Filho, da direção regional do MST e liderança do acampamento.
“A gente não vai pra tão longe, mas que a gente consiga a partir desses dois hectares transformá–los em quatrocentas moradias populares lutando junto ao município”, completa
Acordo ainda será formalizado
O acordo de concessão da nova área com a Viana e Moura deve ser formalizado nesta semana. As famílias sem terra aguardam a assinatura dos documentos para iniciarem o processo de desocupação do terreno atual.
O Movimento negocia agora com o Instituto de Terras e Reforma Agrária do Estado de Pernambuco, a concessão de uma área definitiva, ainda maior que os 2 hectares, onde além da moradia, as famílias possam cultivar alimentos agroecológicos em maior escala.
“Se você for construir conjunto habitacional, só dá quatrocentas famílias. Então, a perspectiva de produção ela não existe. O que a gente vai esperar agora nessa nova negociação com o governo do estado, é que o ITERP aponte um espaço de até 500 hectares para a gente colocar as famílias lá dentro e começar a perspectiva da produção da agricultura familiar trazendo toda a trajetória no processo agroecológico dos quintais produtivos. Hoje a gente consegue dar uma respirada. A gente vai fazer um novo acampamento, com toda a estrutura organizativa do movimento, com cozinha, banheiro químico, plenária, deixando tudo organizado na espera dessa nova terra que vem aí”, pontua Severino.
A ideia do MST é que a área desapropriada para a realocação das famílias nessa nova negociação com o governo estadual seja da própria Usina Bulhões, em um local não adquirido pela Moura e Construções. Severino defende que seja por meio de um processo de adjudicação - o que já aconteceu em outras áreas conquistadas pelo MST na região de Jaboatão dos Guararapes (PE).
“A Usina Bulhões hoje a gente desapropriou dela o Várzea do Una, o Che Guevara e o Engenho Colégio, mas com processo de adjudicação, que seria a troca de dívida pela terra. Então, a gente não tirou nenhum dinheiro dos programas sociais do governo, não tiramos nenhum dinheiro da educação, nem da saúde. A gente pegou uma dívida que aquela propriedade tinha e trocamos em terra para que o proprietário também pudesse exercer sua função de cidadão brasileiro, de não dever a ninguém, nem a fazenda nacional”, finaliza.
Outro lado
O Brasil de Fato tentou contato com a Viana e Moura Construções, mas não obteve retorno. A reportagem será atualizada assim que a empresa responder os questionamentos.
Edição: Rodrigo Durão Coelho