O Ministério Público do Estado de São Paulo (MPSP) informou que irá "tomar as providências necessárias" para derrubar os contratos de privatização das linhas 8 e 9 da Companhia Paulista de Trens Metropolitanos (CPTM), após encerrar as negociações de acordos com a ViaMobilidade.
"Encerramos as negociações com a empresa, não vamos assinar qualquer tipo de acordo com a ViaMobilidade, porque nós já tivemos muitas conversas e eles disseram que iam resolver os problemas e não resolveram", disse o promotor de Justiça Silvio Marques em entrevista coletiva na sede do MP, nesta quinta-feira (30).
"Outra alternativa não resta, portanto, a não ser deixar as negociações com a empresa e, infelizmente, vamos ter que tomar as providências necessárias visando à extinção desse contrato", afirmou Marques ao lembrar que nesta quinta um trem operado pela ViaMobilidade descarrilou mais uma vez.
Segundo o Ministério Público, trata-se do sexto descarrilamento desde que a ViaMobilidade, pertencente ao Grupo CCR, assumiu a operação das linhas, em janeiro do ano passado. "Nós não podemos ficar esperando que um acidente grave ocorra com morte de pessoas. Hoje já foi algo muito grave, enfim todos esses descarrilamentos são graves. Descarrilamento não são comuns em lugar nenhum do mundo, não há explicação razoável", defendeu o promotor.
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A decisão de encerrar as negociações foi baseada em dois relatórios do Centro de Apoio Operacional Ministério Público, que apontaram para o descumprimento de acordos por parte da ViaMobilidade.
"Ficou claro que existem problemas estruturais que a ViaMobilidade não consegue resolver, basicamente em relação à via permanente, ou seja, as linhas, mas também em relação ao material ferroviário, os trens, sem falar na manutenção de estações e diversos outros aspectos relacionados à gestão, em especial à falta de pessoal treinado o suficiente para manter, em dia, essa concessão."
"Não há mais o que esperar tendo em vista que a situação só piora. Não podemos esperar que um acidente mais grave ocorra para só então entrar com algum tipo de medida. Essas medidas do Ministério Público deverão ser tomadas nos próximos 15 dias independentemente inclusive das medidas que o estado também pode tomar", ressaltou o promotor.
O Ministério Público defende que as linhas sejam operadas por outra empresa privada a ser escolhida por uma nova licitação ou pela própria CPTM, como era antes da ViaMobilidade. "Se outra empresa não conseguir [gerir as linhas], a CPTM eu tenho certeza de que consegue. Ela tem material humano, tem equipamentos, tem expertise. Enfim, já administrava essas duas linhas com menos problemas. Então, seja pela CPTM, seja por uma outra empresa também contratada mediante de licitação, nós entendemos que essa é a solução que deve ser tomada", disse.
Piora na qualidade do serviço prestado
De janeiro de 2022 ao mesmo mês de 2023, 132 falhas foram registradas nas linhas de trens de São Paulo operadas pela ViaMobilidade. A quantidade é sete vezes maior do que o contabilizado no último ano de operação das mesmas linhas pela empresa pública CPTM.
As linhas 8-Diamante e 9-Esmeralda dos trens foram concedidas por 30 anos pelo ex-governador João Dória (PSDB) ao Consórcio ViaMobilidade, formado pelas empresas CCR e Ruas Invest Participações, em abril de 2021. Antes, a ViaMobilidade já operava a linha 5-Lilás de Metrô e a linha 17-Ouro de monotrilho de São Paulo.
No total, no período de um ano foram 52 falhas na Linha 8-Diamante – que atende a sub-região oeste da Região Metropolitana de São Paulo, incluindo municípios de Itapevi, Jandira, Barueri, Carapicuíba e Osasco – e 80 na Linha 9-Esmeralda – que liga a região sul do município de São Paulo (distrito de Grajaú) ao município de Osasco.
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Enquanto isso, no último ano de operação da CPTM antes da privatização, foram registradas apenas 19 falhas: seis falhas na Linha 8-Diamante e 13 na 9-Esmeralda.
A quantidade representa uma falha a cada 2,7 dias de operação das duas linhas pela ViaMobilidade, segundo um levantamento elaborado pela Rede Globo. Entre os registros, um trabalhador foi morto após ser eletrocutado enquanto fazia a manutenção da linha 9. As falhas nos serviços geraram multas que se somadas chegam a cerca de R$ 22 milhões.
Edição: Nicolau Soares