Das centenas de declarações falsas ou distorcidas feitas pelo ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) sobre a pandemia de covid-19, enquanto governava o país, muitas foram parar nos títulos de notícias de grandes jornais brasileiros sem contextualização ou correção, amplificando o discurso negacionista.
É o que mostra um estudo feito por pesquisadores brasileiros, com base em 111 títulos de notícias referentes a declarações falsas de Bolsonaro sobre a covid em 2020, publicadas por seis dos maiores meios jornalísticos do país.
Em 60,36% dos casos, as falsidades ditas por Bolsonaro foram simplesmente reproduzidas nos títulos. Em 26,13% dos casos houve alguma contextualização, e apenas 13,51% das notícias tinha em seu título uma correção da fala do então presidente.
As informações reproduzidas aqui foram publicadas em reportagem do site da LatAm Journalism Review, do Knight Center for Journalism in the Americas.
A avaliação dos pesquisadores é de que com a prática de reprodução de falas nos títulos, o jornalismo estaria contribuindo para a “disseminação de desinformação online, em alguns casos aumentando o ruído em um ambiente midiático já poluído e de alta escolha”, dizem em trecho do estudo.
A pesquisa intitulada “All the President’s Lies: How Brazilian News Media Addressed False and Inaccurate Claims in Their Titles”, em português “Todas as mentiras do presidente: como meios de notícias brasileiros abordaram declarações falsas e imprecisas em seus títulos”, foi publicada em formato de artigo pela revista científica Journalism Practice em fevereiro deste ano.
Os autores são Marília Gehrke (Universidade do Sul da Dinamarca – SDU, na sigla em dinamarquês), Marcelo Träsel (Universidade Federal do Rio Grande do Sul – UFRGS), Álvaro Ramos (UFRGS) e Júlia Ozorio (UFRGS).
“Escrever títulos apropriados é uma discussão ética fundamental em tempos de plataformização do jornalismo”, argumentam os autores no texto, justificando que grande parte do público tem contato com as notícias por meio de links compartilhados em outras plataformas, como redes sociais e aplicativos de mensagens.
Dessa forma, o que os autores chamam atenção é que “não importa muito se o corpo do texto de uma notícia está correto se o título é impreciso ou sensacionalista, pois isso gerará informações enganosas”.
Para os pesquisadores, a prática tem que ser repensada pelos veículos de comunicação porque nem todos os leitores vão abrir a notícia para ler na íntegra, por escolha ou porque não tem acesso a um conteúdo exclusivo dos portais de notícia. Dessa maneira, os títulos ficam soltos e sem explicação necessária aos leitores.
Edição: Mariana Pitasse