Saldo negativo

Banco Central erra estatística econômica, e servidores apontam sucateamento do órgão

Órgão anunciou que estava divulgando dados incorretos sobre entrada e saída de recursos do país desde outubro de 2021

Brasil de Fato | Curitiba (PR) |
Banco Central chegou a divulgar plataforma em 25 de janeiro, mas volume de acessos fez site sair do ar - Leonardo Sá/Agência Senado

O Banco Central (BC) anunciou na quinta-feira (26) que suas estatísticas sobre o fluxo cambial da economia brasileira foram divulgadas mensalmente contendo erros desde outubro de 2021. O fluxo cambial mede os dólares que entram e saem do país em operações de comércio exterior, investimentos ou mesmo para compra e venda de reservas.

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Após a constatação do erro, o BC precisou revisar sua série histórica sobre o indicador. Nessa revisão, ele detectou que o que era apontado como uma entrada líquida de dólares na economia nacional em 2022 (mais recursos entrando que saindo), na verdade, não existia. No ano passado, houve saída líquida de recursos do país.

O erro registrado pelo BC é de mais de US$ 12 bilhões – cerca de R$ 60 bilhões na cotação atual da moeda dos EUA.

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Antes da correção, o órgão informava um saldo de entrada de US$ 9,5 bilhões no país, em 2022. Isso dava a impressão que mais estrangeiros estavam trazendo dinheiro para cá, em pleno ano eleitoral.

Após a revisão dos dados, o BC verificou um saldo negativo de fluxo de capital de US$ 3,2 bilhões. Ou seja, um cenário oposto, com mais pessoas e empresas tirando recursos do país que colocando.

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Segundo o BC, por uma falha na apuração dos dados, acabaram sendo desconsideradas algumas operações de importação, na qual uma empresa ou pessoa brasileira envia dólares para fora para comprar um produto.

Em 2022, US$ 250 bilhões foram enviados ao exterior em importações, segundo dados já revisados. Até a detecção da falha, o BC informava US$ 238 bilhões em importações.

O mesmo erro de apuração de dados também ocorreu em 2021, mas só a partir de outubro. Por conta disso, o impacto nas contas de fluxo foi menor –US$ 1,7 bilhão.

Sucateamento

Após a constatação da falha, o chefe de estatística do BC, Fernando Rocha –servidor de carreira do órgão– desculpou-se com analistas que utilizam dados da instituição.

O erro chegou a ser comparado às "inconsistências contábeis” do caso Americanas em redes sociais. Assim como a falha contábil da gigante do varejo, o erro do BC também apresentava um panorama mais favorável do que o real, só que sobre a economia brasileira.

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O presidente do Sindicato Nacional dos Funcionários do Banco Central (Sinal), Fabio Faiad, afirmou que não crê em nenhuma manipulação de dados no BC para favorecimento de algum político ou partido –nas Americanas, há suspeita de fraude.

Em entrevista ao Brasil de Fato, Faiad afirmou que o que houve no BC foi resultado de um sucateamento da instituição e falta de pessoal para executar um determinado trabalho. “Essa coisa de fazer mais e mais com cada vez menos pessoas pode ser bonitinho, mas na prática leva a erros como esse”, afirmou.

Faiad explicou que estatísticas do BC são produzidas por planilhas, sistema de informação, de forma quase automatizada. Isso tudo, porém, precisa ser checado periodicamente por um funcionário. Com menos servidores, menos checagem, mais erros.

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“Estamos com déficit de pelo menos mil servidores e tocando cada vez mais projetos: pix, open finance, real digital…” reclamou Faiad. “Pela lei, o BC deveria ter 6,5 mil funcionários. Estamos com cerca de 3,5 mil.”

“Já são mais de dez anos sem qualquer concurso público e com remunerações defasadas e assimetrias injustificáveis, o que implica a piora significativa do clima organizacional, impactando diretamente na rotina laboral do órgão”, complementou o Sinal, em nota sobre o erro do BC encaminhada à imprensa.

Credibilidade

O economista Mauricio Weiss, professor da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), disse que o erro do BC não chega a ter impacto real nos rumos da economia brasileira e na decisão de investidores que aplicam recursos aqui. Segundo ele, afeta, sim, a credibilidade da instituição.

A mesma impressão tem o economista Andrew Storfer, diretor do Núcleo de Economia da Associação Nacional dos Executivos de Finanças, Administração e Contabilidade (Anefac). “Não acho tão impactante [para a economia]. Claro que erros não são saudáveis, mas neste caso o erro representa no ano menos de 5% das operações”, disse. “O efeito prático não é relevante.”

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Márcio Pochmann, economista e professor da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), disse que o BC tem falhado no cumprimento de suas obrigações. Esse erro é mais uma dessas falhas.

O órgão, que se tornou autônomo em 2021, durante o governo de Jair Bolsonaro (PL), é legalmente responsável pelo controle da inflação no país. Em 2021 e em 2022, as metas de inflação estipuladas pelo Conselho Monetário Nacional (CNM) não foram cumpridas.

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Edição: Rodrigo Durão Coelho