Na reta final do governo Jair Bolsonaro, a Universidade de Brasília (UnB) vive um dos momentos de maior arrocho orçamentário da sua história. Na semana passada, um novo bloqueio de R$ 17 milhões – em todo o país foram R$ 344 milhões cortados das universidades – resultou numa ameaça real de paralisação dos serviços da maior instituição de ensino superior do Centro-Oeste, que abriga uma comunidade acadêmica de mais de 50 mil pessoas.
A reitora Márcia Abrahão Moura publicou uma carta pública para explicar a gravidade da situação, que não tem limite financeiro para pagar nenhum tipo de conta, até as mais básicas para o funcionamento do dia a dia. "Não há recursos para pagar auxílio estudantil, contratos do Restaurante Universitário, da segurança, de manutenção, de limpeza e todas as demais despesas previstas para o mês, incluindo projetos de pesquisadores", explicou.
"A situação financeira da UnB e das demais universidades federais já era dramática desde o início de 2022, piorou com o corte de 7,2% feito pelo governo federal no mês de junho (R$ 18 milhões só na UnB) e, agora, torna-se insustentável", acrescentou.
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Por trás dos números milionários, está o rosto daqueles que sentem na pele os impactos da política de austeridade que sucateia a educação no país. Estudante do 9º semestre de Biotecnoloiga, Mateus Meira do Santos, de 23 anos, é de uma família de baixa renda, ingressou na UnB pelo sistema de cotas para estudantes pobres e que cursaram o ensino básico em escola pública. Desde o começo, ele sabia que o desafio não era apenas ter uma formação qualificada, mas conseguir se manter ao longo do curso.
"Desde o segundo semestre eu fui atrás de algo na universidade que me desse retorno financeiro porque vi que existe um abismo entre a maioria dos meus colegas e eu. Sempre me cobrei muito para ser um dos melhores, já passei por cotas e, na minha cabeça de ensino médio, isso seria um demérito e não uma conquista, como eu vejo hoje", conta.
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A bolsa ajudou Meira a se firmar na UnB, além de permitir um contato com laboratório e projetos de pesquisa, mas a chegada da pandemia, em 2020, e os sucessivos cortes de bolsas e auxílios que vieram depois, abalaram a saúde mental do estudante. "É como se eles esfregassem na sua cara que você não é pobre o suficiente, e que vai ter que viver na berlinda". Mateus Meira chegou a desenvolver crises de ansiedade durante o período mais agudo da crise sanitária, e só conseguiu se manter na universidade porque acessou bolsas emergenciais de saúde mental, que a UnB ainda conseguiu oferecer naquele período.
Agora, com os novos cortes de bolsas e auxílios que já não eram reajustados há anos, a decepção é completa. "O Estado, representado pelo governo federal, mais uma vez ri e esfrega na minha cara que a educação, a formação e a saúde dos jovens e adultos não é importante, porque minha bolsa de iniciação científica, que ainda é de apenas R$ 400, e meu auxílio saúde mental, estão sendo todos cortados", relata.
Beatriz Amorim, 22 anos, estudante de Sociologia, é outra que viu sua bolsa ser cortada em meio ao arrocho orçamentário da UnB. "Minha bolsa acaba esse mês, mas desde então já estou procurando empregos porque a bolsa é minha única fonte de renda para me manter na universidade", explica. Desde o início da graduação ela ingressou em programas do governo que oferecem bolsas de iniciação à pesquisa e à docência, iniciativas consideradas essenciais na qualificação da formação superior. Para a estudante, só há uma forma de reverter isso: lutando nas ruas.
"O sentimento, de um lado, é de falta de perspectiva, mas de outro a compreensão sobre a necessidade de lutar pela recomposição do orçamento das universidades para que isso não ocorra novamente com outros estudantes."
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IFB também agoniza
O corte de recursos no MEC afetou drasticamente outra das instituições públicas federais mais importantes do DF. O Instituto Federal de Brasília (IFB) perdeu cerca de R$ 3,2 milhões e agora pode entrar em colapso se o bloqueio orçamentário não for revertido.
"Com esse bloqueio, o IFB não tem dinheiro para pagar nenhuma conta que já tinha sido empenhada, de forma previamente planejada. Ou seja, com o corte, o IFB não tem dinheiro para pagar as contas de água, luz, internet, dos serviços terceirizados de limpeza, vigilância e manutenção predial. Não tem dinheiro para pagar as bolsas de assistência estudantil e projetos de pesquisa e extensão dos estudantes. Não tem dinheiro para continuar processos prontos em andamento, como aquisição de bebedouros industriais (necessário por causa da pandemia de covid), contratação de intérpretes de libras, psicopedagogos para prestar um melhor atendimento aos estudantes, aquisição de computadores, móveis, aditivos de obras que estão em andamento, pagamento dos estagiários, aquisição de usinas fotovoltaicas etc.", informou a instituição, em nota.
O MEC foi procurado para comentar a situação vivida pelas instituições de ensino do país, mas não respondeu. Um ato organizado por entidades estudantis está sendo convocado para a tarde desta quinta-feira (8), em frente à sede do ministério, em Brasília.
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Fonte: BdF Distrito Federal
Edição: Flávia Quirino