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Demissão à distância

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A “gota d’água” foi uma matéria que publiquei no Pasquim, um teste que mostrava como identificar “O arenista perfeito” - Wikimedia Commons
Outras moças choraram também. Demissão em véspera de Natal? Que maldade!

Esta historinha que vou contar é porque vejo uns bobões ou safados que falam bem da ditadura. Havia muitos tipos de perseguição.

No final de 1977, eu trabalhava no Sesc de São Paulo, um ótimo emprego, e colaborava em vários jornais alternativos, como o Pasquim, por exemplo. E fui demitido de surpresa. Foi mesmo muito surpreendente porque eu recebia muitos elogios pelo trabalho que realizava, com uma equipe que pesquisava cultura popular em todo o Brasil, fotografava, comprava material etc.

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Fiquei sabendo, por fofocas, o motivo da minha demissão e não acreditei. Mais tarde, uma pessoa que conheci, que convivia com a cúpula do Sesc, me confirmou a história dessa demissão. A “gota d’água” foi uma matéria que publiquei no Pasquim, um teste que mostrava como identificar “O arenista perfeito”.

Para quem não sabe, Arena era o partido político de sustentação da ditadura. Gozei muito os arenistas. O presidente do Sesc de São Paulo, José Papa Jr., submisso aos ditadores, estava na Suíça e algum puxa-saco telefonou pra ele e leu a minha matéria. Em seguida o Papa Jr. telefonou para o diretor do Sesc, mandando me demitir. Vale lembrar que naquele tempo era muito difícil e caro fazer um telefonema internacional.

A demissão incluía um toque de perseguição: tinha uma rede de prepostos dos patrões na área de recursos humanos que se comunicava e passava às empresas informações sobre pessoas contrárias à ditadura e que por isso não deveriam ser contratadas. Sem chance de emprego aqui, tive que mudar de São Paulo, fui pro Rio de Janeiro.

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Volto ao dia da demissão, 23 de dezembro. Estava acontecendo na sede do Sesc uma festa de fim de ano, incluindo amigo secreto. Eu não iria participar. Fui lá, com intenção de xingar os puxa-sacos da diretoria. Quando cheguei, vi que uns foram saindo de fininha.

Uma secretária veio alegre me perguntar o que ganhei do amigo secreto. Não falei nada, só mostrei a carta de demissão. Ela leu e caiu no choro. Umas colegas dela vieram ver o que tinha acontecido e ela falava alto, entre soluços:

— Ele foi demitido na véspera de Natal!

Outras moças choraram também. Demissão em véspera de Natal? Que maldade! Ficou um clima bem ruim, e o pessoal da direção e chefes de seção se mandaram. A festa mixou. E eu fiquei gozando:

— Acabei com a festa...

*Mouzar Benedito é escritor, geógrafo e contador de causos. Leia outros textos

**Este é um artigo de opinião. A visão do autor não necessariamente expressa a linha editorial do jornal Brasil de Fato.

Edição: Daniel Lamir