O ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) publicou nesta quarta-feira (19) uma carta pública destinada ao povo evangélico. A 11 dias da votação do segundo turno das eleições presidenciais, o candidato se reuniu com lideranças religiosas em um hotel da capital paulista.
A carta (disponível na íntegra ao final deste texto) lembrou realizações de Lula voltadas ao público evangélico enquanto presidente, como a assinatura dos decretos dedicados à Marcha para Jesus e o Dia Nacional dos Evangélicos, além da reforma do Código Civil que garantiu a religiosa no Brasil.
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"Mantenho o mesmo respeito e o mesmo compromisso que me motivou a apoiar essas conquistas do povo evangélico. E o nosso Povo sabe também que cuidei, com especial carinho, dos mais pobres e injustiçados e assim, sob as Bênçãos de Deus, meu governo contribuiu para melhorar a vida de milhões de famílias brasileiras", diz um trecho do documento.
No evento desta terça, Lula disse que já precisou fazer movimentos semelhantes em relação à igreja católica e a outros setores da sociedade, especialmente por causa de mentiras divulgadas em torno de seu nome e de sua candidatura. O ex-presidente criticou líderes religiosos que usam os templos para pedir votos.
"Eu defendo que as pessoas participem de política. Mas se o pastor quer fazer política, ele que vá para a rua fazer política, ele não pode ir para a igreja fazer política. Se um padre quiser fazer política, ele que faça política, mas não tire proveito do altar para fazer política", afirmou.
Presente à cerimônia, a ex-ministra e deputada federal eleita Marina Silva (Rede), que é evangélica, disse que Lula teve um exercício de "humildade" ao escrever a carta e se encontrar com as lideranças religiosas às vésperas da votação do segundo turno.
"Eu não faço do palanque um púlpito, nem do púlpito um palanque, e acho que é isso que a gente tem que trabalhar, para que assim seja. Quero parabenizar o presidente Lula pela atitude de fazer esse encontro em um espaço neutro, não dentro de um templo. É uma atitude também de respeito e de cumprir com esse preceito de que o templo, como disse Jesus, é uma casa de oração, a gente vai ali para adorar a Deus", afirmou Marina.
O pastor Ariovaldo Ramos, coordenador da Frente de Evangélicos pelo Estado de Direito, disse que o grupo de religiosos que demonstrou apoio a Lula se uniu para enfrentar o uso da fé para espalhar mentiras e "destruir nosso povo".
"Estamos aqui por que acreditamos que esse projeto é o projeto que realmente tem a ver com o que nós cremos. É o projeto que vai tirar as pessoas da fome, que vai devolver os direitos aos trabalhadores e trabalhadoras, vai devolver o progresso ao Brasil", destacou.
A senadora Eliziane Gama (Cidadania-MA), lembrou que pesquisas mostram que o público evangélico no Brasil atualmente tem entre 70 e 80 milhões de pessoas, uma parcela significativa da população brasileira.
"O senhor hoje, como católico que é, quando reúne todo o povo evangélico, está cuidando do povo evangélico, está tratando com zelo o povo evangélico, pessoas que estão em todos os rincões deste país", disse a Lula. "O evangelho da cruz, que é o evangelho que nós pregamos, não é um evangelho de ódio, é um evangelho de paz. Não é um evangelho da intolerância, é um evangelho da tolerância. É sobretudo o evangelho do perdão, da ressocialização", complementou.
Em um dos depoimentos mais emocionados do encontro desta quarta, a vereadora Aava Santiago, do PSDB de Goiânia, reforçou o apoio a Lula, e falou sobre a própria história, relatando que foi nos governos petistas que ela teve a oportunidade de ingressar no ensino superior público.
"Não permitam o sequestro da nossa fé. Nós já nos convertemos em Jesus, não temos de nos converter ao Bolsonaro. A gente escolheu estar do lado da justiça, por que o evangelho de Cristo nos faz permanentemente inquietos com a injustiça. Todos aqueles que são perseguidos merecem estar do lado da igreja e dentro da igreja", afirmou Aava.
Leia a íntegra da carta divulgada por Lula aos evangélicos:
Meus Amigos e Minhas Amigas, nesta reta final do segundo turno, decidi escrever esta Carta Pública ao Povo Evangélico.
A grande maioria dos brasileiros e brasileiras que viveram os oito anos em que fui Presidente da República, sabe que mantive o mais absoluto respeito pelas liberdades coletivas e individuais, particularmente pela Liberdade Religiosa.
Como todos devem se lembrar, no período de meu governo, tivemos a honra de assinar leis e decretos que reforçaram a plena liberdade religiosa. Destaco a Reforma do Código Civil assegurando a Liberdade Religiosa no Brasil, o Decreto que criou o dia dedicado à Marcha para Jesus e ainda o Dia Nacional dos Evangélicos.
Mantenho o mesmo respeito e o mesmo compromisso que me motivou a apoiar essas conquistas do povo evangélico.
E o nosso Povo sabe também que cuidei, com especial carinho, dos mais pobres e injustiçados e assim, sob as Bênçãos de Deus, meu governo contribuiu para melhorar a vida de milhões de famílias brasileiras. Sempre penso, neste sentido, no trecho bíblico que diz: “a verdadeira religião é cuidar dos órfãos e das viúvas em suas dificuldades…” (Tiago, 1,27)
Vivemos, entretanto, um período em que mentiras passaram a ser usadas intensamente com o objetivo de provocar medo nas pessoas de boa fé, e afastá-las do apoio a uma Candidatura que justamente mais as defende. Por isso senti a necessidade de reafirmar meu compromisso com a liberdade de
culto e de religião em nosso País.
Todos sabem que nunca houve qualquer risco ao funcionamento das Igrejas enquanto fui Presidente. Pelo contrário! Com a prosperidade que ajudamos a construir, foi no nosso Governo que as Igrejas mais cresceram, principalmente as Evangélicas, sem qualquer impedimento e até tiveram condições de enviar missionários para outros países.
Não há por que acreditar que agora seria diferente. Posso lhes assegurar, portanto, que meu Governo não adotará quaisquer atitudes que firam a liberdade de Culto e de Pregação ou criem obstáculos ao livre funcionamento dos Templos.
Envio-lhes esta mensagem, portanto, em respeito à Verdade e ao apreço que tenho a esse Povo crente no Verdadeiro Deus da Misericórdia e a seus dedicados pastores e pastoras.
Se Deus e o povo brasileiro permitirem que eu seja eleito, além de manter esses direitos, vou estimular sempre mais a parceria com as Igrejas no cuidado com a vida das pessoas e das famílias brasileiras.
Sei muito bem que em todas as regiões do Brasil há Igrejas com Irmãos e Irmãs que trabalham ativamente nas suas comunidades com a propagação do Evangelho e com o cuidado do povo, dedicando-se a tornar mais leve os fardos espiritual e social de milhões de pessoas.
Declaro meu respeito e minha admiração pela fé, dedicação e amor com que os evangélicos realizam sua missão, seja na área da difusão do evangelho, seja na área da assistência social, proteção da infância, da juventude, das mulheres, dos idosos e das pessoas com deficiência. Da mesma forma é bem-vinda a
participação de Evangélicos nas diversas formas de participação social no Governo, como Conselhos Setoriais e Conferências Públicas.
Em meio a este triste escândalo do uso da Fé para fins eleitorais, assumo com vocês este compromisso: meu Governo jamais vai usar símbolos de sua Fé para fins político-partidários, respeitando as leis e as tradições que separam o Estado da Igreja, para que não haja interferência política na prática da Fé.
Esse é um ensinamento que a própria Bíblia nos dá: andar pelo caminho da Paz com todos. Jesus nos mostra que a casa dividida não prospera. A religião é para ser respeitada e vivida de acordo com a livre escolha de cada pessoa.
Portanto, a tentativa de uso político da fé para dividir os brasileiros não ajuda ninguém, nem ao Estado, nem às igrejas, porque afasta as Pessoas da mensagem do Evangelho. Jesus Cristo nos ensinou Liberdade e paz, respeito e união, disso precisamos. E os cristãos evangélicos têm dado mostras, ao longo da História, de seu compromisso com a paz, seguindo o que Jesus ensinou: “Dai a César o que é de César, dai a Deus o que é de Deus” (Mateus, 22,21).
Outro compromisso que assumo: fortalecer as famílias para que os nossos jovens sejam mantidos longe das drogas. Nós queremos nossa Juventude na escola, na iniciação profissional, realizando atividades esportivas e culturais para que tenham mais oportunidades e exerçam cidadania de forma produtiva,
saudável e plena.
O respeito à família sempre foi um valor central na minha vida, que se reflete no profundo amor que dedico à minha esposa, aos meus filhos e netos. Por isso compreendo o lugar central que a família ocupa na fé cristã.
Também entendo que o lar e a orientação dos pais são fundamentais na educação de seus filhos, cabendo à escola apoiá-los dialogando e respeitando os valores das famílias, sem a interferência do Estado.
A preocupação com as Famílias Brasileiras deve ser integral. O povo brasileiro está numa condição de desespero, e precisaremos muito da ajuda das Igrejas para, o quanto antes, reverter esta situação. De nada adianta se dizer defensor da Família e ao mesmo tempo destruí-las pela miséria, pelo desemprego, pelo corte das políticas sociais e de moradia popular.
Queremos dar às famílias, prosperidade e segurança. O Lar é a garantia de proteção. É inaceitável que
milhões de brasileiros e brasileiras não tenham um teto. Por isso, vamos retomar o vitorioso programa Minha Casa Minha Vida, com toda intensidade, para que todas as Famílias brasileiras tenham uma casa onde possam viver com segurança e dignidade.
Nosso governo implementará políticas públicas consistentes para que nenhuma família brasileira enfrente o flagelo da fome. Sobretudo, não pouparei esforços para que possam adquirir os necessários e suficientes meios, para viver dignamente por seu trabalho, sem ter que depender da ajuda do Estado.
Nosso Projeto de Governo tem compromisso com a Vida plena em todas as suas fases. Para mim a vida é sagrada, obra das mãos do Criador e meu compromisso sempre foi e será com sua proteção. Sou
pessoalmente contra o aborto e lembro a todos e todas que este não é um tema a ser decidido pelo Presidente da República e sim pelo Congresso Nacional.
Meus Queridos e Minhas Queridas, peço que recebam essas palavras como uma demonstração de meu desejo sincero de servir, de ajudar e trabalhar pelo bem de nosso país. E estejam certos de minha estima e meu compromisso com todo o povo cristão de nosso país. Reitero meu compromisso, que é o mesmo de vocês: paz, união e fraternidade entre todos os brasileiros e brasileiras.
Com as bênçãos de Deus, haveremos de honrar nossa dupla condição, de cidadãos e cristãos, pois não há contradição entre elas quando o propósito é servir, buscando a paz e o entendimento. E digo tudo isso com muito amor pelo nosso querido Brasil e pelo Povo Brasileiro: “Nisto conhecerão todos que sois meus discípulos: se tiverdes Amor uns pelos outros!” (João,13,35).
JUNTOS PELO BRASIL!
Luiz Inácio Lula da Silva
São Paulo, 19 de outubro de 2022.
Edição: Rodrigo Durão Coelho