Carregando uma dívida por mais de dois anos, o estudante de engenharia metalúrgica da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (Uerj) e diarista nos fins de semana Luiz Arthur da Cunha Covas, de 30 anos, morador de Campo Grande, na zona Oeste do Rio de Janeiro, faz parte dos 79,3% da população brasileira que não conseguem mais pagar as próprias contas.
Segundo a Pesquisa de Endividamento e Inadimplência do Consumidor (Peic), apurada pela Confederação Nacional do Comércio de Bens, Serviços e Turismo (CNC), setembro foi o mês com o terceiro aumento consecutivo em 2022 do endividamento, que inclusive atinge a população mais empobrecida do pais.
"No início da pandemia, eu trabalhava como motorista de aplicativo, mantinha um carro alugado. De repente, ficou inviável a ponto de eu não conseguir nem pagar o aluguel do carro, essa foi uma das dívidas que adquiri. Tive que entregar o carro, ainda com as dívidas e sem renda. Para continuar me mantendo, sobreviver, adquiri outras dívidas com cartão de crédito e até com empréstimo", conta Luiz Arhur.
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No comunicado da CNC divulgado na última segunda-feira (10), o presidente da entidade, José Roberto Tadros, ressaltou que a pesquisa observou que o alto nível de endividamento e os juros elevados afetam, sobretudo, o orçamento das famílias de menor renda, ao encarecerem as dívidas já contraídas.
Nível recorde
Em setembro, a proporção de endividados entre os consumidores com renda inferior a 10 salários mínimos aumentou 0,4% e atingiu 80,3%, o maior patamar da série histórica da Peic. No grupo de famílias com maior renda, a proporção de endividados manteve-se estável em setembro, mas cresceu mais na comparação anual (ampliação de 7 pontos percentuais) do que entre as famílias de menor renda (5 p.p.).
Desde o início da pesquisa, em 2010, o mês de setembro teve o índice mais alto destes últimos 22 anos no volume de consumidores que atrasaram o pagamento de dívidas, com a taxa em 30%.
“Embora os atrasos tenham crescido no mês e no ano entre os consumidores nas duas faixas de renda, as dificuldades de pagamento de todos os compromissos do mês são mais latentes entre as famílias de menor renda”, afirmou a economista da CNC responsável pela apuração, Izis Ferreira, no documento da entidade.
Bens retomados
Na Síntese Especial de setembro, documento elaborado pelo Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos (Dieese), os economistas afirmaram que o endividamento tem também como causa a imprevisibilidade na vida do trabalho por conta da informalidade e por empregos sem estabilidade e direitos.
"Emprego desprotegido e instável gera renda instável e, assim, a vida dos brasileiros fica mais difícil. Como planejar algo futuro se não se sabe se vai haver renda no dia de amanhã e de quanto será? E com menos dinheiro e os preços dos itens básicos (alimentação, energia elétrica, aluguel, gás) altos, o resultado é o endividamento", informa a síntese.
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O Dieese chamou a atenção, ainda, para o fato de que as dívidas não estão relacionadas a investimentos de bens duráveis, como imóveis, por exemplo, mas sim com o básico do dia a dia e com as despesas mais importantes, como alimentos e transporte.
"São dívidas vinculadas às despesas correntes, como alimentação, tarifas públicas, habitação, entre outros, e não resultantes de investimentos na compra de bens, como a casa própria, por exemplo. Inclusive, cresce a retomada de bens (carros e imóveis) por inadimplência e para pagamento de dívidas", conclui o documento.
Fonte: BdF Rio de Janeiro
Edição: Mariana Pitasse