Pressão

Enfermeiros protestam na Câmara por rapidez na aprovação de custeio do piso da categoria

Pauta ainda não tem data específica para análise da Casa, mas tende a ser votada na próxima semana, segundo deputadas

Brasil de Fato | Brasília (DF) |

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Câmara dos Deputados foi palco de novo protesto da enfermagem nesta quarta (5); parte do grupo conseguiu entrar no prédio para pressionar os parlamentares de perto - Cristiane Sampaio

Trabalhadores da enfermagem voltaram a protestar nesta quarta-feira (5) em Brasília (DF) para pedir celeridade nas tratativas relacionadas ao piso nacional da categoria, que está temporariamente suspenso e aguarda a aprovação de medidas de financiamento por parte do Congresso Nacional.

Uma caravana com cerca de 200 trabalhadores desmbarcou hoje na Câmara dos Deputados para pressionar os parlamentares a darem um rápido andamento a propostas como o Projeto de Lei Complementar (PLP) 44, aprovado na terça (4) pelo plenário do Senado e encaminhado para avaliação da Câmara.

“Que a Câmara faça agora a parte dela e acabe com o sofrimento desses heróis que foram aplaudidos na pandemia, lutaram contra a covid, contra um [vírus] desconhecido e agora estão aqui pedindo aos parlamentares que concretizem o piso. Chega de sofrimento pra essa categoria”, disse a vice-presidente do Sindicato dos Enfermeiros de Goiás (Sienf-GO), Eliane Castilho.

O enfermeiro Cristiano Neres veio de Goiás para participar da pressão coletiva junto ao Legislativo. Ele se queixa do fato de a pauta do piso nacional se arrastar há cerca de 30 anos, quando o tema começou a ser discutido no Congresso. De lá pra cá, diferentes projetos de lei foram propostos, mas nenhum deles avançou até a aprovação, o que só ocorreu com o PL 2564/2020, de autoria do senador Fabiano Contarato (PT-SC). O texto é o que deu origem à lei de estabelecimento do piso.

“Já são vários pleitos que tentam aprovar, mas sempre tem a desculpa de que não tem recursos. Ia ser um valor maior e ainda se chegou a um acordo pra ser mais razoável, mas mesmo assim ainda foi barrado”, desabafa Neres, ao recordar que o valor inicial solicitado pela categoria era de cerca de R$ 7.300.

Exaustão

A Lei 14.434, que entrou em vigor no início de agosto deste ano, prevê salário de R$ 4.750 para enfermeiros, 70% desse valor para técnicos e 50% para auxiliares e parteiras. A técnica de enfermagem Márcia Nascimento de Oliveira, que atua na profissão há 12 anos, conta que veio de Anápolis (GO) para protestar em Brasília porque se sente “exausta” pelo fato de “trabalhar muito e ganhar apenas cerca de R$ 1.600”. Ela afirma que, quando a legislação do piso foi sancionada, ficou “sonhando” com o valor de R$ 3.335.

“Não são R$ 10 mil. É o mínimo de reconhecimento que a gente já deveria ter há muito tempo. A gente, pra chegar a um valor assim, tem que trabalhar em dois, três serviços. Num contexto desse, a gente não acompanha nem o crescimento dos filhos, não pode visitar a escola [deles] porque está sempre de plantão. Outra coisa é que a gente não pode sequer adoecer, porque não tem nem esse direito, já que nós temos que estar lá no trabalho conseguindo o pão de cada dia”, exprime Márcia.

A expectativa de aumento de salário foi freada pela decisão do ministro Luís Roberto Barroso, do Supremo Tribunal Federal (STF), de suspender a norma um mês após a sanção da lei. Na sequência, o plenário da Corte acabou mantendo a liminar do magistrado e concedendo 60 dias para que os custos da medida sejam detalhados por entes públicos e privados.

“Muitos de nós já estavam contando com esse dinheiro. De repente, num dia de domingo, vieram suspender nosso piso. Foi um balde de água fria. A enfermagem está se sentindo deixada de lado, está se sentindo uma palhaça. Estamos aqui lutando e passando humilhação, mas a gente nem deveria chegar a este ponto de estar implorando pelo que já é lei,” afirma a técnica de enfermagem, ao acrescentar que a categoria pretende seguir na cola do Legislativo até que a questão seja definitivamente resolvida.

Costuras

O Brasil de Fato conversou nos bastidores com diferentes deputados a respeito do tema. É comum entre eles a percepção de que a pauta do financiamento tende a ser aprovada com apoio da maior parte da Câmara, assim como ocorreu com os outros textos já chancelados pelos parlamentares. É o caso não só do projeto de lei que criou o piso, mas também da emenda constitucional que assegurou a sustentação político-jurídica da medida.  

O presidente da Casa, Arthur Lira (PP-AL), ainda não anunciou data específica para a votação da pauta, mas parlamentares que atuam em defesa do piso se articulam nos bastidores para tentar dar velocidade às costuras políticas.

Presente na Câmara nesta quarta-feira, a deputada Carmen Zanotto (Cidadania-SC), que coordenou o grupo de trabalho que discutiu o assunto antes da aprovação da lei do piso na Casa, disse estar dialogando com o mandatário para que o tema seja submetido à apreciação do plenário em breve. “Estamos em Brasília realizando uma série de reuniões e hoje, na reunião com Lira, ficou definido que, na reunião do colégio de líderes da próxima semana, serão decididos os PLs que irão fazer frente ao piso”, informou.  

A deputada Alice Portugal (BA), uma das vice-líderes do PCdoB na Câmara, também atua nas articulações para levar o tema do financiamento à votação. “Falei com o Lira hoje por telefone e ele me garantiu que, na próxima semana, vota”, disse à reportagem.

Nas mesas de negociação, há diferentes possibilidades ventiladas pelos parlamentares para o custeio do piso da categoria. Além de ter aprovado na terça (4) o PLP 44, o Senado deve, nesta quinta (6), submeter outra proposta à análise do plenário, a repatriação de recursos alocados no exterior. O tema será votado por meio do Projeto de Lei (PL) 798/2021, de autoria do presidente da Casa, Rodrigo Pacheco (PSD-MG).

Enquanto isso, a Câmara segue internamente o debate sobre as possibilidades a serem analisadas e votadas pelo plenário. “Eu acho que nós vamos ter que trabalhar no reforço do caixa público e também no reajuste da tabela do SUS para o custeio do piso no setor privado. São duas coisas importantes nesse debate. Isso daria uma folga pra eles melhorarem a condição de pagamento de pessoal”, exemplifica Alice Portugal.

Edição: Rodrigo Durão Coelho