Rio de Janeiro

Setembro amarelo

Saúde mental: Moradores de periferias e favelas sofrem com falta de atendimento

Violência e longos deslocamentos para trabalhos precarizados são alguns fatores para o adoecimento psíquico

Brasil de Fato | Rio de Janeiro (RJ) |
No ano de 2021, 11,3% dos brasileiros relataram ter recebido diagnóstico de depressão, segundo pesquisa Vigitel - Prefeitura do Rio

Os cuidados com a saúde mental são garantidos pela Constituição Federal para toda a população, mas isso está longe de ser realidade. A questão pode ser ainda mais grave para trabalhadores que moram em periferias e favelas que lidam diariamente com casos de discriminação, racismo, violência, longos deslocamentos e trabalhos precarizados.

De acordo com a pesquisa Vigilância de Fatores de Risco e Proteção para Doenças Crônicas por Inquérito Telefônico (Vigitel), só no ano de 2021, 11,3% dos brasileiros relataram ter recebido diagnóstico de depressão. Para as pessoas que vivem em locais mais pobres este diagnóstico pode nunca chegar devido ao tabu envolta do assunto e a falta de acesso a atendimentos e tratamentos.

Layla Silva é garçonete, moradora de Jacarepaguá, bairro da zona Oeste do Rio de Janeiro, e conta em entrevista ao programa Central do Brasil, uma parceria do Brasil de Fato com a rede TVT, que tem muita dificuldade para chegar ao trabalho por causa da distância e de transporte precário. Além disso, ela chegou a adoecer por ter que lidar com um chefe abusivo, sem poder se desligar do emprego, pois compartilhava responsabilidades financeiras com a família.

“Ele usava isso contra mim, dizia: ‘você tem família então tem que dar valor a isso aqui’. Umas falas bem rudes que me assustavam e faziam chorar. Eu chegava no trabalho com cara de choro como se tivesse perdendo uma parte de mim porque era muito doloroso ter que trabalhar com uma pessoa que além do julgamento com minha sexualidade, usava a minha família como o motivo pra eu me manter ali”, relata Layla.

O psicólogo Flávio Barros explica que a saúde mental ainda é muito elitizada e que falta informação sobre o assunto, principalmente em locais mais vulneráveis socioeconomicamente, em que as pessoas muitas vezes precisam se manter em empregos precarizados para sustentar a família.

“Elas adoecem, elas entram em estados psicopatológicos, desestruturam-se, desorganizam-se emocionalmente, psiquicamente e muitas vezes elas não conseguem nem entender que é toda essa realidade onde elas estão inseridas que está incidindo sobre a dinâmica de funcionamento psicoemocional e inclusive físico”, afirma o psicólogo.

Para Flávio, é urgente o investimento em políticas públicas que possibilitem o cuidado da saúde mental para todos. “Quando eu disponibilizo nos dispositivos que já existem dentro das comunidades que são os dispositivos de saúde mental, os CAPS, para atender essa população, quando eu divulgo isso, quando eu falo sobre isso e disponibilizo ferramentas, isso faz com que as pessoas comecem a criar a ideia de que eu posso”, diz.

O Ouvidor-Geral da Defensoria Pública do Rio de Janeiro, Guilherme Pimentel afirma que o adoecimento mental dos trabalhadores é um problema estrutural.

“Muitas pessoas quando aparecem com sofrimento psíquico nos serviços públicos são tratadas como se esse fosse um problema só dela. Como se também não fosse fruto de múltiplas violações que endurecem demais a vida da classe trabalhadora de uma tal maneira que essas pessoas vão reagir cada qual da sua forma e grande parte da classe vai então manifestar situações de sofrimento psíquico”, finaliza Pimentel.

Na cidade do Rio de Janeiro existem 18 Centros de Referência Psicossocial (CAPS). Os locais contam com equipe especializada e o atendimento é gratuito e para todos.

Edição: Mariana Pitasse